Um

165 15 2
                                    

25 de abril 2017

Quando finalmente chego em casa já são uma e meia da manhã. Estou morta.

Como em todos os meus dias, eu fui para a faculdade de manhã, tendo que acordar cinco horas, pois moro muito longe; depois fui para uma lanchonete/barzinho, onde trabalho nos turnos de tarde e noite. Geralmente eu fico até mais tarde, mas, como hoje é sexta, saio mais sedo, o que é muito bom, porque, pelo menos assim, poderei estar mais descansada amanhã, para meu filho.

Quando entro na sala de casa, ouço a voz da minha mãe me chamando:

— Manoela, é você? — Ela parece cansada. Hoje o Murilo, meu filho, deve ter demorado para dormir. Ele sempre demora nas sextas, fica tentando me esperar acordado, mas nunca consegue, até porque ele acorda junto comigo, o que é sedo, mas não posso fazer nada, ele tem que estudar, e essa é a única hora do dia em que posso levá-lo à escola.

      Não gosto nem um pouco de não ter muito tempo para o meu menino. Ele já não tem pai e, somado à uma mãe que não para em casa, isso é ainda pior.

      — Oi mãe. — Respondo encontrando-a no meio da escada. — O que foi? Por que a senhora ainda não foi dormir?

      — Não é nada. Só queria me certificar de que você comeria hoje. Está tão magrinha... Tem que ter energia para acompanhar seu filho.

      — Verdade, preciso ter bastante energia. — sorrio ao respondê-la. Murilo realmente tem bastante energia, não para quieto!

      — Você já comeu hoje? — Perguntou ela, me analisando.

      — Sim, comprei um sanduíche quando estava voltando — falo  e completo, sem dar chance à ela de protestar. — Agora eu vou descansar. Quero que amanhã seja um ótimo dia. Faz tempo que não fico um dia inteiro com o Muh.

      — Certo, então boa noite, filha.

      — Boa noite, mãe — dou um beijo nela.

      Depois de tomar banho vou direto para o meu quarto, que tem somente uma cama  de solteiro e um colchão no chão. Eu durmo no colchão, não poderia deixar Murilo dormir lá, ele poderia ficar doente!

     Quando entro no quarto vejo que o Muh está se mexendo na cama, então faço o máximo de esforço possível para não fazer muito barulho e acorda-lo.

      — Mamãe? — Ouço sua vozinha sonolenta me chamando. — É você?

      — Sou eu, meu amor — deito ao seu lado, dando-lhe um beijo. — Tá tudo bem com você? — Acaricio sua cabeça.

      — Tô bem, e você? Vovó disse que você não anda comendo direito.
  
      Sorrio.

      — Tô comendo sim. Vovó que acha que tenho que comer tudo que vejo pela frente para estar comendo direito.

      — Mamãe? — Me chamou de novo depois de um tempo, ainda sonolento.

      — Fala meu amor.

      — Agente vai no shopping amanhã, não vai? — Ele parecia ansioso.

      — Claro que vamos. Eu não disse à você que iríamos?

      — Disse. Mas a senhora não vai ficar muito cansada? — Perguntou, preocupado. Bem, eu com certeza ficaria cansada, mas faria de tudo para não deixar isso transparecer para ele.

      — Não vou não — menti. — mas agora, vamos dormir, se não, o senhorzinho é quem ficará cansado amanhã. — Digo, já me levantando da cama.

      — Não, fica — ele segurou minha mão. — Eu quero dormir com você.

      — Você não vai ficar desconfortável? — Pergunto, a última coisa que quero é atrapalha-lo

      — Claro que não mamãe. — Ele responde, abrindo mais espaço pra mim na cama.

      Me deito e fico acariciando a cabecinha dele, até que o sono me vence e acabo dormindo.

                               §

      Acordo sem nem mesmo saber onde estou. Parece que dormi uma eternidade, e fazia  tempo que eu não dormia tão bem assim. Acho que dormir abraçada com o Murilo ajudou bastante. Às vezes ele é a única coisa que faz com que eu me sinta bem e feliz; que faz parecer que todas as escolhas que eu fiz na vida foram realmente certas, o que eu questiono, com certa frequência, se é verdade.

      Me levanto e vou para o banheiro escovar os dentes e trocar de roupa. Depois desço e encontro meu filho deitado no sofá assistindo desenho.

      Vou até ele é lhe dou um beijo:

      — Bom dia, meu amor!

      — Bom dia, mamãe! — me cumprimentou, abraçando-me.

      — Já tomou café, meu anjo?

      — Já. Na verdade já vamo almoça — ele responde.

      — Não é assim que se fala. Como a mamãe te ensinou?

      — "Na verdade já vamos almoçar" — ele se corrigi.

      — Parabéns! — dou-lhe um beijo. — Hoje vou te dar um presente que sempre disse que daria ao meu futuro filho. Talvez você ainda seja um pouco novo, mas acho que isso poderá ajudá-lo a aprender à falar certo. E vou tentar passar mais tempo em casa para poder ajudar você.

      — E o que é, mamãe? — ele perguntou, ansioso e sorridente.

      — É surpresa! Espero que você goste. E isto que eu disse, foi somente para deixá-lo mais ansioso.

      Ele sorriu e disse:

      — Tenho certeza que vou adorar, mamãe! — dou um beijo em sua bochecha.

      Assisti um pouco de desenho com ele e depois fui ajudar minha mãe com o almoço.

      Depois de comermos fomos para o shopping, com o carro do meu pai. Eu não tinha carro, não queria gastar dinheiro com esse tipo de coisa.

      Pretendo comprar um apartamento para mim e para meu bebe, mas meu trabalho na lanchonete não ajuda muito na realização desse sonho e, como só me formei no ensino médio com dezenove anos, porque parei de estudar para cuidar do Murilo, não consegui fazer a faculdade no tempo certo e nem conseguir um emprego melhor. Mas não me arrependo nada, de ter parado de estudar, até porque eu voltei depois. Acho que essa foi a melhor escolha que eu fiz, até mesmo melhor do que deixá-lo sem pai. Dessa eu não tinha tanta certeza.

Só mais uma chanceOnde histórias criam vida. Descubra agora