Querida mamãe
Aquela megera insana. Aquele demônio que habita pele humana. Aquele ser sem sentimentos. Aquela coisa fria e vazia. Aquela que chamo de minha mãe. Eu não suportava ter que chamá-la assim, muito menos quando me obrigava a dizer “sim, senhora”. Me sentia pior que uma escrava, me sentia oprimida ao máximo de minha alma.
Ela não sentia nada por mim, disso eu sabia, disso, eu tinha certeza. Como ela mesma dizia, eu não trazia alegrias, não trazia amor, fora uma falha na vida dela, a sua maior decepção, o erro que ela mais se arrependia de ter cometido.
No início, vertiam lágrimas pelos meus olhos, eu sentia dor toda vez que ouvia cada uma das palavras. Cada sílaba que saía de sua boca eram como agulhas furando meu corpo. Mas quando passamos a nos deitar em uma cama inteira de pregos, a dor deixa de existir. Então, quando ela cospe suas palavras venenosas pra mim, já não sinto mais.
Não me importa mais, mas eu preciso acabar com isso, preciso fazer com que essa mulher pare, ela importuna meus dias, inferniza minhas horas, transforma cada segundo que vivo em um sofrimento enraivecido. Preciso acabar. Acabar com isso. Acabar com ela.
Era aquela noite, naquele momento. Estava decidido, eu faria. O frio era perfeito, parecia envolver meu corpo e me dar coragem, sussurrando “faça, faça, faça…”. A faca da cozinha, a faca de cortar carne, ela era fria, como o frio que me impulsionava. Então, na cozinha eu pego a arma e quando noto, estou ao pé da cama da mulher, eu a observo.
Ali deitada qualquer uma poderia parecer frágil, mas não ela. Parecia que ela esperava que algo acontecesse, era como se risse de mim. Aquele rosto sarcástico… Eu a odiava, era isso, eu a odiava. E ali ela teria seu fim, levando minha dor com ela.
Eu sabia como deveria fazer, primeiro eu cortava a garganta, não tão profundamente, só o suficiente para que ela não gritasse. Então veria seus olhos abertos, em pânico, o mesmo pânico que eu sentia quando garotinha e não tinha ninguém que me acolhesse em braços amorosos. Depois ficaria esperando os momentos que a vida deixava seu corpo, como quando eu era adolescente e deixei de ver sentido na vida e, então, mutilaria seu corpo inerte, fazendo mais daquele sangue vermelho jorrar, demonstrando toda a força dos sentimentos que guardei até agora.
Sangue esse que já havia empapado todas as cobertas e estava por cima de mim. Eu continuava cortando, agora seus braços, fazendo verter sangue por cortes horizontais e esfaqueava também seu abdômen, de onde saia muito mais sangue. Eu já não conseguia mais identificar o que havia feito, mas o vermelho que via me mostrava que estava conseguindo o que queria.
Eu me cansava daquela tarefa, ela já se fora. Minha dor continuava. Ela deveria sumir também, não deveria? Eu agora só observava, sentei na cama, longe dela. Eu só buscava mesmo um lugar para descansar, queria tentar entender o que havia acontecido, mas realmente nada daquilo fazia mais sentido para mim, imaginei que ia chorar, mas nenhuma lágrima escorreu pelo meu rosto com respingos carmim.
-Muito bem, quando a senhorita quiser pode começar a depor sobre o assassinato de sua mãe, em que seu ex-namorado é suspeito.
Com minha melhor cara de choro e encenação respondo ao delegado:
-Eu lamento tanto ter dito tudo o que eu disse sobre minha mãe a ele. Provavelmente ele queria só me proteger, pobre mamãe!
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Minha Alma em Lamentos
Historia CortaO que fazer quando seu mundo vem abaixo? Quando você sente perder aquele que mais ama? Quando o único consolo parece ser o vazio, onde não se sente mais nada? O que uma garota que sofre é capaz de fazer por um amor? Vários contos com o mesmo tema, a...