Capítulo 2

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Alana acordou se sentindo um pouco melhor. Uma boa noite de sono tinha revigorado o seu físico, havia feito pouco pelo seu emocional. Algumas lembranças embaçadas inundavam sua mente de imagens da noite anterior. O frio do ar condicionado a fazia encolher se cada vez mais debaixo do edredom, o que levou a garota a procurar pelo controle do aparelho para aumentar a temperatura. Pegou o celular ao lado da cama e ligou a lanterna, atrás do pequeno controle. Quando o achou, conseguiu deixar o quarto em uma temperatura mais agradável.

Com o celular ainda em mãos, ela verificou as horas. 10:27. Já que era sábado, Alana resolveu ficar descansando um pouco mais. Abrindo o Instagram, viu algumas fotos da festa da noite anterior e blogueiras fitness exibindo seus cafés da manhã totalmente saudáveis. Alana preferia um copo de achocolatado e um misto quente na padaria que ficava a cinco minutos de casa. Podia ter um monte de calorias, mas a garota preferia comer algo que a deixasse bem e tranquila para ir à faculdade. Continuou descendo e visualizando mais fotos. Quando enjoou de espiar a vida dos outros, ligou para Mari. Esperava que a amiga fosse com ela na delegacia para denunciar o homem que havia a assediado na noite anterior, já que tinha descoberto o nome do rapaz. Mesmo que a denúncia não desse em nada e não melhorasse 1% do estado dela, a garota pelo menos teria feito sua parte. Sua única chance era confiar na justiça (será que era mesmo justa?) e esperar.

Mari não atendeu, o que decepcionou um pouco Alana. Ela resolveu tomar um banho e esperar que a amiga resolvesse atender. Provavelmente ainda estaria dormindo, então só lhe restava esperar a Bela Adormecida acordar.

Levantou da cama e foi em direção ao banheiro. Tomou uma ducha rápida e fria, para ver se despertava de vez. Quando terminou, colocou um moletom, já que estava chovendo um pouco e uma atmosfera fria tinha tomado conta da cidade. O clima de São Paulo não fazia sentido, mas era agradável na maior parte do tempo. Foi em direção a cozinha, desejando um café bem quentinho e alguns minutos de paz. Escolheu uma cápsula de expresso e colocou na máquina, que havia ganhado de presente do pai, amante de café, como ela. Enquanto esperava ficar pronto, ligou a televisão e procurou algo decente para ver. Encontrou "Tempo de despertar", um filme que era apaixonada. Era um dos seus favoritos e a garota já havia assistido milhões de vezes. Entretando, resolveu ir atrás de outro, algo mais leve para um sábado de manhã. Parou em "Vestido da noiva", um romance que parecia interessante. Deixou começando e foi pegar sua bebida, que já estava pronta e exalava um cheiro agradável. Sentou-se no sofá e foi degustando a bebida quente, enquanto a chuva engrossava lá fora. Mais ou menos no meio da narrativa, o celular tocou. Resmungando por ter que perder alguns minutos da história, Alana se levantou, com a caneca ainda meio cheia. Olhou o visor e viu que era Mari. Finalmente! Atendeu correndo, nem se importando mais com o filme que passava.

- Ei, podemos ir na delegacia hoje? Por favor, eu quero ir logo. - falou.

- Bom dia para você também Alana. - disse Mari, em um tom de irritação que não era verdadeiro. - Podemos sim. O nome do homem é Jorge. Um dos meus colegas disse que ele é conhecido na faculdade por ficar com muitas meninas nas festas e algumas já deram queixas de assédio. Ele só paga uma multa... - disse, claramente chateada com a punição branda que aplicavam a ele.

- Entendi. - a outra ficou decepcionada, mas não estava nem um pouco surpresa. O Brasil funcionava assim e não parecia caminhar em direção a uma realidade em que qualquer tipo de assédio fosse severamente punido. - Enfim, eu quero ir independente disso. Mesmo que ele só pague uma multa e seja liberado, quero que ele sofra as consequências. Vai me deixar um pouco melhor, acho.

- Tudo bem, nós vamos. Só me deixe tomar um banho e passo aí para te buscar. Em trinta minutos chego.

- Obrigada, obrigada, obrigada. Já disse que te amo hoje? - disse Alana, brincando.

- Não disse, mas eu sei. - Mari respondeu, rindo. - Lana, eu queria esclarescer para você que ontem quando estava dirigindo, eu estava totalmente sóbria. Fui atrás de outra bebida, mas quando vi você ali larguei tudo na mesma hora. Não tinha bebido absolutamente nada, tá? Só para você saber que jamais colocaria você em risco.

