Gustavo
Quanto tempo uma pessoa leva para se adaptar ás diferenças de fuso horário? Tenho um palpite: muito tempo! Quando acordei, nem me lembrava de onde estava, precisei tomar um longo e demorado banho para descobrir que havia dormido mais de nove horas, fato raríssimo, enquanto meu celular estava lotado de mensagens desesperadas de tia Luci. Somente depois de bem alimentado, foi que criei coragem para ligar para ela.
— Finalmente, Gustavo! Essa não foi a educação que minha irmã te deu, você está ficando maluco? Tem noção da minha condição? Não sou mais uma adolescente para ficar aguentando esse tipo de brincadeira...
Deixei que ela falasse enquanto fui até o frigobar e peguei uma garrafa de água, bebi lentamente e quando coloquei o telefone novamente no ouvido ela ainda estava gritando:
— Gustavo, quase chamei a polícia... – ela já estava sem fôlego.
— Tia... tia... Lucimara Joana dos Santos você pode, por favor, me ouvir? – precisei apelar para métodos mais rígidos.
— Olha, menino, eu pego um avião agora e vou te ensinar educação, isso é tom de voz de falar comigo?
— Tia, eu te amo e estou com saudades de você! – as palavras mágicas que sempre acalmam essa leoa em ataque, no mesmo instante ouvi um suspiro.
— Oh lindo, como você está? Como foi a viagem? Por que demorou tanto para me ligar? – finalmente a voz doce e suave entrou em ação.
— Tive alguns contratempos e acabei ficando a maior parte da viagem acordado e quando cheguei aqui, apaguei... e não me lembrei de te ligar, mas estou bem, não se preocupe.
— Que tipo de contratempo você teve menino?
Da doçura a impaciência em questão de segundos, como isso é possível?
— Nada importante, tia, como estão todos aí? – falei, tentando mudar de assunto o mais rápido possível.
— Estão bem e com saudades, você faz falta. O pessoal do orfanato pergunta por você o tempo todo. Quando você vai voltar? – a pergunta dela pairou sobre minha mente.
— Não sei... ainda nem comecei a resolver as pendências por aqui e aliás, não sei como vou fazer isso... – fitei um pequeno quadro que estava na parede do quarto, estava torto e tinha uma frase que não conseguia entender muito bem. Do outro lado da linha, tia Luci retomou seu discurso:
— Eu te avisei, isso é loucura! O que você pode fazer? Aqui é seu lugar! – bradou em alta voz e já podia imaginá-la com a mão na cintura em sua melhor postura autoritária.
— Não vamos discutir e eu preciso desligar, tenho muito o que fazer – inventei –, amo você e todos aí, mande abraços. – ela iria ficar furiosa, mas desliguei antes mesmo que pudesse completar mais alguma frase grosseira e violenta sobre as minhas decisões. Algumas pessoas realmente têm dificuldades em aceitar as escolhas dos outros, esquecem que somente Deus pode controlar o mundo e que é um trabalho árduo demais para um minúsculo ser humano.
Levantei do pequeno sofá e fui em direção ao quadro. Demorei um tempo para decifrar a letra, mas quando finalmente compreendi, fiquei durante alguns minutos parado, observando as palavras dançando em minha frente.
Cause we all make mistakes sometimes
And we've all stepped across that line
But nothing's sweeter than the day we find
Forgiveness(1)
Como convencer alguém, de que a culpa não é um bom fardo para se carregar? Com certeza essa é uma missão difícil! Durante todos os anos que passei trabalhando com pessoas, percebi o quão louco pode ser isso, cada um tem sua própria personalidade e nós vamos doando e recebendo um pouco de cada ser que passa em nossas vidas. O problema está em quando decidimos andar com pessoas que somente tomam de nós e geralmente, tomam o melhor.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Além do Esperado | DEGUSTAÇÃO
SpiritualBeatriz é uma mulher forte e determinada. Nada poderia a abalar, é o que ela pensava antes de receber uma misteriosa carta, que revela muito mais do que ela imaginou sobre o seu passado, até então, esquecido. Decidida a desvendar os segredos sobre s...