Capítulo 6

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Ele estava lá.
Naquele momento, as estrelas podiam cair do céu, o mar podia engolir a Terra inteira, o Sol podia explodir e engolir tudo o que havia pela frente e, oh, céus, era inevitável que Yuri se sentisse daquela forma.
Isso pode parecer drama, mas, poxa, Otabek estava lá, na Rússia, na frente dele. E não conseguia nem se lembrar mais do porquê de estar bravo, tudo o que Yuri podia fazer era sorrir. Sorrir com tudo o que sentia, um sorriso que se refletia em seus olhos, iluminava seu rosto inteiro, tamanha era a felicidade que sentia ao ver ele novamente depois de tanto tempo.

"O que você está fazendo aqui?" os dois se sentaram para conversar em uma cafeteria do aeroporto e as bochechas de Yuri doíam de tanto que ele sorria. E ainda tinha aquela sensação no estomago de que havia insetos bastante agitados batendo as asas lá dentro.
"Eu queria muito ver você." Otabek parecia envergonhado, mas era sempre tão sincero.
Yuri sentiu seu coração acelerar e seu rosto se esquentou. Ele tentou pensar em algo para dizer, se lembrou do urso que estava na mala e se abaixou para procurá-lo.
"Comprei uma coisa pra você!" entregou o ursinho para Otabek e segurou o gato para que ele visse. "Esse aí é pra você e esse pra mim." Ele sorriu e Otabek também.
"Obrigado. Mas, se não se importa..." ele pegou o gatinho da mão de Yuri e colocou o urso no lugar. "Eu prefiro esse."

Uma garçonete trouxe as coisas que eles pediram para comer, um bolo de Yuri e algum salgado qualquer de Otabek. Quando ela saiu, Otabek perguntou o motivo de Yuri ter voltado à Rússia antes do prazo combinado.
"Por causa daqueles dois idiotas." respondeu. "Parece que o Katsudon só queria ir ao Japão porque era lá que ele pretendia dizer ao Victor que gostava dele. Aí eles começaram a sair e eu achei que não valeria a pena ficar."
"Entendo."
"Mas até que foi legal. Eu tive que ajudar o Katsudon porque ele estava morrendo de medo de o Victor não gostar dele do mesmo jeito. Ele é tão idiota." Yuri revirou os olhos rindo.
"Por que ele estava com medo, eles não são almas gêmeas?"
"São, mas ele não sabe, o Victor não queria contar. E eu acho que ele nem se importa realmente porque, tipo, ele gosta mesmo do velho, então não ia fazer diferença se eles não fossem."
"Bem, se o Victor não contou deve ter algum motivo, não?"
Yuri estranhou o interesse de Otabek pelo assunto, mas não se importava de falar sobre aquilo. "É, ele falou alguma coisa sobre querer que o Yuuri goste dele de verdade, não por causa disso. Sei lá, não entendi muito bem."
"Acho que ele quis dizer que não queria que o Katsuki se sentisse forçado a ficar com ele por causa disso, mas que gostasse dele de verdade."
Yuri ficou surpreso, primeiro porque não era sempre que ouvia uma frase tão grande sair da boca de Otabek, e também porque ele não entendia de que forma aquilo poderia ser relevante. Ele estava tentando entender o que Victor dizia, por quê? Que diferença faria para ele?
Yuri continuou apenas porque queria ver aonde aquilo acabaria. "Hum, é, acho que é isso. Mas é idiota, porque eles não precisariam ficar juntos só porque são almas gêmeas. Mesmo sabendo disso, se não gostasse dele o Yuuri podia ficar com outra pessoa se quisesse."
"Então você acha que ele deveria ter contado..." isso é importante?
"Sim."
"Tem razão." ele terminou de comer e olhou para Yuri, sorrindo. "Você ainda vai treinar hoje?"
E, simples assim, ele encerrou aquele assunto. Yuri achou estranho e ficou curioso sobre aquilo, mas resolveu que poderia interrogar ele depois. Ele teria tempo para isso.
"Não, eu vou deixar para enfrentar a fúria do Yakov e da Lília amanhã." respondeu, então pensou em algo. "Otabek, você pode treinar comigo enquanto estiver aqui!"
"Sim." ele provavelmente já tinha pensado nisso. Sorriu.
"E fazer balé também."
"O quê?" Otabek arregalou os olhos levemente, surpreso.
Yuri riu da reação dele, e ele também riu logo em seguida. Deve ter pensado que era brincadeira. Pobre Otabek...