- Eu sei disso. Mas acho que estava tão absorta nos meus pensamentos que mesmo que você tivesse bebido, eu não perceberia. Obrigada. Estou te esperando.

- Indo tomar banho agora. Trinta minutos, não esqueça. Beijo, até daqui a pouco. - Mari disse e desligou.

A garota desligou a televisão e foi se trocar. Ela procuraria o filme na Netflix mais tarde para terminar de ver. Trocou o moletom por uma blusa de mangas compridas e uma calça jeans, já que estava frio. Terminou seu café e levou a caneca até a pia. Lavaria tudo mais tarde. Escovou os dentes e foi arrumar sua cama. Manias que a avó tinha passado para ela. Quando terminou, se jogou no sofá e ficou esperando a amiga chegar. Assim que escutou o interfone, pegou a bolsa que continha sua identidade, o celular e algum dinheiro para emergências. Desceu as escadas de dois em dois degraus e praticamente voou em direção a Mari, que estava a pé. Como a delegacia não era tão longe, elas iriam andando.

- Tem tempo para comermos alguma coisa depois? Só tomei um iogurte antes de sair de casa. - disse, levando as mãos a barriga. - Não vai me sustentar por muito tempo!

- Tudo bem, podemos ir. Tem um bolo de aipim em casa, preciso terminar. Você quer? Minha mãe que mandou. - Alana perguntou.

- Tá perguntando por que mesmo? Você acha que eu sou louca de recusar o bolo da sua mãe? Pelo amor de Deus. - Mari respondeu, rindo.

Elas começaram a andar pela calçada e Alana começou a falar sobre o filme que tinha parado na metade. Mariana não era muito fã de romances e preferia comédias, mas escutou atentamente a amiga contar todos os detalhes da obra. Quando finamente chegaram a delegacia, Alana estava um pouco nervosa e apreensiva. Nunca tinha ido prestar queixa de alguém antes, mas elas entraram e cumpriram todo o protocolo. Mari tentou confortar a amiga durante todo o período que passaram no local, o que foi reconfortante e a ajudou a lidar com todo o processo.

Assim que terminaram, fizeram o caminho de volta até o apartamento e subiram. Já era hora do almoço e resolveram cozinhar alguma coisa. Acabaram por fazer arroz e frango grelhado. Não tinha ficado perfeito, mas dava para comer.

- Ei, o que vai fazer hoje? - Mari perguntou.

- Ler, alguma coisa assim. Não estou muito afim de sair. Amanhã vou fazer a mesma coisa, acho.

- Entendi. Queria ir no shopping amanhã e comprar um livro novo, mas posso escolher algum da biblioteca da Alana?

A outra riu. Mari sempre dizia que Alana tinha tantos livros que podia abrir uma biblioteca. Então, o apelido foi para o lugar onde ela guardava seus bens mais preciosos.

- Pode sim. Vai escolher o que hoje? Comprei dois novos que ainda não li, então não pegue esses.

- Você tem "O mundo de Sofia"? Queria ler, me recomendaram. - perguntou Mari.

- Tenho! É um dos meus preferidos, mas fala sobre filosofia. Tem certeza que vai querer?

- Ah, pode ser. Se eu não gostar, devolvo e pego outro, tá?

- Tudo bem, vou lá pegar daqui a pouco. - disse e levantou, levando o prato vazio de ambas para a pia. - Vai querer o bolo de sobremesa? Vou atacar o sorvete.

- Quero o bolo sim. Mas também quero um pouco de sorvete. Tem de quê?

- Flocos e pistache. Comprei da última vez que meus pais vieram aqui, semana passada. - respondeu, cortando uma fatia do doce para Mari e colocando em um prato.

- Flocos, odeio pistache.

Alana levou o bolo para a amiga e depois pegou dois potes pequenos e colocou o sorvete dentro. Voltou para a mesa e se sentou.

- Acho que vou roubar sua mãe. Olha isso, meu Deus! - Mari falou, comendo um pedaço atrás do outro. - Nunca comi nada tão bom quanto as sobremesas dela.

Alana riu e tomou mais uma colherada do seu sorvete de flocos. A amiga era uma pessoa alegre e divertida, sempre levantava seu astral. Ela precisava mesmo se distrair um pouco. Agradeceu silenciosamente a Mari por ter entrado em sua vida e por ter salvado Alana de se perder.

"Mas afinal de contas", pensou, "amigo é para essas coisas."

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