Capítulo 3 - Uma amizade inesperada

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Comecei a caminhar em passos largos, aquela conversa já estava a deixar-me irritada e confusa.
Depois de tantos anos a estudar juntos, os amigos dele riam da minha cor, das minhas roupas, de tudo.

-Leonor? Podes parar se faz favor? -Gritava Filipe

Virei-me de repente, que nem sequer reparei que os nossos corpos estavam tão juntos, um de frente para o outro, as nossas respirações eram ofegantes, foi quando
comecei a sentir um leve desconforto, o seu olhar era penetrante e intenso, e desta vez, comecei a olha-lo com outros olhos.

- Que é agora? Respondi de forma brusca, despertando daquele momento
- Desculpa... só quero o teu perdão, desculpa se paralisei, desculpa se deixei que te humilhássem à frente de toda a gente... - Sua voz estava embargada e o seu semblante abatido

- Olha vou ser sincera contigo, no início revoltava-me, ver que ninguém levantava um dedo para me ajudar, mas com o tempo habituei-me. E não precisas de ficar preocupado comigo, eu estou bem!
As pessoas não são obrigadas a gostar de mim, da minha cor, só?(9? quero respeito porque afinal eu sou um ser humano, tenho sentimentos, emoções, um coração de carne (e olha que ele sangra todo o dia). Vocês não tem noção de como isso abala uma pessoa, saber que te odeiam só por existir...

- Odiar? Leonor eu não acho que eles te odeiam... eles apenas... -respondeu Felipe

- Não tentes justificar as suas atitudes Felipe, as vossas atitudes! Vocês não tem consciência negra, sabes o quê é ter consciência negra? Ter consciência negra é saber que há muitos anos atrás os negros foram subjugados, humilhados e escravizados. É saber que várias mulheres africanas foram violadas por soldados na época da colonização. É saber que a sociedade define bonita se a mulher for de pele clara e cabelos lisos, porque cabelo crespo "supostamente é feio", lábios carnudos (características comum nos africanos) é "horroroso" mas hoje em dia todas querem ter lábios fartos... entendes o que eu digo? Não tenho nada contra os brancos, nós não temos culpa do que aconteceu no passado, e certamente não tem como alterar a história, mas era suposto haver igualdade e infelizmente ainda não há, quem é negro sabe, quem é negro sente.

- Não foi isso que eu quis dizer - retrucou Felipe arrependido - Não sabia que te sentias assim, não quero que te sintas mal.
- Já vai tarde Felipe, eu já me sinto assim há muito tempo, essa é a minha realidade.

E como que automaticamente, ele abraçou-me tão forte que pude sentir seus músculos, seu cheiro, aquele abraço... Ah aquele abraço, não sei como, senti borboletas no estômago, nó na garganta, parecia que eu conseguia tocar o céu com as mãos. O que foi isto?

Negra de Corpo e AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora