Distopia

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             No momento em que o Tenente estava longe o bastante Boca Mole assumira a posição de atirador, uma das vantagens de estar em vigia com Alex, que desde a escola preparatória nunca mostrara nenhuma aptidão para a tarefa. Ambos acreditavam ter vantagem sobre o outro, e enquanto Alex pensava em Boca Mole apenas como um estúpido Cabeça de Ferro que deveria servi-lo, Boca Mole via o filho do Coronel como uma chance para se vingar do Tenente Mendel.

            Alex retirou seus binóculos de dentro da mochila, observando a praça através deles.

            Anthony, ou Coronel para muitos, ensinara a Alex que o poder não estava em causar a violência, mas em levar as pessoas a fazer o que precisava em seu lugar. E por esse motivo, Alex durante todos os anos na escola preparatória buscara criar alianças inquebráveis, ou seja, pessoas que confiaria com os olhos vendados e que fariam tudo o que fosse preciso para protegê-lo. Boca Mole era um de seus homens de confiança, ao menos era o que acreditava, aquele que deveria ajudá-lo e em quem imprimia sua influência. Contudo, no mesmo instante que Alex constatara essa verdade, que seu amigo possuía algo pelo qual poderia ser manipulado, Boca Mole descobrira que armas de fogo não eram o forte do filho do Coronel, deixando que ele tivesse poder sobre suas missões e tomasse as verdadeiras decisões, mesmo Alex acreditando o contrário. A questão estava em que ambos acreditavam ter vantagem sobre o outro, mantendo aquela relação por pura conveniência, e esperando que cada um fizesse seu papel para manter tudo em seu devido lugar.

            ― Odeio esse cara! ― rosnou Boca Mole assim que Ian estava longe o bastante, alguns andares abaixo de seus pés. Seus olhos estavam no alvo, e, para ele um alvo era apenas um alvo, vivo ou não. Boca Mole não via nenhum problema em matar, como naquele momento, em que seu desejo de contrariar as ordens do Tenente corroía suas veias.

            ― Siga com plano, cara, você sabe o que meu pai falou ― lembrou Alex, olhando de canto de olho para seu amigo. Duvidava que Boca Mole seria capaz de manter a calma por muito mais tempo, já alertara seu pai sobre sua preocupação. Boca Mole, ou Gustavo como fora registrado em sua certidão de nascimento, era um Cabeça de Ferro, com 100 quilos de puro músculo, cicatrizes cortando seu rosto, mas não de uma forma bonita, e algumas tatuagens aleatórias por seu corpo. Seu pai, Hélio Cabeça de Ferro, fora da mesma divisão de soldados que seu filho dentro do Complexo, um soldado duro, que após a morte de sua esposa criara Boca Mole para ser um homem digno de respeito, ao menos o respeito que sua família acreditava ser certo. Para Alex, a fraqueza de Boca Mole estava em seu pai, ou mais especificamente, no orgulho que corria as veias de sua família até extermina-los. Boca Mole, assim como Alex fora treinado por Ian Mendel assim que o Tenente entrara no Complexo, assumindo mais controle do que qualquer um, ao menos de forma tão rápida. Contudo, mesmo o Tenente sendo seu superior por muito tempo, seu ressentimento estava na responsabilidade de Ian no afastamento de Hélio dos Cabeça de Ferro, após um pequeno deslize, que se não fosse por ele, Boca Mole tinha certeza que o Coronel deixaria passar.

           Portanto, ambos, Alex e Boca Mole, não se deixavam fazer parte do clube que temiam o Tenente, ou daquele que o adorava. O objetivo de Boca Mole era matar o homem, e esperava ferozmente pelo dia que poderia completar seu plano. E mesmo Alex o odiando, Boca Mole não estava disposto a esperar, assim como Alex e seu pai tinham lhe pedido, ele desejava fazer Ian engolir suas palavras o quanto antes, se possível naquela mesma tarde.

          ― Sim, sim, cara. Mas, alguém precisa calar a boca desse idiota, e de preferência rápido ― ele continuou desgostoso, seu maxilar se flexionando com raiva ― Não posso aturar nem olhar para ele.

A Solução FinalOnde histórias criam vida. Descubra agora