Parte 1 - Encurralado

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Eram três da manhã em Cabo Frio quando Éverton, um jovem que vinha de um bar gay na Praia do Forte - a praia mais famosa da região - andava sozinho, a caminho de casa. A rua estava escura, fria e tão vazia, que ele quase podia ouvir as batidas de seu coração. Um pouco de medo preocupava sua mente, fazendo com que ele desse passos largos e afobados pra chegar em casa mais rápido.

O silêncio foi quebrado pelo som distante de um carro vindo atrás de Éverton. Estava a, mais ou menos, 300 metros dele mas se aproximava rapidamente. Juntamente ao som do motor, ouviam-se gargalhadas, um rock bem alto e barulho de garrafas de vidro sendo arremessadas ao asfalto. 

Os passageiros deste carro devem estar ultra-bêbados”, presumiu Éverton. Aquela coleção de sons intimidantes e amedrontadores se aproximava dele cada vez mais. O solitário e desprotegido transeunte apenas esperava que o carro passasse por ele direto e reto, sem notá-lo.

Ao que o carro parecia estar a dez metros de distância de Éverton, a velocidade diminuía, as vozes silenciavam-se e o volume do som ia sendo reduzido intencionalmente. Éverton caminhava encolhido no canto da calçada, com o capuz do casaco cobrindo a cabeça e parte do rosto. Suas roupas bem estilizadas, seu andar um tanto quanto delicado e sua linguagem corporal entregavam sua natureza. Não havia como camuflar as cores do arco-íris que fluíam de sue ser. Mas naquele momento, aquilo não era algo bom.

– Olha só isso aqui, rapaziada! Uma gazela perdida do bando – dizia a voz debochada de uma passageira doMonza preto. Uma mulher jovem com uma maquiagem pesada e roupas pretas.

– Deve estar procurado um macho – completou um dos passageiros. Um rapaz parrudo, de camiseta preta e de cabeça raspada.

– Ei, viado. Por que você não se mata e livra o mundo da sua imundície, hein? Seu verme!

Apavorado e movido pelo desespero, Éverton tentou correr mas foi alcançado pelo motorista, que pulou para fora do carro em uma fração de segundos e o agarrou com um puxão pelo casaco. Uma gangue de quatro homens grandes e carecas e uma mulher vestida em um estilo gótico, cercou Éverton.

– Tá com medinho, ta? Seu sodomita pervertido dos infernos! – dizia Adolf, enquanto segurava Everton pela garganta e o erguia contras as grades do prédio ao qual se encontravam em frente.

O nome “Adolf” não o pertencia mas ele gostava se ser chamado por tal, em seu círculo de amigos e por quem mais o conhecesse. Sua mãe, entretanto, o chamava pelo nome de batismo. Renato.

Éverton sentia uma indisfarçável vontade de chorar e um tamanho pavor, que urinou, deixando marcada com uma imensa mancha, a ajustada calça jeans. Com um soco violento, Adolf lançou Éverton ao chão. Ele gritava por socorro, mas seu berros apenas enfureciam mais o grupo, que revezava pisoteio e chutes nas constelas da pobre vítima.

Éverton não olhava no rosto dos agressores. O medo o impedia de encarar os olhos coléricos dos monstros que o atacavam. Não conhecer a face daqueles indivíduos, dificultaria o reconhecimento dos mesmos, caso eles fossem pegos pela polícia. Porém, uma quixa na delegacia estava longe dos pensamentos de Éverton. Naquele momento ele somente sentia muita dor e medo, não sabia qual seria o desfecho daquele episódio, se sairia vivo ou terminaria morto e desovado no Canal Itajurú – um braço de água salgada que corta a cidade de Cabo Frio.

Depois daquela tortura, o grupo arrastou a vítima para perto do carro e colocaram-na dentro do porta-malas, junto a alguns objetos, os quais Éverton não conseguia identificar. A tampa do porta-malas foi abruptamente fechada. Apenas o escuro, o ar abafado e o cheiro de gasolina eram companheiros do jovem que fora brutalmente espancado. Ele ouviu o grupo entrar no carro e bater as portas.

– Aonde a gente vai levar esse verme? E o que vamos fazer com ele? – perguntou Ráisa, a fêmea mascote do grupo, ao que Adolf, líder da gangue, respondeu:

– Gostosa... Um grande homem, um dia disse: “A natureza é cruel; então também estamos destinados a ser cruéis. Temos de ser cruéis.” Espera pra ver.

Amado OfensorOnde histórias criam vida. Descubra agora