Parte IV

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-  Viu meu irmão!? - perguntei para o Nando, que me espera no portão de saída da escola como todos os dias, ele estava sentado na calçada ao lado de alguns amigos que fumavam com ele.

- O babaca quatro olhos!? - Ele se levantou para se aproximar de mim.

- Ei, meu irmão não é nenhum babaca! - alterei a voz chamando a atenção de alguns alunos que transitavam na frente da escola - E quatro olhos é insulto de primário!

- Calma, gata! - Nando passou o braço em volta da minha cintura aproximando-se do meu rosto.- Foi só uma brincadeira!

- Vá brincar com seus amiguinhos! - soltei-me dos braços de Fernando e olhei em volta tentando encontrar Lucas mais uma vez.

- Volta aqui.- Nando me puxou pelo braço, soltei-me dele.

- Depois conversamos, preciso fazer algo muito importante!

- Depois não, agora! - ele me puxou de volta e beijou meus lábios rapidamente.

- Será que você não entende!? - afastei-me mais uma vez- Quando eu digo não, é não! Se você não consegue respeitar um pedido tão simples assim​ é melhor se afastar de mim!

- O quê!? Você está terminando!?

- Ué, a gente nem namora! Foi o que você mesmo disse outro dia, esqueceu!?

- Juliana… o otário do Lucas encheu sua cabeça de besteira, não é!?

- Já falei pra não insultar meu irmão! - dei um passo a frente para enfrentar Nando - Eu não quero te ver mais! -  em seguida dei as costas para ele.

Fernando continuou gritando por mim, comecei a correr assim que avistei Lucas com o grupinho de amigos dele, sempre os mesmos garotos e uma menina que não saía do pé dele.

- Lucas! - gritei sem parar de correr para alcançá-lo, depois da aula ele sempre ia para casa de algum dos amigos.

- Quem morreu!? - ele perguntou me esperando chegar mais próxima a ele.

- Não brinca com isso - estava ofegante - Depois de amanhã é dia das mães e a gente não fez nada!

- Você não fez! Porque eu comprei a trilogia de um romance americano que ela estava de olho a algum tempo. - Lucas falava sem tirar os  olhos da​ bola fazendo embaixadinha, metido! - Se você não reparou eu fiquei alguns dias sem comer cachorro quente na cantina da escola!  

- É, eu não reparei! - Lucas sempre gostava de estar a frente em tudo, e nós sempre competimos - Mas, que romance é esse!? De uma escritora com nome estranho!? Fitz alguma coisa!? Porque a mamãe chegou com uma trilogia dela ontem!

- Ah não!? Não pode ser! E agora!? -  Lucas paralisou deixando a bola escapar - Passei fome à toa!  - gargalhei com o desespero dele, os amigos de Lucas não entenderam nada, enquanto ele semicerrou os olhos já entendendo o que estava acontecendo.

- É brincadeira, maninho! - finalmente falei - Mas, preciso da sua ajuda! Urgente!!!

- Temos amanhã para fazer tudo, o dia das mães é só no domingo!

- Não, espera! - tinha tido uma ideia brilhante - Ela já deve ter em mente que nós faremos algo no domingo, mas não hoje! E se…

- Não, não vai dar tempo, Ju! - Lucas pegou a bola outra vez.

- Me encontra em casa daqui uma hora, ela já terá saído para o trabalho. Eu aviso que você foi jogar bola.

- Mas…

- Confie em mim!

Passamos a tarde, Lucas e eu, fazendo minha ideia se concretizar. Fizemos frases que foram coladas em barbantes junto com algumas fotos da mamãe ao longo dos anos, tinham fotos dela bem novinha, já adulta, no casamento, grávida e até uma ensinando Lucas e eu a fazer o dever de casa -  foi meu pai a nos fotografar, lembro desse dia - nela era possível ver que tínhamos acabado de perder os primeiros dentes, até isso fizemos juntos.

