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"A vaidade e o orgulho são coisas diferentes, embora as palavras sejam frequentemente usadas como sinônimos. Uma pessoa pode ser orgulhosa sem ser vaidosa. O orgulho relaciona-se mais com a opinião que temos de nós mesmos, e a vaidade, com o que desejaríamos que os outros pensassem de nós."

Jane Austen em Orgulho e preconceito

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Seria triste se não fosse cômico, toda vez escutar a mesma pergunta.

- Seus pais são fãs de Jane Austen? Você tem apenas vinte e dois anos, é o único motivo para...
- Para ter nome de gente velha? - Cortei o garoto gay, abusado e arrogante que havia em minha sala. Eu não gostava dele e podia sentir de longe a energia pesada que ele tinha, mas pelo bem do bom convívio, eu o suportava e fingia que aquilo não me abalava - Não. Elizabeth era o nome da minha avó e eu tenho muito orgulho de ter o mesmo nome que ela.

Minha avó havia se fodido muito na vida e eu parecia não ter só ganho o nome como o gênio da mulher. Ela havia criado meu pai e meus tios batendo de porta em porta, trocando faxina por um lugar para dormir e algo para eles comerem. Assim que meu avô, um italiano que gostava de uma boa cachaça morreu atropelado indo para o trabalho, minha avó perdeu tudo o que tinha sendo expulsa da casa alugada por eles logo em seguida.
A mulher havia sido um exemplo e a saudade que ela havia deixado ainda era um rombo enorme no meu coração. Talvez, se não fosse por sua morte eu não estaria aqui, sentada na cadeira da faculdade estudando para ser uma escritora decente e fazer meu inglês melhorar para poder tentar o intercâmbio. Mesmo com três meses de faculdade atrasado, eu precisava dar um jeito na minha vida que vinha sendo uma montanha de emoções desde que meu pai ficou doente e eu parei de trabalhar. Todos os meus sonhos pareciam estar indo pelo ralo. O intercâmbio, o namoro, até mesmo minha imaginação extremamente fértil andava me deixando na mão e eu ainda estava ali, sentada para fazer uma prova substitutiva em uma matéria que eu havia ido mal. Eu rezei para não pegar uma bela pendência naquela merda.

- Ignora - Recebi batidinhas no ombro de Isabella, minha parceira nos últimos quatro meses. Tínhamos uma conexão bizarra junto daquela sensação de "já te vi em algum lugar", procuramos em tudo quanto é canto, mas a única coisa em comum era que tínhamos casas de praia no mesmo litoral. De qualquer jeito, ela havia armado a loucura daquela noite e era o motivo da minha mochila estar tão pesada graças aos saltos que eu ainda insistia em usar, mesmo sabendo que os pés iriam estar massacrados de manhã - Espero que seja a primeira balada hétero que preste, juro! Pelo menos dizem que eles recebem muitos estrangeiros, vai que eu encontro uma polonesa ou uma americana querendo experimentar algo novo? - Isa piscou para mim e me fez rir - Boa prova! - Ela me desejou antes de eu perceber que a professora baixinha estava dentro da sala de aula.

- Eu escrevi uma bíblia inteira nos últimos 70 minutos, minha mão ta doendo pra caralho! - reclamei. Eu era um pouco boca suja, confesso, mas palavrão era advérbio de intensidade na minha concepção.

- Exagerada - Isa cantou para mim, sorrindo com seus 1,70m bronzeados, pernas longas e corpo magro. Os cabelos cacheados dela iam até pouco abaixo dos ombros e seus olhos eram enormes e quase pretos, eu invejava isso nela, meus olhos eram pequenos demais na minha cara de bolacha - Vamos logo para casa das minhas amigas, vamos nos trocar lá e esquecer essa merda de faculdade até semana que vem - Ela me puxou pelas rampas da PUC como se a vida dependesse daquilo e sendo bem sincera? Eu adoraria que aquela noite trouxesse junto dela minha libertação.

O apartamento das amigas de Isa não ficava longe, era uma república feminina onde eu conhecia de vista uma ou duas meninas, mas nenhuma era realmente minha amiga. Em sua grande maioria, eram meninas do interior com pais multimilionários e mimadas ao ponto que eu não conseguia conversar meia hora com qualquer uma delas sem revirar os olhos ou falar algo que faria elas olharem torto para Isabella por ter me convidado.

INDOMÁVEL - SÉRIE DARK HAND - VOL I [RETIRADA DIA 06/04/2020]Onde histórias criam vida. Descubra agora