31. Vamos para Pasárgada

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"Vamos fugir para Pasárgada. Tenho alguns contatos por lá". Disse Luz enquanto reunia poucos pertences numa mochila.

"Como iremos para lá? Fica lá na ponta de baixo desse país de merda."

"Pare de reclamar, Milton. Se te motiva, saibas que lá a erva é liberada."

"Não é hora de gracinhas, Paixão."

Os dois saíram do prédio com a adrenalina levada ao máximo. Entraram no elevador espiando para todos os lados, como se a qualquer momento agentes da Grande Quadrilha Nacional os interpelasse.

"Vamos até a rodoviária. De lá pegamos um ônibus até o sul, e de lá entramos em Pasárgada. Pediremos asilo quando chegarmos lá. Depois pensamos no que fazer." Disse ela tentando aparentar tranquilidade. "Merda, agora que derrubaram o avião do João deram um fim também nas provas. Filhos da Puta".

Por alguns segundo Milton Schmidt manteve silêncio, contudo, sabe-se lá porquê diabos, não conseguiu ficar de boca fechada.

"Não... não é bem assim.. tenho..."

"Filho de uma boa puta esperta" festejou Luz dando-lhe um abraço apertado e um molhado beijo. "Você guardou um bécape."

Tlink.

O elevador abriu-se para a duas figuras de ânimos renovados.

"Vamos pegar então suas cópias, levamos juntos. Quando chegarmos à Terra da Erva, divulgamos então."

"Paixão, não sei se é uma boa ideia, quem sabe se eles..."

Mas Milton Schmidt não teve tempo de expor suas preocupações. Foi interrompido por sons histriônicos vindos do alto-falante.

"PARADOS. VOCÊS ESTÃO CERCADOS. PARADOS, OU VAMOS ATIRAR."

"Corra Milton, corra." Foi a única coisa que Luz Aguiar foi capaz de dizer. Eles estavam na escadaria do edifício de onde puderam observar pelo menos quatro viaturas policiais embicadas para a portaria. Homens fardados vinham em suas direções. Ao fundo, no início da quadra, ela ainda avistou três carros negros a Polícia Nacional. Sabia que ali os federais cumpriam jornada dupla, para o governo e para a quadrilha.

Os dois começaram então a correr. Sem razão mais aparente do que a de ir na direção contrária dos federais, quebraram à esquerda. Sem olhar para trás, correram.

Se Milton Schmidt fosse um sujeito afeito a epifanias teria tirado pedaços de segundos para refletir que nos últimos dias, fugas e tiroteios tinham passado a ser uma constante em sua vida. Talvez, se fosse esperto o suficiente, faria alguma analogia com aqueles filmes com o Matt Damon que ele gostava tanto de ver. Mas ele não fez isso porque só pensava em correr. E em não perder a silhueta vultuosa de Luz à sua frente direcionando a fuga.

Atrás deles uma cacofonia bélica surgia ensurdecedora. Sons de pistolas, sirenes, submetralhadoras aninhavam-se aos demais sons da cidade. Os vidros quebrados das vidraças atingidas pelas centenas de tiros era quase música, e os pequenos cacos passariam por chuva, não fosse o incômodo de quando vez ou outra ao tocar a pele de Milton, rasgasse-a vertendo pequenos filetes de sangue.

Onde foi parar o atire apenas em revide. Pensou Luz enquanto corria e buscava oxigenar o cérebro para que este lhe ajudasse a receber o problema atual.

Parápapá. Parápapá.

Pow. Pow.

Tey. Tey.Tey. Tey.

Crash. Clink. Clink. Crash.

Pá. Pápapapapapapapápá.

Uóóó. Uó. Uóó.

"Ei, estão malucos."

"Pega os vagabundos."

Luz, que diferentemente de Milton conseguia organizar melhor os pensamentos encontrara tempo para preocupar-se com uma nação em que seus indivíduos presumem a culpa imediata de fugitivos do estado simpatizando de imediato com os de farda. Agora, não bastasse a caça dos "homens da lei", alguns aventureiros tentavam bancar o herói. Um cara gordo e de cabeça raspada inclusive saltou sobre ela e não fosse seu biotipo ágil, ele a teria pego.

"Merda. Merda. Corre Milton. Eles estão quase nos pegando." Gritou para o companheiro que já estava há uns dez metros atrás dela. Se não fizesse algo, seriam pegos em instantes. Ela então, ao invés de quebrar para a rua seguinte, jogou-se para o asfalto.

Pow! Buf!

O motoqueiro caiu pesadamente no chão com o golpe de mochila.

"Desculpe moço, mas em nome da nação eu preciso de sua moto." Disse para o sujeito atordoado no chão que acreditava estar sofrendo o terceiro assalto de sua vida. "Eu sempre quis dizer isto" disse sorrindo. "Vamos logo, Milton". Gritou mais uma vez.

Ele saltou sobre a moto. Ofegava quase a ponto da exaustão.

"Acelera a Hornet." Disse para luz quando ela já fazia cantar o pneu contra o asfalto.

Desse momento em diante, como se fosse um piolho grudado ao couro cabeludo, Milton agarrou-se à Luz entregando-se ao enjoo provocado pelos movimentos alucinantes da moto. Tonto, a paisagem urbana tornou-se para ele nada mais que borrões multicoloridos enquanto ela guiava a motocicleta em diferentes direções, costurando veículos em engarrafamentos enquanto os sons oficiais das sirenes ora se aproximavam demais, ora se distanciavam a quase dar-lhes esperança de que escapariam. Volta e meia um zip zunia-lhes por sobre a cabeça indicando que a polícia ainda atirava contra eles. Não estivesse quase desmaiado, Milton até teria visto quando depois de um zip veio um rash rasgando o tecido da camiseta de Luz e deixando um rasto de media profundidade na pele.

Anestesiada pela adrenalina ela sequer sentiu o tiro que acertou-lhe de raspão no braço.

Naquele instante ela só queria encontrar uma forma de escapar. Fugir. Contudo, pelo retrovisor via que cada vez mais somavam-se carros e motos à perseguição. Sentiu-se por instantes, protagonista de um blockbuster americano. Contudo aquilo era real, a gasolina não iria durar por muito mais tempo e os helicópteros que agora ouvia a sobrevoá-los, deixava as coisas ainda bem mais complicadas.

Além disso, não sabiam, mas já estavam nos trending topics mundiais.

Yellow BananasWhere stories live. Discover now