Quando Pedro chegou Lucas estava terminando de pendurar os barbantes com as fotos e as frases no teto da sala e eu terminando de ajeitar as poucas velas decorativas que havia conseguido comprar. Pedro é gerente da padaria em que minha mãe trabalha, ele não pensou duas vezes em nos ajudar quando liguei para contar o que pretendia fazer. Pedi para ele sair mais cedo do trabalho para chegar antes de minha mãe em casa e que trouxesse uma pizza Margueritta de lá porque era a preferida dela, deixei claro que só poderia pagar por uma pizza, mas ele se prontificou em pagar pela pizza, então, trouxe mais duas e com elas um buquê de rosas vermelhas.

Eu não tinha certeza se Pedro era o cara certo para mim mãe, parecia ser honesto e trabalhador, era um quarentão formoso e sem filhos, mas só minha mãe poderia dizer se ele era o cara certo. Sim, eu estava admitindo que era hora de minha mãe se permitir amar outra vez, por mais difícil que aquilo fosse para mim, vê-la com outro homem seria estranho!

Ficamos em silêncio quando ouvimos o som do portão ser aberto e fechado por ela, a casa estava escura, apenas as velas espalhadas na sala acesas. Mamãe murmurou algo que não entendemos antes de abrir a porta e quando ela, finalmente, colocou o pé na sala gritamos:

- Surpresa! - Lucas foi quem mais gritou, o exagerado da família - Feliz dia das mães!

- O que é isso!? - Mamãe olhou tudo a sua volta surpresa, Lucas acendeu a luz para que ela pudesse enxergar as frases.

Conforme ela ía passando pelas fotos e frases ela ria e derramava lágrimas, era tão emotiva quanto minha amiga, nesse ponto elas poderiam ser mãe e filha. Havíamos colocado frases como “A melhor mãe do mundo”; “Nossa eterna professora”; “Mulher Virtuosa”; “Nossa Heroína”.

- Que lindo… ah esse dia foi espetacular! - ela disse apontando para uma foto e parando no centro da sala. - Não sei como agradecer.

- E nem precisa! - Lucas se aproximou a abraçando - Você merece isso e muito mais!

Pedro e eu nos aproximamos também e abraçamos ela juntos com Lucas, abraço coletivo.

- Espero não se incomodar com minha presença! - Pedro disse.

- De forma alguma! Obrigada por estar aqui! - Mamãe falou quando a soltamos.

- Vamos jantar, antes que a pizza esfrie! - Lucas falou puxando mamãe pela mão.

- Mais surpresas!? Que delícia! - ela estava surpresa de verdade, e eu satisfeita com tudo, ou quase tudo, faltava algo.

- Ei, Pedro! - falei antes de chegar na cozinha, ele parou para me ouvir - Entregue as rosas.

- Ah sim. - Pedro pegou as rosas que estavam sobre o sofá e levou até a cozinha - Maria Cecília, feliz dia das mães! Você é a mais bela de todas.

- Ah que querido! - mamãe falou corada. - Muito obrigada!

- Mãe, perdão! Eu sei que tenho sido uma tola, mas saiba que eu te amo! Estou arrependida por minhas atitudes e prometo que vou ouví-la mais vezes… Eu quero que você seja feliz. - Entreguei o diário nas mãos dela, e pelo semblante, percebi  que ela entendeu tudo - Lucas e eu jamais pensaremos mal algum de você.

- Eu também amo tanto vocês… Eu não quero que vocês se sintam…

- Tudo bem, mãe! - Lucas insistiu tocando o diário - Sua felicidade é a nossa.

Mamãe derramou algumas lágrimas e sorriu nos abraçando, Pedro estava confuso, não entendia do que falávamos. Mesmo perdido no diálogo, sorriu feito um bobo quando mamãe nos soltou e foi em direção a ele para um abraço apertado, em seguida o puxou pela mão para a mesa que estava ao lado da janela, dando-nos uma bela visão da lua que estava linda naquela noite, mas não o quanto ela.

Mãe é gente, como a gente!Onde histórias criam vida. Descubra agora