É chegada a hora

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Assim que volto pra casa minha mãe me espera com uma carta nas mãos. Instantaneamente meu coração acelera e levo as mãos ate a boca.
- Chegou? - Pergunto ansioso querendo saber a resposta mas ao mesmo tempo intrigado.
- Sim. Você viaja amanhã Rafael. - Mamãe responde com uma lágrima nascendo no canto do seu olho. - Você foi aceito na Escola do Louvre meu filho!

Um misto de alegria e tristeza invade meu corpo. Eu não posso simplesmente ir embora agora! Ao mesmo tempo que eu sinto que preciso permanecer com a minha família uma sensação de sonho realizado me atinge e me encoraja. A vontade de correr imediatamente pro aeroporto só é contida por um sentimento. Um sentimento que tem nome e um sorriso lindo.

Desabo sobre o hall de entrada. Não consigo chorar, tudo que consigo pensar é como vou me despedir dos meus amigos, como vou mudar de escola praticamente no fim do ano e em como vou deixar de conhecer mais a fundo o dono daquele sorriso. Eu nunca mais vou voltar a ver o Heitor novamente.

Levanto e finalmente só agora percebo que não estou com a mochila nas costas.

- Droga!! Droga, não pode ser. - Saio pelo jardim em procura da minha mochila.

- O que foi garoto? - Minha mãe corre atrás de mim enquanto procuro pelo chão minha mochila da escola.

- Eu perdi minha mochila!!! - Agora que falo em voz alta percebo o quanto idiota isso parece.

- Como você conseguiu esquecer a mochila na escola?

- Eu não esqueci na escola! Eu passei no V Café antes de...- Me lembro do momento em que acertei o Caio. É como se novamente o sangue do meu melhor amigo deslizasse por entre meus dedos.

Sai correndo sem olhar pra trás. Minha mãe permanece parada na porta de casa me olhando preocupado.

- EU JÁ VOLTO!! - Grito já de longe, correndo prestes a virar a esquina.

Entro a toda na velocidade no Café já quase fechando.
A mochila não esta na mesa em que eu e Caio sentamos mais cedo. Vou ate o balcão na tentativa de perguntar se alguém viu.

- Com licença - Chamo a moça que prepara um expresso - Você sabe se alguém entregou uma mochila vermelha aqui?

- Garoto a única mochila vermelha que eu vi foi a que o meu amigo Heitor levou na hora que foi embora. Se eu não me engano ele disse que era de um amigo.

Então ele pegou. Ele quer me devolver! Mas, mas como ele pretende fazer isso? Ele não sabe nem o meu nome direito, quanto mais onde fica minha casa.

- É o Heitor que eu estou procurando. - Minto. - A mochila é minha, você sabe onde ele mora?

Ela sorri serena.
- Ele mora do outro lado da rua, os pais dele são os donos do café. - Ela aponta pra um jardim perfeitamente cuidado. - Ali, aquela regando as flores é a mãe dele. Você pode perguntar pra ela.

Sai antes da moça do balcão terminar.
- Com licença senhora? Eu estou procurando o meu amigo Heitor - Minto novamente. Eu nem sei o seu segundo nome e já estou o chamando de amigo.

- Pode entrar querido! Ele esta sozinho la dentro. O quarto dele é o primeiro depois da escada.

- Muito obrigado.

Entro sem jeito na casa aconchegante mas muito grande em que morava a família de Heitor. Sigo pelo caminho que sua mãe me indicou. Escuto um barulho vindo do quarto que ela acabara dizer ser o de Heitor, um barulho de música.

Resolvi subir ate o quarto. A porta esta aberta e decido entrar.
Heitor esta enrolado numa toalha, como quem acabou de sair do banho. Algumas gotas de água ainda percorrem o seu corpo definido. Cada gota marcando caminho por aqueles braços musculosos, completamente inofensivo ali, de costas para a porta.

Não consigo me mexer, estou praticamente hipnotizado pela visão de Heitor. É quando finamente ele resolve olhar pra mim.

- Caramba!! - Ele se assusta e a camiseta xadrez de flanela cai da sua mão. - O que você esta fazendo Rafael?

- Minha mochila por favor. Você esta com ela, eu já sei. - Tento parecer tão rude como da primeira vez.

- Esta comigo sim. Eu peguei pra te devolver. Só nao sabia como, calma ai, como você sabe onde eu moro?

- A moça do balcão me falou. Ela também me disse que você estava com a minha mochila.

- Sofia. - Ele suspira um nome. - Calma ai que eu já vou pegar sua mochila.

- Me desculpe. - Interrompi ele antes que saísse do quarto. - Não querendo ser invasivo mas, nao seria melhor se vestir primeiro?

Nessa hora ele se tocou e voltou pra recolher a camisa do chão.

- Você poderia? - Ele faz um sinal pra porta.

- Claro! - Sinto minha bochecha corar. - Me desculpe, eu, eu nem percebi.

- Relaxa - Ele sorri - Muita gente gostaria de me ver pelado, mas não vai ser hoje que você vai ter essa oportunidade.

Ao escutar isso coro mais forte, e mesmo sem me ver ele sabe que me causa esse efeito.

- Essa nunca foi minha intenção, seu babaca! Pra começo de conversa nem era pra eu estar aqui.

Ele abre a porta e fica em pé me olhando, com um braço apoiado no batente. Três botões da sua camisa estão abertos e nao posso evitar olhar, alguns finos fios nascendo no meio do seu peitoral.

Ele parece tão, atraente. Eu não sou gay! Por que esses pensamentos estavam me perturbando? Eu só quero fugir de tudo isso, fugir desse sentimento.

- Agora você pode dar minha mochila? Eu preciso ir pra casa.

Ele foi até um móvel no corredor e pegou minha mochila.

- Te dou se você me der um beijinho. Bem aqui - Ele aponta a bochecha direita. - Como forma de agradecimento.

Já nao tenho nada a perder mesmo. Decidi entrar no seu jogo, brincar com ele do mesmo jeito que ele estava brincando comigo.
Me aproximei do seu rosto. Fechei os olhos e depositei um breve beijo no seu rosto de pele macia.
Ele se afastou rindo e me entregou a mochila.

- Eu tenho que ir - Nervoso ando rapidamente em direção a porta.

Ao passar pelo jardim escutei a mãe dele se despedindo
- Até mais querido, volte quando quiser!

Quando olho pra trás consigo ver Heitor parado na porta, me observando caminhar, enquanto sua mãe acena pra mim. Resolvo acenar de volta.

Me arrependi de nao ter contado nada ao Heitor. Ele é a única pessoa na qual eu poderia contar que amanhã irei embora.

Deito na cama enfiando o rosto no travesseiro, tudo que eu quero é sumir desse planeta. A última coisa que eu quero pensar é na reação das pessoas quando eu for embora.

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