Capítulo 3

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O velho relógio marcava dez da manhã. Com a cabeça doendo – acreditou que pela procedência do Uísque da noite anterior – e com um gosto amargo na boca, levantou-se vagarosamente e se dirigiu ao banheiro para nova ducha.

Estava com fome e com uma péssima aparência. Todo o corpo estava dolorido pelo ritmo frenético da pedalada da tarde anterior. Se deu conta de que não comia nada desde o lanche que ingerira quando parou para descansar na altitude. O estômago roncava, a cabeça doía. Pegou um pacote de salgadinhos que havia comprado quando chegara a Purmamarca e esvaziou-o rapidamente. Aproveitou para pegar um comprimido para curar a ressaca. Olhou para a mesinha que o hotel disponibilizava em cada quarto para os hóspedes. Lá estava o vaso, intacto, do mesmo modo que o deixara na noite anterior.

Em uma hora e meia teria que pegar o ônibus de volta a Jujuy, e só agora havia se dado conta do caos que tomara conta do quarto. Na pressa para descobrir o que havia no pacote, havia largado a mochila de qualquer jeito no chão, espalhando seu conteúdo. Sacos de biscoito jaziam vazios no chão, garrafas plásticas de água e isotônicos rolavam aos seus pés. O capacete de ciclismo estava sobre a cama. A piqueta repousava sob o travesseiro. Roupas em profusão por todo o quarto, a mala vazia. Este era um dos motivos pelo qual a Bianca não fazia estas viagens com ele. Para ela, Gregório era mais destruidor que um Diabo da Tasmânia enfurecido.

Pegou sem muito cuidado todas as roupas espalhadas e literalmente enfiou-as na mala. Enrolou o vaso novamente no plástico-bolha, recolocando-o na caixa e raspando a pequena mancha de sangue com a faca do canivete. Encaixou com cuidado na mala, junto com alguns produtos que eram proibidos como bagagem de mão. Colocou também a piqueta, o canivete e alguns souvenires.

Terminou colocando uma muda de roupa na mochila que levaria como bagagem de mão. Acondicionando alguns livros, lembrou-se de separar o passaporte. Fez uma vistoria no quarto assegurando-se de não esquecer nada. Fazendo o check-out na recepção do hotel, partiu.

Se tudo corresse bem, às vinte horas e dez minutos estaria aterrissando no Aeroporto Internacional de Guarulhos, no Brasil.

**

O avião pousou sem problemas. Não houve dificuldades em despachar a bagagem e não teve problemas com a bagagem de mão. Foi recebido por um educado "seja bem-vindo de volta ao Brasil" pela agente da Polícia Federal que o atendeu.

Como previsto, a mala estava na esteira correta. Não havia sinais de violação. O objeto misterioso estava intacto dentro da sua bagagem.

Aguardando na saída internacional, vestindo uma saia preta que a deixava muito bonita, estava Bianca. Sempre organizada, portava uma bolsa a tiracolo onde mantinha documentos, dinheiro reserva, cartões, agenda e tudo o mais que uma mulher precisa para se manter durante o dia.

Sorrindo, se beijaram e ficaram abraçados durante um tempo. Como não era feriado ou período de férias o aeroporto estava relativamente vazio, o que permitiu que chegassem rapidamente ao estacionamento. Fazia frio na cidade de São Paulo, e a garoa insistente que fazia a fama da cidade teimava em cair incomodando ao escorrer insistentemente pela testa de Gregório.

A velha caminhonete estava no estacionamento. Ele sabia que Bianca não traria o carro dela, pois ela tratava o carro com mais carinho do que a ele. Jamais deixaria que Gregório colocasse as mochilas sujas de viagem no carro recém-tirado da concessionária. Mas não se importava. A caminhonete era uma parceira de viagem tão importante quanto sua barraca, e conhecia a história de cada amassado, cada arranhão e cada sujeirinha não lavada da lataria.

Jogando a bagagem na carroceria, cobriu-a com a lona. Passou a mão pela lataria. Foi como sentir o toque de uma velha amiga. Com um ruído, abriu a porta do motorista, pegou a chave com Bianca e deu partida, ouvindo o ronco do velho motor possante sob o capô. Engatando a primeira marcha, sentiu o movimento dócil da velha parceira rodando macia sobre o asfalto. Pegaram a pista rumo à Rodovia Presidente Dutra, para dali seguirem rumo ao bairro de Higienópolis, reduto boêmio da cidade e lugar onde ele e Bianca moravam juntos há três meses.

O Templo da Magia (Reinos em Guerra - Livro 1)Where stories live. Discover now