Questão de Tempo (Yuri on Ice - Otayuri)

Capítulo 7

O dia que se seguiu àquela ligação foi o mais cansativo para Yuri. Otabek estaria junto em seu treino, então ele fez questão de não cometer nenhum erro na coreografia ou nos saltos. Não sabia por que fazia aquilo, talvez quisesse impressiona-lo, mesmo que ele já o tivesse visto patinando várias vezes. Era um pensamento um tanto infantil, mas ele não podia evitar.
Além disso, quando não estava no treino, tentava pensar em uma forma de dizer a Otabek… aquilo que precisava dizer. Em sua mente parecia muito fácil, mas, sempre que tentava, ele travava. Concluiu que, de fato, Yuuri tinha muita coragem de tê-lo feito, mesmo com toda a sua insegurança. Yuri não ficaria para trás, faria aquilo! Apenas não sabia como.

Naquele dia, ele sonhou com uma lenda que Yuuri o contou uma vez, sobre um fio vermelho.
Ela dizia que quando uma pessoa é destinada a outra, elas têm um laço vermelho que as ligam no dedo mindinho. Aparentemente é sobre almas gêmeas. Ele também disse que existiam algumas pessoas que podiam ver o fio e alterá-lo.
No sonho de Yuri, alguém cortava seu fio e o amarrava ao de Otabek,  os ligando para sempre.
Justo quando pensou que tivesse superado o fato de não serem almas gêmeas…
Quando acordou, no primeiro momento ele estava atônito. Não feliz ou entusiasmado, mas surpreso. E confuso.
Essa confusão seguiu com ele pelo resto do dia.

Suas aulas da manhã eram de balé e ele fez questão de arrastar Otabek junto. No balé ele podia se exibir até mais do que no rinque, mesmo que Otabek estivesse ocupado demais sofrendo e se sentindo humilhado por definitivamente não ser bom naquilo.
Quando notou isso, Yuri percebeu que não serviria para nada obrigá-lo a participar das aulas se elas só o fariam se sentir para baixo, e que era egoísmo da parte dele fazer isso só para que eles pudessem ficar juntos se Otabek nem mesmo aproveitaria esse tempo. Então ele decidiu que não mais o obrigaria a ir para as aulas se ele não quisesse.
Esse pensamento genuinamente generoso o surpreendeu. Ele não queria que Otabek se sentisse mal, mesmo que fosse para ficar perto dele. Estava disposto a sacrificar sua felicidade pela dele.
Por um momento, ele sentiu que, com Otabek, podia ser melhor. Ser uma pessoa melhor, por ele. E ele valia o esforço.

"Você é o único que consegue me obrigar a fazer isso." Otabek disse quando se sentaram em uma lanchonete próxima ao estúdio na hora do almoço. Yuri sorriu ao ouvir aquilo.
"Bem, você disse que veio para ficar comigo, não é? Então precisa participar." respondeu rindo, mas logo voltou a falar sério "Mas, sabe, se não quiser mesmo, você não precisa fazer isso."
"Na verdade, eu realmente não me importo se for pra passar um tempo com você. Você estar junto faz com que não seja tão ruim."
Maldito, por que você fica fazendo meu coração bater desse jeito?
Nesse momento, alguém foi anotar os pedidos deles e Yuri sequer se lembra do que pediu, só conseguia pensar que… talvez… aquela fosse a hora certa de dizer. Só de pensar aquilo já era suficiente para deixá-lo nervoso.
Ele nem percebeu quando seja lá quem for que anotou os pedidos dele saiu, seu coração batia tão forte e era a única coisa que conseguia ouvir.
Ele respirou fundo. Quando ia dizer algo, ouviu alguém chamando seu nome do lado de fora do restaurante.
"Yurioo!"
Victor e Yuuri acenavam para ele através do vidro da janela. Foi constrangedor, principalmente porque eles haviam escolhido uma mesa bem no meio do lugar, longe da janela, então todo o restaurante pode ouvir e ver aquila cena.
Yuri demorou alguns segundos para se lembrar de que os dois deveriam estar no Japão, e um pouco mais de tempo para se lembrar de que já havia passado uma semana desde que eles foram para lá e que ele nem percebeu esse tempo passar.
"Yurio, que saudades!" Victor correu até ele e o abraçou, fazendo com que Yuri começasse a se debater em seus braços resmungando xingamentos e ofensas. Yuuri veio correndo logo atrás dele.
"Olá! Ah, oi Otabek. O que está fazendo na Rússia?" Yuuri pareceu surpreso ao vê-lo ali. Yuri ficou com medo de que ele entendesse o que estava acontecendo, além de estar com raiva por eles terem atrapalhado tudo.
Yuuri notou a expressão em seu rosto e pareceu recuar um pouco.
"Eu vim ficar alguns dias aqui." Otabek respondeu, seu semblante sério como sempre ficava quando falava com outras pessoas.
"Isso é ótimo. Eu e o Yuuri também estavamos viajando..." Victor se empolgou, estava prestes a pegar uma cadeira e se juntar a eles, mas Yuuri o segurou.
"Sim, mas agora nós estávamos indo ao mercado, não é, Victor? É melhor irmos logo…" ele puxou o braço de Victor levemente, olhando para ele.
"Oh, certo. É verdade." ele não pareceu ter entendido, mas concordou. Yuri suspirou. "Bem, nos vemos amanhã!" se despediu e os dois saíram, deixando um Yuri irritado e um Otabek um tanto confuso para trás.
"Idiotas!" Yuri resmungou.
Quando olhou para trás, viu Yuuri e Victor saindo segurando a mão um do outro. De repente, não estava mais com tanta raiva.
Ele os seguiu com os olhos até que estivessem fora e não fosse mais possível vê-los.
Quando se voltou para frente, Otabek o olhava com as sobrancelhas erguidas em interrogação.
"O que foi?"
"Isso foi estranho."
"São o Yuuri e o Victor, eles são estranhos!"

