O homem era alto, ele ainda estava acima de mim, eu só podia ver sua silhueta escura contra o clarão atrás dele. Eu estava deitada, o encarando, ele fazia o mesmo pra mim.
- Não vai levantar? - Ele perguntou estendendo as mãos para eu pegá-las. Eu as segurei, ele me puxou e eu fiquei sentada. Estava fraca demais, não conseguia ficar sentada, e aos poucos minha visão foi perdendo o foco e ficando tudo escuro. O rapaz pareceu ter visto e entendido meu estado e colocou um braço e minhas costas e outro nas minhas pernas e me levantou, tudo girou em minha cabeça, me agarrei mais forte no homem, em que eu não sabia quem era, ainda não tinha visto nem seu rosto. - Vem cá, vai passar logo, eu não vou te soltar... - tentou me acalmar.
Eu senti ele me acolher mais em seus braços, no fundo eu sentia medo, eu mal o conhecia, mas eu precisava de ajuda, e ele era o único que estava aqui, e ele também me tirou de... onde quer que eu estivesse a alguns segundos atrás. Ele pôs no chão e eu pude sentir a grama fria tocando minhas pernas, nós dois estávamos sentados no chão agora, eu ainda em seus braços. Decidi abrir os olhos, e pela primeira vez em muito tempo, eu pude enxergar de novo.Olhei em volta, névoa se espalhava no chão, e tinha cruzes brancas e desgastadas no chão, velhas. Ao meu lado tinha um buraco no chão, com um caixão no fundo da terra. Me aproximei, engatinhando com os braços e as pernas trêmulas, olhei para o fundo onde o caixão marrom se encontrava, por dentro coberto por almofadas e pano branco, e a marca de um corpo que havia deitado ali recentemente estava.
Meu corpo tremia mais que antes, eu olhava horrorizada para a cova. Eu... estava morta? Lembrei do homem que estava do meu lado agora apouco, ele ainda estava sentado no chão, olhando para mim, eu o encarei apavorada querendo uma explicação, eu não conseguia dizer nada.
- Você deve estar confusa, todos ficam no cabeço, alguns não sabem nem o próprio nome, você sabe o seu né? - perguntou levantando uma sobrancelha, e depois deu de ombros - Vou me apresentar, meu nome é Rafael, tenho, quer dizer - ele interrompeu a fala - tinha, 19 anos quando morri de câncer.Meu olhar estava em seu rosto, minha boca aberta, não conseguia dizer nada. A pele de Rafael era tão branca como a névoa, seus lhos eram negros penetrantes, escuros como a noite, assim como seus cabelos, que era grande e algumas mechas caia em seu rosto, não tinha a aparência muito velha. Tentei falar alguma coisa mas nada saiu, eu estava paralisada olhando para ele, tudo perdeu o sentido para mim, eu queria fazer milhões de perguntas, mas minha boca não se movia.
- Não precisa ter medo, se serve de conforto todo mundo passa por isso, eu já passei também - ele abriu um sorriso de lado - as perguntas que não saem, o pânico,mas tudo vai ficar melhor logo.- Eu... - minha voz saiu falhada - co-como? Mas eu estava viva, ouvi meu coração bater lá... lá dentro - virei a cabeça para mostrar, voltando rápido fechando os olhos e abaixando o rosto.
- Eu também escutei, todos os mortos escutam, acreditamos que é o som de nossas últimas batidas cardíacas de quando estávamos vivos, Coloque a mão em seu peito - ele pediu, eu hesitei, estava com medo, não queria fazer isso, mas fiz, com o braço tremendo coloquei a mão no meu peito.
Não senti nada, nem uma leve e fraca batida. É isso, eu estou morta. Olhei em volta, era um cemitério, as cruzes no chão fazia sentido agora, o clima nublado, a névoa cinza, olhei pro meu caixão tentando lembrar da vida que tive, minha mãe, aquela visão que eu tive era minha mãe de verdade. Encarei meu vestido, ele agora não estava tão branco e limpo quanto o da visão, mas era o mesmo. Levantei meu olhar para Rafael, ele ainda olhava para mim.
- Como é seu nome? - ele perguntou.- Amy. - isso eu sabia, na visão minha mãe tinha me chamado assim.
- Seu nome é lindo, assim como você - ele sorriu, um sorriso delicado e carinhoso, mas eu não retribuí, não conseguia mais fazer isso - Amy, - ele prosseguiu - eu entendo como você está, quer tal eu te levar para andar um pouco?
- O que tem pra ver de tão interessante em um cemitério? - debochei, eu só via morte ali, literalmente.
- Acredite ou não, existe mais que você pode ver - ele se levantou e estendeu a mão para eu segurá-la e levantar. Depois de pensar se isso seria bom, segurei e deixei ele me levantar, eu precisava de uma explicação para tudo aquilo, minha mente precisava clarear mais, e eu sentia que Rafael era confiável. Ainda fraca e cansada, fiquei de pé, e olhando para minha cova eu saí com Rafael do meu lado me segurando com seu braço em minhas costas, e caminhando para dentro do cemitério nebuloso e assustador.
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O Grito dos Corvos
Science Fiction"- Eu também escutei, todos os mortos escutam, acreditamos que é o som de nossas últimas batidas cardíacas de quando estávamos vivos."