Bip-bip-bip (Soava o alarme)
Hoje o alarme se atrasou, foram sete minutos de atraso, sete preciosos minutos da minha vida foram-se pelo ralo. Há um tempo eu não precisava de alarme, nem de horários, ela me acordava toda manhã com seu encantador sorriso e com o cheiro das deliciosas torradas que só ela sabia fazer.
Mas agora é diferente, eu não tenho mais ela para me acordar, para preparar meu café da manhã ou dar nó nas minhas gravatas, mas apesar que ainda não tenha aprendido a fazer nenhuma destas tarefas, eu tenho me esforçado. Meu maior atraso foi de treze minutos, minha última torrada saiu somente com as bordas queimadas e meus nós estão me enforcando menos.
É um grande progresso, fui de um inútil que não sabia fazer nada a um inútil que faz deliciosas torradas com bordas queimadas. Se ela me visse agora, com certeza sentiria muito orgulho, hoje eu sou um homem bem-sucedido e muito bem visto pela sociedade, e pensar que tudo isso custou a vida dela... um ano, hoje se completa um ano desde o dia em que ela se foi, e tudo que eu era antes se foi junto.
Eu me olho no espelho e não vejo nada mais que uma figura robótica, sem sentimentos, reconheço que me mudei completamente, me tornei um homem frio, mas ela era tudo o que eu tinha. A vida é irônica, antes eu não tinha nada além dela e era feliz, agora que tenho tudo... não tenho nada.
Olho pela janela e lá está ele, o princípio do acidente que levou ela, o orvalho que cai sobre nossas casas e carros sobre a manhã, com ele começou o grande pesadelo. Quem diria que algo tão insignificante na vida de alguns pudesse significar tanto na vida de outros?
Quem diria que uma coisa tão pequena pudesse causar um problema tão grande a ponto de acabar com a vida de uma pessoa? Pensando bem, não só de uma, mas sim de duas, até porque a minha vida nunca mais será a mesma.
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Chuvas de Verão
Short StoryUm homem se vê em uma crise existencial enquanto busca o sentido da morte de sua amada.