Capítulo Um

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- A mente de um psicopata vai muito além de motivações e finalidades – minha voz ecoou pelo auditório.

O professor Joseph parou seu discurso, e seus olhos passearam rapidamente pelos alunos numa tentativa de achar a pessoa que o interrompera.

Levantei a palma da mão.

- Kaila Poyfair, senhor.

- Muito bem – ele se recostou em sua mesa, ao lado do projetor que estampava na grande lousa uma foto de Charles Manson. Seus olhos me fixaram com atenção. – Você pode dar continuidade ao seu argumento?

- A finalidade de um assassino é matar. Mas quando esse assassino é também um psicopata, matar seria sua única finalidade? Como o senhor esclareceu anteriormente, por exemplo, assassinos em série possuem muitas vezes motivações sexuais. E o prazer sexual pode ser o real motivo do assassinato, e sendo assim matar não seria a única finalidade.

- Por isso utilizamos definições para diferentes tipos de assassinos. Assassinos em massa, assassinos em série, assassinos relâmpago – citou, causalmente. – Se eu perguntasse como definir um assassino em série, todos vocês responderiam que eles precisam ser autores de dois assassinatos, pelo menos. Todos vocês responderiam que eles possuem um modus operandi, e que na maioria das vezes seus crimes possuem motivação sexual. Esse é o básico, certo?

A sala concordou. Olhei para as pessoas ao meu redor, escondidas na escuridão parcial do auditório.

- Essa definição é do FBI – continuei – e ela é cheia de falhas. Por exemplo, se um assassino em série for preso antes de matar a segunda pessoa, ninguém jamais descobrirá o que ele de fato é. Ele pode ser julgado como um assassino comum. Mas se estivesse solto, ele continuaria com os crimes. Continuaria com o modus operandi.

A essa altura, a sala toda estava me olhando. Eu sabia que atrair atenção não era desejável, mas dessa vez não tive como ficar calada. As aulas de Joseph eram em sua maioria fascinantes, e era uma tortura ter que passar despercebida quando eu queria debater e discutir.

- Charles Manson é ou não um assassino em série? – Joseph perguntou à turma.

Foi um aluno que estava há três fileiras abaixo de mim quem respondeu.

- Não era. A mídia usa muito esse termo pra ele, mas o cara não matou nenhuma daquelas pessoas. Era o mandante, mas não matou.

- Como você definiria Manson, Poyfair?

Demorei alguns instantes para perceber que o professor Joseph falava comigo.

- Ele é um psicopata. Manipulava pessoas, se achava invencível e não sentia culpa e nem empatia.

Meia hora depois, atravessando o campus em direção aos alojamentos, o olhar de aprovação do professor ainda me fazia sentir uma espécie de orgulho eufórico.

Eu costumava ir à biblioteca fuçar livros sobre casos criminais e psicopatologias, mas foi só com a turma de Psicologia Forense do professor Joseph que eu finalmente pude entrar na discussão e provar pra mim mesma que tardes inteiras passadas na biblioteca não são tardes perdidas, como Dominik costumava dizer.

Agarrei minha pasta contra o peito e levantei levemente o nariz para sentir o cheiro de terra molhada trazido pelo vento, enquanto a chuva começava a cair. As pessoas atravessavam o jardim lateral, correndo e cobrindo as cabeças.

A comunidade acadêmica da Universidade de Verselton costumava se refugiar do mal tempo nos bares ao redor do campus, e era provavelmente para um deles que a maioria estaria indo naquela tarde de sexta-feira.

Doce Tormento - Os Mascarados Livro IIOnde histórias criam vida. Descubra agora