Prólogo

13 0 0
                                    

As paredes do Grande Salão tremiam a cada bomba que atingia os Muros Sagrados do Castelo De Rothergan.
Uma fina poeira caiu sobre a testa da Mãe de Leite que cantava para acalmar uma das crianças protegidas. Na pequena sala, as criadas apinhavam-se em torno da rainha e o choro das crianças era constantemente sobrepujado pelo gritos e estrondos vindo dos corredores.
A Rainha suava, mas conservava sua austeridade para que as demais senhoras não entrassem em pânico. De quando em quando um pequeno sorriso aparecia em seus lábios quando percebia que alguma senhora encontrava-se com muito medo. O sorriso sempre era acompanhado por algum elogio à confiança daquela que estava com medo.
A estratégia funcionava, mas a Rainha perguntava-se quem haveria de lhe sorrir e de lhe confortar, se perdesse a coragem.
Um momento de menor ruído de explosões e de gritaria revelou o cântico de uma voz grave. A canção era conhecida da Rainha. Um antigo canto que o povo de sua mãe costumava cantar em tempos difíceis. A dona da voz era a mais antiga entre as Mães de Leite.
A Velha cantava a canção para o filho de um general muito amigo do senhor seu marido. A Rainha foi sorrindo em sua direção.
Tentou conversar com a Mãe de Leite, mas essa só falava o dialeto do povoado de sua mãe. Apesar da Rainha ter saído ainda muito jovem de lá, lembrava-se de algumas palavras.
- Sua voz acalma minha alma - Disse a Soberana.
- Fico feliz em ouvir isso - Disse a Velha, com um fino sorriso aparecendo em seu rosto.
- Você realmente acredita nas palavras que cantou? - Perguntou a Rainha, olhando para os lados, como que para garantir que ninguém mais ali entendia aquele velho dialeto. - "Tenha esperança, minha criança, o Sofrimento há de acabar. E mesmo que o Sofrimento esteja sempre contigo, você crescerá forte, pronto para brilhar"?.
- São palavras que devem ser ditas. Dizem que as palavras tem poder. Eu digo que palavras são apenas palavras. - A Velha desviou o olhar da criança e olhou para sua conterrânea - O Sofrimento, por mais que tente, não tem o poder de tirar a sua esperança. O seu poder e, se ele ganhará ou perderá, depende só de você.
A Rainha contemplou atentamente a Velha por mais alguns segundos, pediu licença e voltou ao seu lugar. As demais senhoras já estavam demonstrando sinais de nervosismo. Do seu assento, a Rainha continuou olhando para a Velha, enquanto a última continuava a cantar.
O olhar da soberana desviou-se para o pequeno príncipe. Ele, continuava em seu leito, dormindo, diferentemente de todas as outras crianças. Recém nascido e alheio ao perigo que pairava sobre si, o príncipe dormia com um sorriso em seu semblante.
Devido a guerra, seu batismo de fogo ainda não havia sido realizado. Sua mãe temia por ele a cada novo forte estrondo que vinha dos corredores.
Continuou olhando para o pequeno, mas o que passava em sua mente, naquele momento, ninguém saberia.

***

O punho do Rei foi de encontro à mesa. A discussão cessou prontamente.
- Jamais, em todo o meu tempo de vida, ouvi proposta mais absurda. - O Rei levantou seu olhar e o dirigiu ao homem esguio sentado na outra ponta da mesa.
A frase que o Rei pronunciava foi interrompida pela abertura das portas do Grande Salão.
Pelo portal, um jovem pálido dirigiu-se, com velocidade, ao encontro do Rei. As atenções de todos voltaram-se para ele.
Ao encontrar-se à alguns poucos metros de distância do Monarca, o jovem parou sua caminhada, retirou seu elmo e fez rápida reverência.
- Majestade - Falou o jovem rapaz, ainda olhando para o chão. Moveu seu olhar para os olhos azulados do Rei e deu-lhe a informação. - Temo que trago-lhe as piores das notícias.
O Rei procurou descobrir do que se tratava antes que o Príncipe precisasse proferir qualquer palavra. Seu olhar foi de encontro ao do filho, mas, em seus olhos cinza, encontrou apenas a certeza da sua derrota.
- O Castelo de Alglória caiu, o senhor seu irmão, o Senhor dos Ventos, foi morto. - O príncipe olhou para os olhos de seu pai e vislumbrou o que nunca vira nesses, em toda a sua vida: medo e lágrimas. - Toda sua família foi assassinada.
A confusão

A Lenda Do Herdeiro Das ChamasWhere stories live. Discover now