Ele acelerou o veículo e logo eu ouvi outros sons de tiros. Procurei me segurar no banco e no apoio da porta pra não voar em cada curva. O percurso era escuro, a propriedade era íngreme a ponto de parecer uma floresta.
O indivíduo ao meu lado exalava raiva e eu procurei evitar até mesmo de gemer a cada batida na porta que eu dava devido a velocidade em que o carro se encontrava. Enquanto isso, a janela do motorista estava entreaberta e ele continuava a atirar. Pelos tiros que eu ouvi e percebi que o carro levou, aquele carro com certeza era blindado e carregava todo tipo de proteção possível. Também percebi que a arma que o meu "cliente" carregava possuía um silenciador. Engoli em seco diante de tal constatação. Meu coração batia em um ritmo extremamente descompassado e acelerado. Tenho certeza de que estava pálida. Eu não sabia o que mais me preocupava: se era a possibilidade de eu ser assinada pelos homens que nos perseguiam, ou se era a possibilidade de eu ser assinada após a perseguição, pelo homem que estava ao meu lado. O carro atravessara a propriedade quando quebramos uma cerca que havia ali. Subitamente vi um clarão e percebi que pertencia ao farol do carro que nos perseguia. O indivíduo ao meu lado acelerara e, quando percebi que estávamos correndo em direção à uma grande vala, gritei. Senti algo batendo em minha cabeça e, em seguida, minha vista escureceu e tudo se apagou.Minha cabeça doía bastante e meu corpo pesava. Fazia frio também, pude perceber. Eu não podia estar de ressaca, porque não bebia, mas talvez tivesse apenas pego no sono enquanto lia, por isso me encontrava nesta posição estranhamente desconfortável, sentada. Abri os olhos com dificuldade, percebi algo embaçado na minha frente, do qual não consegui identificar prontamente devido à escuridão. Apertando os olhos, percebi o que era. Um painel. Eu estava dentro de um carro. De repente me lembrei de tudo. Mas por que não sentia nenhum movimento?
Arfei com a dificuldade em arrumar a minha posição no banco. Meu corpo gelou, e não foi uma mudança na temperatura, mas sim porque lembrei que não desmaiei por causa de um acidente, ou de pânico. Eu levara um soco na cabeça, um soco que veio do motorista do carro em que eu estava. Olhei para o lado, mas não o encontrei. Será que ele fora morto pelos perseguidores? E por que haviam me poupado? Me aproximei do painel do carro tentando procurá-lo.
Identifiquei uma forma que se movia nas beiradas da vala. Estava com a mesma roupa, uma calça preta e vestia uma jaqueta com capuz, que no momento não estava em sua cabeça, denunciando os fios longos, que caíam até um pouco abaixo das orelhas. Seus cabelos eram castanhos claros. Mas não era sua forma ou figura que me atraiu ou preocupou, e sim o que ele estava fazendo.
Havia um carro prata caído na vala, se parecia com uma caminhonete. O indivíduo estava tirando os corpos do carro, que eu contei serem quatro, arrastando-os até a beirada da vala. Pareciam orientais, pelos traços, porém com a pele um pouco mais escura que o normal; coreanos, talvez? Fiquei me perguntando de que forma apenas um homem conseguiu dar conta de todos eles. A manobra perigosa que eu presenciei antes de desmaiar provavelmente culminou na queda do carro em que aqueles homens se encontravam na vala. O que demonstra que ele era inteligente. Eu só não estava pronta para presenciar a cena seguinte.
O indivíduo que, até momentos antes, eu estava beijando, agora apalpava aqueles quatro indivíduos à procura de armas e quem sabe o que mais. E, um por um, esfaqueava-os. Não era de forma bruta ou como auto-defesa, obviamente, e sim de maneira fria e calculada, um golpe no peito. Tive a impressão de que o meu sangue parou de correr. Havia algo no fundo da minha mente que, muito provavelmente por causa da ausência de quaisquer pensamentos coerentes, insistia em gritar para mim que eu deveria ativar o meu instinto de auto-preservação abrindo a porta do carro para sair correndo dali. Eu seria a próxima vítima, ainda mais julgando pelos golpes que eu levara do mesmo agressor anteriormente. Minhas mãos, de alguma forma inexplicável, conseguiram chegar até a porta na tentativa de abri-la. O carro estava travado. No mesmo momento ele olhara para o carro, diretamente para mim, seus cabelos caindo sobre a face. Tive a impressão de que ele escutara o movimento, mesmo com tamanha distância que havia entre nós. Ele juntou os pertences que havia recolhido dos homens, colocou a sua faca na mão de um dos cadáveres e seguiu em direção ao carro. Seus olhos estavam em mim, por mais que, eu desconfiasse, a película do carro fosse escura o suficiente para não possibilitar a visão. Lentamente ele caminhou até o carro. O porta-malas fora aberto, ouvi um barulho de itens sendo despejados nele e então a porta se bateu. Contei os segundos para que a porta do motorista fosse aberta. Agora eu era a vítima e tinha plena certeza de que seria assinada da mesma forma brutal que aqueles homens haviam sido. Com a diferença de que eu não estava
desmaiada. Não mais.
Um.
Dois.
Três.
Quatro.
Cinco.
E a porta do motorista se abrira.
O indivíduo sentou ao meu lado. Pelo canto dos olhos percebi algo reluzir, tinha certeza de que era a sua faca. Eu tremia, e não era de frio.
Ele se virou para mim. Apoiou uma de suas mãos, ainda segurando a faca, em cima do meu ombro direito. Reuni toda a coragem que havia me sobrado e olhei para ele. Seus olhos me fitaram, encarando-me indiscretamente. Seus olhos eram castanhos, claros, muito claros, e sua face era uniforme, assim como todos os seus outros traços. Era um homem atraente, não deveria ter muito mais que 30 anos. E era um assassino.
- Você não é uma prostituta.
Sua voz era rouca e grave, muito masculina.
- Não. – Não sei se pronunciei a palavra corretamente, para mim pareceu apenas um suspiro.
Ele posicionou a faca em minha garganta. Não a apertou, apenas senti de leve o material gelado encostar ali.
- Então quem é?
- Uma garçonete.
Ele pareceu surpreso com a minha resposta.
- E essa garçonete trabalha pra alguma quadrilha?
Eu franzi a testa. Bem, mas era claro, se aquele homem era um assassino, então sua desconfiança de que eu trabalhasse pra algum inimigo não era infundada.
- Não. – Eu suspirei novamente, minha resposta não soou convincente pra mim.
Ele me encarou mais um pouco. Olhou para baixo, para minhas roupas. Colocou a mão livre em meu quadril, embaixo da minha bunda, provavelmente procurando por algo em meus bolsos. Tirou algo de dentro do bolso esquerdo. Era minha identidade.
- América Ohai . – Leu em voz alta.
Ele tirou a faca do meu pescoço.
- Talvez fosse mais prático acabar com isso agora, mas estou curioso pra saber pra quem você trabalha.
Ele tirou a faca do meu pescoço, puxou o meu cinto de segurança e o prendeu ao banco. Ligou o carro e acelerou. Não olhei mais em sua direção. Senti um gosto amargo na boca. Era a certeza de que as informações que eu teria para dar não iriam satisfazê-lo. E que tampouco seriam pedidas com educação.
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behave yourself
Teen FictionApós ter que optar por um caminho difícil e questionável para sobreviver sozinha, América foi sequestrada, e agora é refém de um assassino, que a mantém por razões desconhecidas. Não é como se ela realmente se importasse, até porque ele parece ter a...