A Caixa

85 14 31
                                    

Dentro da caixa havia uma espécie de forro de cor vinho com apenas um anel dentro, ele aparentava ser em ouro com uma estrela triângulo na fronte, tinha alguns riscos no corpo, nada mais havia na caixa.

— O Anel de Salomão — Disse Josh sentando próximo de mim.

— O que?

— O que está na sua caixa, o formato, o símbolo, parece muito o anel de Salomão. Você não conhece?

— Este foi um presente dado pela minha mãe antes de morrer, não sabia que tinha um nome.

— Diz a história que o rei bíblico era detentor de um artefato, um anel cabalístico que lhe dava privilégios maravilhosos, feito de um ouro de pureza impossível de se encontrar na terra, possuía o signo conhecido por "Selo de Salomão". Esse selo salomônico funde os princípios de criação e virtude, segundo a tradição, era um talismã valiosíssimo com o qual Salomão submetia à sua vontade todos os gênios anjos ou demônios. Assim, os anjos se submeteram a vontade de Salomão e foram obrigados a trabalhar como escravos. Também é contado que o anel depois da morte do rei se perdeu na história e nunca mais fora utilizado. Se era capaz de fazer com que estes seres fossem manipulados, imagine o que o anel poderia fazer com a mente humana? Outro ponto que diz os cronistas, é que o portando era possível transitar para o mundo humano mesmo depois de morto.

— Não acredito que este anel seja tão extraordinário quanto este descrito, quer dizer, eu teria uma arma poderosa em mãos. Como sabe de tudo isto?

— Quando se mora afastado e sua única distração é a caça, conseguimos tempo para ouvir boatos e imaginar como essas histórias poderiam ter acontecido.

Continuo olhando para o Anel, corro meus dedos pela estrutura, no seu centro há um símbolo, parecem linhas conectadas, ao todo são nove retas formando uma figura geométrica que fica entre uma mistura de triângulo e estrela.

— Eneagrama — Afirmou Josh de novo de forma direta e precisa.

— O que?

— Este símbolo, é um eneagrama. É usado para agrupar as personalidades humanas num ciclo infinito de seguimento, note que por qualquer ponta que se inicie, sempre irá percorrer todas as demais linhas até reiniciar a contagem. Seres humanos são diferentes em suas características, entretanto dispõe da mesma essência, todos somos maus e todos somos bons, a timidez e a exuberância são estilos presentes em qualquer um. A única diferença está na proporção que isso nos atinge, é como se tivéssemos uma mesma composição, entretanto para alguns o sal ficou mais evidente, enquanto que para outros a pimenta tonificou o sabor. Para o anel, anjos e demônios fazem parte do mesmo conceito, mesma receita com toques diferentes. Não se estranhe se um dia pegar a si próprio agindo de forma diferente do usual, isso é você.

Enquanto escutava atento todas aquelas informações prestadas, notei que embaixo do forro que era usado para revestir a caixa havia um pedaço de papel rasgado, tinha a aparência amarelada e continha uma sequência de nomes escritos.

Perfectione

Utile

Pervenire

Individualisticus

Observatore

Somnium

Princeps

Certatim

Pacificae

— Coloque o anel — Falou Josh sério e com a expressão maléfica, como se divertisse com minha inocência e ingenuidade sobre o assunto.

— Por que? — Perguntei assustado.

O ar de apreensão tomou conta da pequena cabana, por que aquela afirmação tão repentina? O que aquilo poderia acarretar? Colocar um simples anel no dedo? Aquilo não soava como algo prudente a fazer. Olho para o rosto de Josh e ele aparenta uma leve impaciência enquanto se levanta, pega uma laranja em cima da mesa e com a faca começa a descasca-la. Sem muito entender a situação não consigo disfarçar a preocupação.

— O que aconteceria se eu o colocasse? — Perguntei de novo ainda acuado na cama.

— Você ganhou esse presente da sua mãe e até hoje nunca o ousou colocá-lo? — Questionou Josh irritado.

Fui pego na minha própria mentira, não saberei dizer o que é melhor nesse instante, ludibriar este equivoco e continuar criando uma muralha de omissões, ou talvez seja ideal falar a verdade e ver o que irá acontecer?

— Eu não ganhei ele da minha mãe. Um homem num assento em frente ao meu estava portando a caixa antes da colisão do trem, não sei por que ela está agora comigo, não sei o que ela representa ou significa, se é que exista algum sentido na caixa e no anel.

Josh continuava de costas para mim cortando lentamente a fruta sem nem ao menos saboreá-la, eu começava a desconfiar de toda essa situação, mas não havia muito o que fazer nesta encruzilhada, ainda com ferimentos, a quilômetros de algo civilizado, eu teria que esperar para ver o que aconteceria.

— Se eu lhe disser que já usei este anel, você acreditaria em mim Daniel?

— Já o usou? Como assim? — Tudo que conseguia fazer era perguntar, estava confuso com o assunto.

— Conheço a história dele, bem como os acessos que ele pode lhe proporcionar. Não é um reles anel e não está com você por acaso, entretanto para que possa utilizá-lo da maneira adequada, teremos que buscar na sua história o porquê dele estar agora com você e não com qualquer outra pessoa. Lembraremos de todos os pontos relevantes pelo qual viveu, foi assim comigo, será assim com você se desejar.

— Acessos? Que acessos? — Mais uma vez me peguei perguntando perdido em tudo que ele me contava.

— Você terá que descobrir por conta própria Daniel, posso apenas ajuda-lo com as histórias, do mesmo jeito que a mim foram passadas e eu percebi que o anel seria útil, melhor dizendo, a minha única esperança de não continuar sofrendo.

— Por que não tem mais o anel? Conhecia o homem que o me entregou?

— O anel tem tempo marcado, não é possível viver com ele para sempre. Seus ferimentos ainda demorarão para cicatrizar, temos tempo para começar a primeira história, quero que preste atenção nela e busque alguma relação com você e com os pontos que até agora lhe contei.

De fato, não existia muito o que eu pudesse fazer naquela situação, era difícil se manter de pé, e visivelmente eu não conseguiria sair daquele lugar, Josh era grande, forte, de ombros largos e usava uma barba volumosa. Minha alternativa era esperar, ouvir a história e manter nosso relacionamento amigável para que nada se torne estranho.

Um anel? Meu ceticismo é forte demais para acreditar em tais afirmações, entretanto a história inteira e como ela vem se desenrolando me instigou a ver o seu desfecho. E como me lembraria de todos os pontos relevantes da minha vida se nem ao menos lembro do rosto de meus pais?

— Ok. Vou escutar, mas com o que eu devo buscar relação na minha vida?

— Se descreva Daniel, como é sua personalidade na sua essência? É capaz de matar?

— Matar? Claro que não, sou inofensivo até para moscas — Respondi apavorado com a pergunta, as frases diretas que Josh usava me assustava, não tinha introduções.

— Claro, coloque o anel e escute — Disse ele com um ar irônico.

O Homem e a CaixaOnde histórias criam vida. Descubra agora