Capítulo 6 - UMA PEQUENA LUZ NA ESCURIDÃO

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UMA PEQUENA LUZ NA ESCURIDÃO

O DIA PASSOU PELA janela quase como um vídeo em câmera lenta, mas ele continuou sentando da mesma forma, no chão e com os livros espalhados ao seu redor. Pensou que aquela fase já tinha se passado assim como o pai que começou a se incomodar com aquele silêncio todo e quando o chamou para almoço, não obteve resposta. A porta estava trancada e o quarto silencioso. Achou que o filho estivesse dormindo como nos últimos dias. Mas enquanto uma parte da terra se escondia do sol e as nuvens se tornavam escuras, o homem foi ao quarto somente para verificar se estava tudo bem ou se ainda estava dormindo. De novo, silêncio. Ele se afastou, preocupado.

O sol já reinava alto e o dia já era a muito feito, mas Píer não se levantou, apenas ficou olhando para o além da janela. Sabia que o pai já tinha viajado, e ele não se importava. Ainda sentia a tristeza funda no próprio pensamento. Mas ao menos conseguia se levantar. Ele dirigiu-se até a cozinha, porém na mesma quietude da sua natureza, Rosana estava em pé próximo a pia, apenas acenou e voltou o rosto para a frente. Do que tinha na mesa ele apenas provou do café depois levantou-se e andou até o banheiro para escovar os dentes. Quando terminou pode apreciar o quanto era boa a sensação refrescante que tomava a boca. Ainda com os pés descalços abriu a porta da frente e se sentou na escada como dias atrás, só que dessa vez o frio estava lhe fazendo tremer. Ele não entendia como no um lugar podia ser tão quente e ao mesmo tempo frio. O vento balançava de leve as folhas em volta o capim já havia crescido alguns bons centímetros em volta da casa, estava tudo mais verde e mais bonito. A estrada lá em baixo era um risco em meio ao um tapete verde, no outro lado as matas se tornavam tufos verdes de vários tons. Ele queria vê-lo de novo, apesar de ele não saber exatamente porque, era o menino mais bonito que já tinha visto. Talvez se saísse um pouco e tivesse sorte a encontraria, ou talvez ele nunca o visse mais. Mas se contentou com a ideia de vê-lo novamente. Ele deixou o vento acariciar seus cabelos e fitou o espaço ao redor com uma hipnótica obsessão. Começando a definir cada parte da natureza a sua volta. –As nuvens estão escuras, o céu ainda está escuro, na verdade eu nunca o vi claro, e o céu de capital era mais azul e as nuvens raramente eram como aqui, os morros estão da mesma forma, porque eles não podem ser

diferentes, eu acho; as árvores continuam a mesma coisa também a não ser aquela lá na beira da estrada que o meu pai cortou, mas ele já plantou outra do outro lado: tudo aqui é quase sempre mesma coisa. Sentenciou ele ao perceber que o mundo a sua volta era impressionantemente repetitivo e entediante.

Seus pensamentos forma interrompidos por vozes e uma risada histérica provavelmente vinda da cozinha. Levantou-se quase que como um espião, e andou sorrateiramente por entre os moveis da sala e parou próximo à porta da cozinha.

Por entre a visão limitada do batente, ele o viu atrás da mesa. Os cabelos pareciam mais claros com a pouca luz do ambiente, os olhos castanhos agora tinham um brilho fosco, os lábios curvados em um sorriso silencioso. Do outro lado Rosana tentava limpar manchas redondas e marrons que pintavam o seu vestido rosa, mas Píer parecia perceber somente o menino que tanto ele queria ver, mas que agora já não sabia se queria que o outro menino o visse. Sentiu tanta vergonha que suas bochechas esquentaram. –Píer querido! A voz da madrasta lhe causou um pequeno choque, como se fosse flagrado praticando alguma travessura. –Hã...? Foi o único som que saiu da sua garganta, ainda estava em um transe meio embaraçoso. –Queria que conhecesse o Jerome, quem sabe vocês não podem ser amigos. A mulher pronunciou sussurrando as palavras. A situação se tornou ainda mais embaraçosa, quando o menino virou e acenou para ele. –Hum... um. Uma gaguez estranhamente vergonhosa lhe tomou a voz. –Oi. Foi o menino que pronunciou do outro lado da mesa. A mulher se afastou e voltou para a pia, deixando Píer ainda mais descompassado. Como um homem de coragem, apesar de ele nunca se considerar um homem de coragem, andou até o garoto e lhe estendeu a mão. O menino não demonstrava nervosismo algum, sutilmente retribui o aperto de mão. Píer não sorriu, apenas lhe deu um breve aceno e separou as mãos. – Esse é meu filho, Jerome. A madrasta falou como se fosse um segredo. O garoto sorriu travesso e quando desviou o olhar para vê-lo, Píer já estava saindo. –Píer! Porque não chama o Jerome pra brincar?

Os Garotos na ChuvaOnde histórias criam vida. Descubra agora