"Yurio!" Yuuri Katsuki se surpreendeu ao receber uma ligação de Yuri algumas noites depois de ele ter voltado à Rússia. Ele parecia cabisbaixo, ao que Katsuki também achou estranho. "Algum problema?"
"Yuuri, você não se importava de gostar do Victor mesmo sem saber se vocês eram almas gêmeas?" ele estava pensativo.
"Hum, por que está perguntando isso?"
"Eu só quero saber."
"Oh, bem... Eu me importava no começo, mas agora não mais."
"Por quê? O que mudou?"
"Antes eu tinha medo de que não desse certo por causa disso, de que nós acabariam os encontrando pessoas que gostaríamos mais, que as coisas começassem a ficar estranhas entre nós. Mas eu comecei a perceber que o que eu sentia por ele era muito forte, que quanto mais eu conhecia ele, mais forte ficava, e que, não importava se aparecesse outra pessoa, esse sentimento não ia mudar. Eu sei que nunca vou sentir algo tão forte assim por outro alguém. E aí eu soube, Yurio, que valia a pena arriscar tudo por causa desse sentimento."
"Entendo."
Ele ficou em silêncio por um tempo, pensando no que Yuuri disse. Yuuri o observava sem dizer nada, até chegar a uma conclusão e a deixar escapar em voz alta. "Yurio, você está gostando de alguém?"
"O quê? Não, não!" exclamou de imediato, assustado com a pergunta. Mas percebeu que não tinha um bom motivo para esconder aquilo de Yuuri, que, depois do que aconteceu no Japão, não riria dele por esse motivo, então disse: "Bem... Talvez..."
"Você quer me dizer quem é?"
"Não!" Yuuri poderia não rir dele por isso, mas já estava querendo se meter demais na vida dele. Não que ele realmente esperasse que Yuri contaria tanto.
"Certo, certo. Bem, boa sorte."
"... Obrigado. Até a próxima semana."
"Até."

Quando viu seu contador zerado, Yuri tentou se lembrar das pessoas que tinha visto aquele dia, mas eram muitas e podia ser qualquer um. Qualquer um por quem ele passou na rua, com quem se encontrou na aula de balé ou no rinque de patinação. Eram muitas pessoas, algumas que ele nem notara, então ele não poderia saber dessa forma.
Ele esperou, talvez que a pessoa fosse falar com ele. Talvez estivesse envergonhada e por isso não foi atrás dele na hora. Depois de uma semana, ele desistiu dessa ideia.
Então pensou que, talvez, essa pessoa fosse aparecer novamente. Que, se o destino os uniu uma vez, isso poderia acontecer de novo. Depois de alguns anos, essa também foi descartada.
Então ele imaginou que, talvez, o destino tivesse cometido um erro com ele. Talvez a pessoa que estivesse destinada a ser sua alma gêmea não era a pessoa certa e, tentando concertar isso, o destino fez com que ele não visse o momento em que seu relógio chegou a zero e, assim, ele não estaria mais ligado a ninguém. Talvez ele pudesse ser feliz sem precisar de outra pessoa. Ele levou essa ideia por mais alguns anos.
Conforme crescia, ele apenas parou de acreditar no destino, como você para de acreditar em papai noel, fada do dente e coelhinho da páscoa. Isso é uma história feita para crianças acreditarem em magia e felicidade. A vida não era feita assim.
Depois disso tudo, ele finalmente se viu livre. Depois do que Yuuri falou, mais ainda. Ele poderia gostar de quem quisesse, sem se preocupar se essa pessoa seria sua alma gêmea ou não, sem se preocupar se eles estavam destinados a serem felizes juntos ou não. Ele poderia fazer o próprio destino, criar a própria felicidade, ele poderia se arriscar e se esforçar por esse sentimento porque valia a pena. Otabek valia tudo isso.
Então, talvez, o mínimo que pudesse fazer é ser sincero com ele e dizer o que sentia. Yuri conseguia fazer isso, sempre contou tudo a ele, contar isso também deveria ser mais fácil do que guardar para si. Só não sabia como o faria.
Mas, qualquer forma, teria que fazer antes que ele fosse embora. O mais rápido possível.

Questão de Tempo (Yuri on Ice - Otayuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora