FOOD EXPERIENCE

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Jorge me abraçou quando empurrei a porta de vidro. Seus olhos arregalados me assustaram. Fora do L.o.v.e. ele tinha outro aspecto, bem parecido com o meu, o de um morto vivo.

- Não sei dizer como estou feliz por você ter vindo, Luíza.

- E eu não sei exatamente o que vim fazer aqui. – Respondi com a voz murcha, no abraço percebi que não o amava fora do L.o.v.e. Não passava de uma ilusão.

Ele me encarou alguns segundos, depois me soltou e me puxou pela mão até um dos computadores mais próximos.

- Nós temos 19 minutos para chegar ao hospital e roubar o QRCode de um recém-nascido. – ele digitava freneticamente enquanto falava - Descobri uma falha no aplicativo, mas não posso voltar como Jorge. Vou invadir o L.o.v.e. quando a hibernação começar e vou deslogar todos os usuários do aplicativo.

- Você enlouqueceu. Eu vou voltar.

Era cruel demais. Os recém-nascidos faziam parte de um projeto do L.o.v.e. para que as mulheres pudessem voltar a engravidar, depois do bug no aplicativo, o governo anunciou que todas haviam se tornado estéreis, e o L.o.v.e. reproduzia bebês no hospital com a ajuda de voluntárias. Quando um bebê nascia, era praticamente um milagre.

Dei as costas e andei até a porta, mas Jorge me segurou pelo pulso.

- Não antes de ver a verdade! Nós somos a única chance que eles tem, Luíza! Você não entende?

Ele me arrastou escada abaixo e continuou me puxando até o outro lado da rua.

- Me solta! Você quer condenar um bebê a essa vida? – Apontei para a cidade caindo aos pedaços e o monte de lixo acumulado por todos os lados. – O bebê vai precisar do QRCode pra se conectar!

- Olha, Luíza. Olha!

Jorge me segurou pelo queixo e forçou minha cabeça a virar para o lado. Uma parede de vidro nos separava de um grupo de pessoas jantando.

- Sabe aquelas pessoas ali, sentadas na mesa comendo aquela pasta branca nojenta?

Elas estão vivendo o Food Experience.

- Não.

Levei a mão ao estômago para conter o embrulho.

As comidas no app pareciam maravilhosas. O aspecto, o aroma, o sabor, ao menos isso era o que as células do L.o.v.e. nos transmitiam, agiam em nosso cérebro como um filtro por cima da realidade.

- E daí, Jorge? Eles parecem felizes.

- Isso é falso! Falso!

- E daí? Você não trabalhou na Essex Inc.? Não ajudou a criar tudo isso antes de ser demitido? A culpa também é sua!

- É exatamente por isso! Eu devo isso às pessoas, preciso consertar essa cagada!

Jorge me soltou e cruzou à entrada do restaurante.

- Não! O que você vai fazer?

Falhei ao tentar segurá-lo.

Ele se aproximou da mesa onde as pessoas comiam extasiadas, e deu um tapa com força no centro. Pratos e talheres voaram para todos os lados. A papa gosmenta de um dos pratos caiu no colo de uma mulher e ela levantou gritando.

O mais estranho era que ninguém olhava para ele, que continuou a atormentar as pessoas derrubando copos e garrafas no chão.

- Jorge, chega!

Gritei e ele veio ao meu encontro.

- Sabe por que eles não fizeram nada? Porque eu fiz o logout, e estando fora do L.o.v.e., ninguém pode me ver.

Não consegui digerir o excesso de informação. Arregalei os olhos e o encarei. Eu tinha algo em torno de quinze minutos para decidir como seria o resto da minha vida.

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Prezado leitor, a história se aproxima do final.

Está preparado?

L.O.V.E.Onde histórias criam vida. Descubra agora