35. Zumbis da Cracolândia

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A explosão deu um suspiro à fuga. O jeans de Luz ralara todo ao tocar a mureta, mas com muita habilidade ela escapara de ser prensada pelo caminhão. Os instantes que sucederam o monstruoso acidente foram vitais para ela e Milton Schmidt. Do contrário dos filmes onde há sempre um sacana que não larga a perseguição, ali, todo mundo ou passou a tentar escapar da confusão, ou então, como no caso dos helicópteros da polícia e das televisões, buscaram registrar o fato, esquecendo por instante dos fugitivos.

Foi o suficiente para Luz retomar a pilotagem, entrar numa rua aqui, outra ali, até chegar à área central da cidade. Sua mente atrevida já tinha bolado um plano emergencial.

***

O Local era conhecido como cracolândia. Ali, gente vinda de tudo que é lugar vivia em condições sub-humanas. Quem os via das janelas de carros e edifícios, não raro chamavam-nos de zumbis, com seus caminhares errantes, sua sede não por cérebros, mas sim pelas pedras vendidas a Cinco Reais pelos feirantes locais. Ali, era quase sempre a mesa coisa, o dia para arrumar dinheiro para o máximo de pedras possíveis, e a noite ao relento sob o aquecer do fogo das pedras de crack.

O ar era pestilento, fedia a urina, fezes e a sujeira das roupas úmidas e rasgadas que vestiam figuras decrépitas, pele manchada, dentes caídos, olhares mortos esperando apenas a cova. No meio deste público é que Luz e Milton estavam agora escondidos. Como numa cena de The Walking Dead, gastaram uma ninharia pelas roupas, mas algo que renderia uma fortuna em pedra ao casal sortudo que lhes vendera os trapos, disfarçaram-se de zumbis. Sob um viaduto trocaram de roupa, e em duas mochilas velhas achadas no lixo colocaram poucos documentos e um jogo de roupas limpas para quando pudessem abandonar os disfarces. Passaram ainda terra e fuligem no rosto, e então perambulavam em meio ao grupo.

Apesar do disfarce, não quer dizer que os dois estranhos não fossem ali percebidos também. Como na série, se aqueles zumbis descobrissem que eles não eram mortos-vivos, o caldo poderia engrossar. Além disso, mesmo que fosse pouco para eles, o dinheiro que carregavam podia ser-lhes sentença de morte naquele lugar. Além disso, temiam que logo que o casal se recuperasse do chapaço, os dois ainda corriam o risco de serem apontados como os magnatas da cracolândia.

Milton e Luz tinham o tempo contado.

"O que faremos agora?" perguntou ele um pouco mais recomposto da fuga, mas ainda fedendo a vômito. O que para o disfarce até era bom.

"Amanhã de manhã vamos à rodoviária, pegamos tua cópia, e fugimos."

"De ônibus?"

"Não, seu besta. A essa hora devem nos procurar por tudo que é lugar, e certamente nos ônibus e nos aviões já deve ter uma foto nossa estampada."

"Merda. Merda. Merda. Você quer dizer então que não tem como fugirmos."

"Caralho, claro que tem, seu tonto. Mas precisamos de um tempo. Agora está arriscado demais. Porém, nesse país ninguém dá bola pra mendigo. Vamos pegar tuas provas, dar no pé de São Pedro como andarilhos loucos."

Luz porém foi interrompida pela patrulha que passava lentamente pelo grupo. Por algum momento chegou a temer que estivessem atrás deles, contudo quando a viatura parou e dois brutamontes desceram carregando um pivetinho para o muro, ela compreendeu que aquilo fazia parte da diversão rotineira por ali.

"Vamos pegar uma dessas rodovias e descer caminhando para o sul. Depois vemos o que dá pra fazer." Disse ela, olhando com indignação o cassetete que subia e descia à costela do garoto.

***

Tinha amanhecido quando os dois mendigos insones chegaram à rodoviária. O movimento era intenso como sempre, mas naquele dia havia outra coisa. Estava coalhado de policiais, talvez alguns à paisana.

"Merda. Merda. Eu não tinha pensado nisso".

"Sai da frente seus vermes" interrompeu a fala de Milton o brutamontes com colete da Polícia Nacional que puxava a fila indiana com uma dúzia de homens, empurrando os mendigos para o lado.

"O que está acontecendo?" sussurrou ela.

"Acho que já sabem onde guardei a cópia." Cochichou ele.

Os dois mantiveram o disfarce olhando para baixo e tentando não concentrarem-se à ação policial, com medo de chamar a atenção.

"Enfim, perdemos." Disse ela, já se afastando do terminal. Desolada.

"Ainda não." Disse ele.

***

Caminharam por mais meio dia até chegar ao parque. Com umas moedas compraram um sanduíche com mortadela e almoçaram antes de Milton voltar ao terceiro lugar. Cavou, por algum tempo achou que o material tinha desaparecido dali. Mas então encontrou o cartão envolto em plástico. As gravações continuavam a seu dispor (naquela hora ele nem sequer lembrava do bécape virtual). Eles ainda tinham como foder A Grande Quadrilha Nacional.

À tarde os dois zumbis começaram então a fuga damaior cidade do país. Ficaram esperançosos quando passaram por duas blitzes semsequer serem notados    

Yellow BananasWhere stories live. Discover now