Vitoriano Café

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O sinal grita nos meus ouvidos. Levanto atordoado sem entender onde estou e logo vislumbro o Caio guardando suas coisas.

Levanto assustado e jogo a mochila sobre os ombros com os cadernos e livros na mão. Acompanho o burburinho de gente que se move em direção a saída da sala.

- Cara! Como você conseguiu dormir esse tempo todo? Minha cabeça esta doendo em cinco idiomas diferentes.
- Mas que...- Olho com a cara fechada pro Caio. Eu realmente não queria estar agindo assim com ele hoje, é só que, não sei o que esta acontecendo comigo.
- É sério. Eu só não entendi porque todo mundo tava olhando pra você enquanto você dormia. Aconteceu alguma coisa ontem?
- Nada Caio, nada que você precise saber pelo menos. Escuta, podemos ir no V. Café antes de ir pra casa?
- Boa ideia Rafa! Eu to mesmo precisando.

Andamos quietos ate o café velho e empoeirado que ficava na esquina da universidade próxima da nossa escola.

Muitos alunos se empunhavam nas pequenas mesas em estilo vitoriano que estavam dispostas pelo saguão de um antigo restaurante que se tornara o Vitoriano Café. O prédio era simples e bem romântico, além disso, servia o melhor Frapuccino da cidade.

- Caio escolhe uma mesa que eu vou fazer o pedido, o que você quer?
- Eu quero só um café com leite e...
- ...Creme em cima. Eu já sei.

Fui ate o balcão com a cabeça baixa tentando tirar algumas cédulas da bolsa.
- Um americano forte e um café com leite por favor, e se por gentileza poder colocar o... - Quando levanto a cabeça quase caio pra trás. É o tal aluno novo. - ...Creme em cima. É-é pro meu amigo, ele só toma assim.
- Não faz mal, eu coloco. Alias, você é o menino que estava dormindo hoje cedo não é? - Ele abriu um sorriso. E puta, que sorriso.
- Sim! - Rio nervoso - Sou eu, alias me desculpe.
- Que isso, toma, estão prontos.
- Ah, obrigado. Quanto deu?
- Nada, opa, o seu é por conta da casa. - Minhas bochechas queimam. Eu e essa minha mania de corar. Ele abre outro sorriso. - Mas o do seu amigo, esse ai vai ter que pagar.
Estendo uma nota pra ele.
- Obrigado. - Pego os cafés e saio apressado sem mesmo esperar o troco.

Caio estava dormindo sentado em uma mesa perto da janela ainda com a mochila no ombro.
- Acorda bela adormecida. - Jogo o café em sua direção.
- Cuidado Rafael! Ta quente essa merda, pô você agiu estranho hoje o dia imteiro! O que ta acontecendo com você?
- Caio me desculpa! Por favor, hoje estou meio absorto. Aconteceu uma coisa ontem mas, não sei se já estou pronto pra te contar.
- Pois agora você vai contar estando pronto ou não.
Respiro fundo.
- Ontem, aquele menino, o Augusto. Ele me beijou. Eu não queria, ele me pegou desprevenido.

Sinto um soco atingir a mesa.
-  Se ele te obrigou alguma coisa eu o mato! - Caio começou a gritar sem nem perceber.
- Calma, ele não me obrigou a nada. Bem, talvez. Mas a questão não é essa! A questão é que... - Respiro fundo de novo.- ...A questão é que eu gostei Caio, eu gostei de beijar outro garoto. Eu não sei o que esta acontecendo comigo! - Desabo sobre a mesa, vencido pelo cansaço e aliviado por dividir aquilo com alguém.

- Rafael, você é gay? - Sinto seus grandes olhos me encarando. Permaneço ainda com a cabeça baixa.
- Não!!! Eu não sou gay Caio, se você repetir isso eu acerto um soco tão forte no meio do seu estômago que você vai passar seis meses apenas comendo alimentos líquidos!  - E ai elas chegaram. As lágrimas inundaram meu rosto, confesso que estou assustado com a possibilidade. Mas... Não. Não pode ser.
- Rafael se você beija garotos e gosta você só pode ser uma coisa, G-A-Y!!

Levanto a cabeça. Eu poderia ter me mantido pleno mas, ouvir aquilo pausadamente, letra por letra,um misto de medo e raiva me invadiram e tudo que sinto é o sangue do Caio escorrer pelos meus dedos fechados. Minha mão foi de encontro ao seu nariz tão rapidamente que eu não consegui evitar.

- Seu bichinha!!! Inútil! Nunca mais fala comigo na sua vida seu viado babaca!

Se antes eu já estava confuso e com raiva de mim mesmo agora então nem se fala! Eu nunca pensei ouvir aquilo e muito menos ouvir aquilo do meu melhor amigo.

Ao mesmo tempo que me sinto perdido e envergonhado, sinto uma raiva crescente dentro de mim. Como ele pôde fazer isso logo agora que eu mais precisava dele.

Saio correndo em direção a rua. As lágrimas gotejam pelo asfalto.
Não muito longe sinto um braço me segurando pela cintura, impedindo-me de fugir.
Viro já com o punho preparado para mais um soco certeiro.

Quando me viro vejo Heitor, me encarando preocupado. Isso me desarma.
- O que aconteceu? Rafael não é?
- Sim. Ah... Nada! Eu só acabei de brigar com meu melhor amigo.
- Que droga cara. O que aconteceu?
- Nada!!! - grito. - Porque eu deveria contar alguma coisa pra você?
- Calma ai baixinho! Eu só quero saber se você ta bem.
- Eu estou. Agora você pode me soltar?
- Me desculpa, eu nem percebi que estava.... Me desculpe.

Completamente sem jeito ele retira o braço envolta da minha cintura e finalmente consigo me libertar. Volto a correr pra casa, mas agora extasiado. Sinto um sorriso brotar em meu rosto onde exatamente dois minutos atrás escorriam gigantes lágrimas.

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