Capítulo 5

761 93 27
                                    

"Estar focado em resultados antigos e em cicatrizes, vingar-se e ficar por cima, sempre fazem de você menos do que você é."


-Esse aqui é seu pai?

Ele perguntou surpreso demais ao olhar as fotos que estavam em cima da mesa.

Meu corpo travou e precisei de alguns segundos pra processar aquela pergunta e conseguir respondê-la. Eu não sabia qual era a participação do meu pai na casa dos Albuquerques quando ele ainda era vivo, talvez ele tivesse conhecido o moleque quando ele ainda era pequeno e causasse alguma recordação ainda, e isso poderia colocar tudo a perder, mas já não tinha mais volta. Teria que arriscar:

-É sim, por quê?

-Nada, é que ele se parece muito contigo.

Ele respondeu sorrindo, pegando o retrato e olhando pra ele com curiosidade. Pude respirar mais aliviado depois disso e percebi que não havia motivos para a minha preocupação, as chances de algo parecido acontecer eram mínimas. Agora, eu só precisaria me cuidar para que o pai do garoto não colocasse seus olhos nas fotos, ele com certeza sacaria.

-Adorei seu cafofo... É tudo bem perturbado e louco, assim como você.

-Quem disse que eu sou perturbado?

Perguntei levantando minhas sobrancelhas e cruzando os braços, aquele moleque estava ficando bem abusado nos últimos tempos e depois que ganhou minha confiança.

-Ah, Kim, por favor, né. Isso tá na cara, é só conviver um pouquinho mais com você que qualquer um percebe que algo de muito perturbador se passa aí na sua cabecinha.

-E isso não te incomoda?

Perguntei, observando ele dar de ombros, ir até a minha cama e se deitar despreocupadamente nela. Me olhou por algum tempo e eu sabia que ele estava pensando no que responder, por fim, acabou dizendo:

-Acho que todo mundo tem demônios, claro, os seus devem ser mais aterrorizantes e perturbadores que quaisquer um... Mas...

Ele não continuou, parou a frase no meio e tornou a me olhar com um sorriso enigmático.

-Mas? – Incentivei para que ele falasse.

-Eu não ligo. O dia que você quiser me contar, eu vou estar pronto pra ouvir, mas enquanto isso não acontece... Eu vou esperando.

Disse por fim, me surpreendendo mais uma vez e ainda deixando em aberto que estaria ali pra me ajudar. Ah, se ele soubesse!

-Não tem nada pra comer aqui não?

Ele perguntou completamente à vontade e um tanto quanto folgado, encarei sem acreditar, tentando avaliar se falava sério ou não, mas decidi que não me importava.

-Tem pizza de ontem, ou anteontem, na geladeira.

-Pizza velha? Ual, tudo o que eu sempre sonhei.

Revirei os olhos depois de ouvir o seu tom de deboche e achei melhor não responder com o que tinha em mente, eu ainda precisava manter as aparências por um tempo depois disso. Observei-o, mesmo depois de ironizar, se levantar e ir até a minha geladeira procurar pelas pizzas, não pude deixar de soltar um riso inconformado com aquela cena. Me sentei no lugar que ele ocupava a poucos segundos atrás e pude ficar ali por um tempo, perdido em pensamentos e pensando na vida.

Há alguns meses atrás eu nunca imaginaria que conseguiria levar pra frente aquela ideia que tinha em mente, pois tudo havia começado de uma fase revoltada em que eu estava passando e um sentimento de vingança que vinha crescendo, mas hoje eu estava ali, tinha entrado pela porta da frente da casa dos Albuquerques, o garoto estava comendo em minhas mãos e ninguém havia desconfiado de nada ainda. Tudo havia dado exatamente certo, mesmo depois de duvidar, mas me peguei pensando, e agora? Eu precisava agir, o mais rapidamente possível, pensei. Estava mais que claro que nem de longe aquela vida que eu andava levando era realmente a minha, e obvio, que eu não pretendia estender por muito mais tempo. Eu estava cansado de ter que desempenhar um bom papel e já começava a duvidar da minha capacidade de fingir por muito mais tempo, mas o que eu faria? Pensar nisso sempre acabava me gerando uma enorme dor de cabeça, eu queria ser bombástico, avassalador, queria que o que fosse feito gerasse marcas neles assim como gerou em mim, enfim, eu queria deixar marcas pra eles nunca mais se esquecerem. Eu pensava em algumas possibilidades, mas nenhuma me agradava de verdade, confesso que já havia pensado em sequestrar o garoto e pedir uma grana em troca dele, isso com certeza seria muito bom pra minha vida financeira, mas eu sabia que ainda era pouco, muito pouco para aquela família. Também existia o fato de que eu não ficava muito confortável com a ideia de ter que envolver o garoto mais aquilo, meu assunto era com o pai dele, ele apenas foi uma escala, não queria ter que metê-lo em uma coisa tão ordinária como aquela. Parecia estranho, mas eu havia aprendido a meio que separar as coisas.

Pela Honra do Meu PaiOnde histórias criam vida. Descubra agora