Depois de almoçarem ainda faltava um tempo para que treinos da tarde começassem, então Yuri sugeriu que eles fossem esperar em uma praça que ficava no meio do caminho.
Eles caminhavam lentamente, conversando sobre qualquer bobagem. Yuri se assombrou ao perceber que, inconscientemente, os levou a falar sobre um assunto um tanto… perigoso. Suas mãos começaram a tremer.
"Eu não tinha amigos quando era criança, a única pessoa para quem eu contava as coisas que aconteciam era o meu avô. Depois que me mudei para São Petersburgo, eu deixei de falar com ele todos os dias, então… Eu não tinha mais com que conversar." Segredou, com a voz cada vez mais baixa. "Acho que é por isso que eu conto tudo pra você."
"Você não me conta tudo." Otabek respondeu como se fosse uma constatação óbvia. Yuri olhou para ele surpreso.
"O quê?"
Otabek deu de ombros. "É normal esconder algumas coisas, todos fazem isso."
Yuri parou de andar e se virou para ele, estupefato. "Como assim, você acha que eu escondo coisas de você?"
Otabek olhou para ele com a expressão confusa, como se não entendesse o motivo da surpresa. Tentou encontrar uma forma de explicar o que dizia.
"Se lembra de quando… Ano passado, quando você me contou sobre… Hum…" ele pareceu desconfortável por um momento. "aquele caso todo da sua alma gêmea?"
"Sim."
Otabek retomou a caminhada e Yuri o acompanhou.
"Você fazia questão de dizer e reforçar o tempo todo o quanto não se importava com aquilo, que não significava nada pra você e que você tinha superado, mas só pelo modo como você falava já deixava óbvio o quanto era importante pra você. E essa vez foi a mais notável, mas eu sei que isso aconteceu outras vezes também, sobre você esconder algumas coisas. Como quando você fala o quanto odeia o Victor e o Yuuri ou que eles te irritam muito…"
"Ei!" Yuri protestaria, mas ele sabia que não funcionaria porque Otabek estava certo. O que não significava que ele daria o braço a torcer sobre o assunto. "Talvez… Talvez isso seja verdade, mas foi só dessa vez. Sobre o Victor e o Yuuri, o que eu falo é verdade, eles me irritam mesmo. E eu só falei aquilo nesse dia porque eu não queria admitir para mim mesmo que não ter conhecido minha alma gêmea importava, ok? Mas agora eu superei de verdade!" Bem, ele realmente acreditava que sim, então não estava mentindo, não é?
"Oh, sério? E como você tem tanta certeza de que agora superou mesmo?" Otabek parecia estar sendo sarcástico, embora fosse difícil dizer com precisão.
"Porque…" Yuri se remexeu nervoso. "Porque eu estou até gostando de alguém agora. E nem ligo se… essa… pessoa não é minha alma gêmea. Viu só?"
Otabek aparentemente não esperava por essa resposta. "Por que não me contou isso?"
Opa! Yuri estava tão concentrado em acabar com aquela acusação que acabou apenas por confirmá-la sem perceber. Ele sabia que essa era a única coisa que não contou a Otabek, mas estava tentando contar. Acabou por fazer isso do jeito errado.
Que droga, ele tinha que estragar tudo!
"Porque foi recentemente, então…"*eu não sabia como contar porque essa pessoa é você.* Podia consertar aquilo, era só dizer. Estava na ponta da lingua, mas não saía, ele não conseguia. Por que era tão difícil?
Continuaram caminhando em silêncio e aquilo estava incomodando Yuri, mas ele não sabia o que dizer para amenizar o clima estranho que havia ficado.

"Yuri." Quando Yuri notou que estavam quase chegando em tal praça, Otabek o chamou. Ele sabia que Yuri podia ouvi-lo, mas não disse mais nada até que o respondesse.
"Sim?"
"Durante esse último ano inteiro eu estive tentando te contar, mas eu não sabia como..."
Yuri olhou para ele esperando qe continuasse. Percebeu que as mãos dele estavam tremendo, mas logo que notou isso ele as escondeu nos bolsos da jaqueta que usava.
"Sempre que tentava dizer isso eu acabava mudando de assunto na hora. Eu estava com medo de que você ficasse com raiva e… Não quisesse mais falar comigo."
Otabek estava nervoso, Yuri percebia isso pelo modo como sua voz tremia. Ele queria reconfortá-lo, mesmo que não soubesse muito bem o motivo que o levava a estar assim. Mas ele sabia que a ideia de parar de falar com Otabek, independente do motivo, era absurda demais.
"Não se preocupe, não vou ficar com raiva." Sua voz soou baixa, mas Yuri falava com convicção.
"Como você poderia saber?"
"Porque… Eu sei que não conseguiria mesmo que quisesse, porque eu gosto de você." falou de uma vez. Depois que percebeu o que tinha feito, sentiu vontade de cavar um buraco no chão e se enterrar lá mesmo. Mas agora que finalmente conseguiu dizer o que queria, não voltaria atrás.