Enterro

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A pequena garotinha chorava encostada na árvore com as mãos nos joelhos, ela havia caído da bicicleta e estava com um ralado feio, ela se sentia sozinha, triste.
-Tudo bem. - Mas aquela voz a acalmou, e quando ela viu a tia vindo uma parte de sua dor foi tirada. -Eu trouxe curativos, material cirúrgicos e o Rey buscou nosso jatinho para te levar para o hospital. - A mulher colocou os curativos ao lado da pequenina.
A loirinha levantou os olhinhos azuis com lágrimas os molhando para a pessoa que a amava.
-Você está debochando de mim. - A voz saiu tão triste que a loira não pode evitar olhar para a sobrinha.
Pegou o algodão enquanto sorria de canto para a pequenina, ela tinha feito questão de ir fazer o curativo ela mesma, não queria que Amanda cuidasse da pequena.
-Ah meu amor, eu estou debochando de mim, porque não tem pior do que ver a pequenina andando de bicicleta sem rodinha a primeira vez. - Faz uma pausa enquanto limpava o pequeno bracinho. - E ver ela se machucar. - Colocou o algodão de lado e puxou o esparadrapo.
O pai da pequena loirinha tinha sofrido um acidente e havia falecido há cerca de duas horas, mas a tia não sabia como contar.
Quem cuidava dela era sua tia, Âmbar sabia que ela era ocupada, mas mesmo assim a ocupada empresária fez questão de ajudar a pequenina.
-Ta bem, pronto. - Disse finalizando o curativo, a pequenina olhou o braço e voltou seus olhinhos avermelhados para a tia que tanto amava.
-Tia, eu vou morrer? - A senhora a frente fez uma falsa cara de preocupação.
-Eu diria que as chances de sobreviver são de cem por cento. - A garotinha observava a tia arrumando o kit de primeiros socorros.
-E você vai morrer? - Os olhos azuis encontram os avermelhados da sobrinha e ela lhe lança um sorriso triste, sabia que a pequena loirinha perguntava isso por conta da mãe.
-Escuta... - Ela pegou as pequenas mãozinhas e olhou nos pequenos olhinhos idênticos aos seus e aos da mãe, que ela nem mesmo se lembrava. - Todo mundo vai morrer um dia, mas vou viver por muito, muito tempo.- A pequenina pensou por um segundo.
-E se você morrer e eu continuar aqui? - Aquilo doía em Âmbar, saber que um dia ficaria completamente sozinha.
-Você já vai estar crescida... - Sharon acariciou o rosto da pequenina. -...e não vai mais precisar de mim. - Sorriu de canto.
-Eu sempre vou precisar de você. - Os olhos da mais velha marejaram, ela não queria contar sobre a morte do pai dela, não queria vê-la sofrer, mas sabia que precisava contar.
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Âmbar:
  Meus olhos se abriram e me deparei com o teto branco do meu quarto. Era hoje. Lembra disso fez com que lágrimas ameaçassem cair, mas não deixei, me senti na cama e vi Luna ainda dormindo no colchão ao lado de minha cama.
  A morena se recusou a me deixar sozinha ontem à noite, então acabou dormindo no meu quarto. Eu por outro lado não havia conseguido dormir nada, e o pouco que dormi, sonhei com minha tia.
  Me levantei e sai do quarto, a casa estava em um completo silêncio, todos os empregados tinham sido dispensados, menos os Valente's, Amanda e Rey, descia as escadas e adentrei a cozinha.
  O local estava quieto e escuro, como minha mente, peguei um copo e o enchi com água, me sentando logo em seguida em uma cadeira em frente ao balcão.
   Não me importava de estar sentada na cozinha escura de pijama, ninguém iria falar nada, todos estavam com pena demais da garota que acabou de perder sua única família.
    Eu não queria que ninguém tivesse pena de mim, queria que todos me vissem como alguém forte, queria...queria que ela não tivesse me deixado, queria que minha tia ainda estive aqui, mesmo que com seus sermões e suas exigências.
-Senhorita Âmbar. - A voz de Mônica fez com que eu me virasse limpando as lágrimas que escorreram.
-Eu só... - Olhei para ela que sorriu.  Já estava de saída. - Me levantei para sair da cozinha, mas seu braço me impediu.
-Eu só queria dizer que sinto muito. - Todos diziam isso, ontem principalmente, todos que estavam comigo no hospital disseram que sentiam muito, todos menos Simon que ficou ao meu lado o tempo todo. - Nem posso imaginar a dor que está sentindo. - Ninguém podia, ninguém sabia o quanto aquilo tinha me destruído.
-Obrigado. - Ela sorri e eu solto um sorriso apenas por educação.
  Começo a sair da cozinha, mas paro quando a porta dos fundos é aberta, me viro e lá estava ele, o moreno me olhou e eu não consegui, não consegui não chorar.
  Ele correu até mim e me abraçou, não me importava se Mônica ainda estava na cozinha, eu precisava daquele abraço, eu precisava me sentir segura.
  Os braços dele me envolveram e eu passei os meus por suas costas adentrando seu macio cabelo, ele me apertou contra seu corpo e eu pude chorar, sem que ninguém visse o quanto eu estava destruída, o quanto eu estava triste, o quanto eu estava infeliz, sabia que podia contar com Simon, ele sabia a dor que eu estava sentindo, sabia que eu não iria aguentar sozinha.
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-Está pronta? - Luna pergunta adentrando meu quarto.
   Estava sentada na cama com as pernas cruzadas, olhando para o espelho que ficava em frente a minha cama e lá estava o meu reflexo, o reflexo de alguém que chorou tanto que somente depois de horas os olhos estavam voltando ao normal.
-Âmbar. - A morena se sentou ao meu lado e depositou a mão em meu ombro, fazendo com que eu me virasse e encontrasse os olhos caridosos de Luna.
-Vamos. - Digo e a morena me olha com um sorriso triste nos lábios.
  Me levanto da cama e dou uma última olhada no espelho, eu estava com uma cara péssima, meus olhos ainda estavam avermelhados, meu cabelo estava solto, usava um vestido preto com bordados dourados, lembro que minha tia havia comprado ele, eu havia adorado.
   Dou um último sorriso ao lembrar dela sorrindo e saio do quarto acompanhada de Luna.
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  A limusine parou em frente ao cemitério, e lá estava o caixão de minha tia, em cima do "palco", com uma foto antiga sua, ela estava mais nova e sorria alegremente, em cada lado do caixão havia um gigantesco buque de rosas brancas, as favoritas dela.
  Haviam bem mais pessoas do que eu esperava, vários amigos de minha tia, os empregados da casa e de outras mansões em que minha tia comprou, e diversos jornalistas, querendo ou não minha família era de certa forma "famosa", éramos os Benson's, a maior família de empresários de Buenos Aires, além disso minha tia havia ficado muito conhecida por ter alavancado os negócios da família, após a morte de seu irmão mais velho, meu pai.
  Luna colocou sua mão sobre a minha e desviei meu olhar da janela para olhá-la.
-Vou sair. Quando estiver pronta. - Comenta e abre a porta da limusine.
   Os fotógrafos se amontoam ao redor dela, e assim que veem que ela não sou eu, se afastam deixando Luna livre para ir em direção à Matteo, Delfi e Nina que encaravam a limusine.
   Respirei fundo, sabia que quando saísse teria total atenção sobre mim, jornalistas e fotógrafos se amontoariam em cima de mim e ficariam fotografando e filmando minha reação durante o enterro, mas sabia também que não poderia ficar para sempre dentro do carro.
-Senhorita? - Rey disse e os olhos marrons me olharam pelo retrovisor.
-Lá vamos nós Rey. - Digo e ele sai do carro, antes que o moreno pudesse abrir a porta coloco meu óculos preto, não queria que me fotografassem chorando.
  A porta foi aberta e flash's me cercaram, microfones e várias pessoas falando estavam ao meu redor, e lá estava eu de volta ao meu pior aniversário de 7 anos, quando meu pai morreu.
  Foi exatamente igual, várias pessoas me cercaram e eu estava em prantos, mas ela, ela estava lá para mim, minha tia expulsou todos os repórteres do enterro e eu pude chorar a perda de meu pai em paz, mas agora ela não estava mais ali e eu não sabia o que fazer.
-Com licença. - Rey abre caminho até mim e para ao meu lado. - Deem espaço. - Empurra os jornalistas e fotógrafos passando por ele e adentrando o cemitério.
-Obrigado. - Digo e minha voz sai mais fraco do que eu esperava, na verdade sai como um sussurro.
-A senhorita quer ver sua madrinha? - Pergunta e eu assenti com a cabeça.
   Ele saiu do meu lado e eu caminhei em direção ao caixão, assim que me aproximei, lá estava ela, bem vestida e com a mesma expressão de séria, mas ela não tinha os vibrantes olhos azuis abertos, eles estavam fechados e seu peito não levantava, ela estava realmente morta.
-Âmbar. - Me virei me deparando com Delfi, Matteo e Luna.
   Matteo sem meu consentimento me puxou para um abraço, eu não o retribui, quando os braços do moreno passaram por mim cintura, ele se separou e foi a vez de Delfi e depois Luna e a mesma coisa, eu até queria abraça-las de volta, mas não conseguia.
-Vamos. - Delfi segurou minha mão e praticamente me puxou do "palco" quando o padre subiu e parou atrás do caixão o fechando.
  Me senti na primeira fileira no meio de Delfi e Luna, eu não queria, mas olhei para trás no meio do discurso do padre, eu tinha que saber se ele viria.
  Simon tinha me dito hoje mais cedo, que provavelmente não iria no enterro, mas uma tola esperança ainda estava viva em mim, queria que ele aparecesse e me tirasse de lá, do meio daqueles repórteres, fotógrafos e olhares de pena, que me destruíam toda vez que eram direcionados para mim.
  Mas isso não aconteceu, ele não veio e quando todos bateram palmas, meu olhar voltou pra frente, apenas para ver o caixão de minha tia sendo sepultado, ela tinha ido e eu não tinha ninguém.
-Âmbar. - A voz fez com que eu virasse instantaneamente.
Sebastian correu até mim, ele tinha conseguido vir, e me abraçou, me puxando para perto, tentando fazer com que eu me sentisse segura, mas não adiantou, não consegui retribuir, não conseguir nem ao menos lhe lançar um sorriso, quando ele se separou de mim e sorriu solidário.
-Jazmim não veio? - Franzi o cenho, o que ele queria com Jazmim?
-Não, ela disse que iria passar no Roller e tentar trazer Simon. - Ele me encarou quando disse o nome de Simon.
-Então isso significa que se ela estiver aqui o guitarrista também está? - Ele olhou pelo meus ombros e me virei.
   Simon e Jazmim entravam no limite do cemitério, a ruiva mexia a boca ao lado do moreno que me olhava, ele sorriu e lágrimas se formaram em meus olhos, não pude esperar que ele viesse até mim, corri até ele enquanto o moreno abria os braços.
   Os fortes braços me envolveram e eu o abracei o puxando para mais perto, e ele veio, me envolvendo e me protegendo contra todos os flash's das câmeras e contra toda a dor que me corrompia, eu estava segura, com ele eu estava segura.

You € Me - Concluído [SOU LUNA]Onde histórias criam vida. Descubra agora