Quando eu era pequena e meu pai virava a noite no bar eu sabia que ele chegaria mais violento que o normal, então, quando eu escutava seus passos arrastados eu corria para a estufa da vizinha, geralmente ficava até o outro dia, quando ele saia novamente.
Em uma dessas noites, meu pai estava mais furioso que de costume, eu não cheguei na estufa antes que ele entrasse, pois ele arrombou a porta da frente.
Ele esbravejava "aquela desgraçada", "vai me pagar, e queimar no fogo do inferno". Corri assustada, sem entender nada, para meu abrigo secreto. Ao chegar lá descobri que não era tão secreto, lá estava Arthur, com uma toalha estendida em baixo da mesa onde eu costumava ficar, com uma grande cesta de piquenique. Me aproximei desconfiada, me perguntando o que ele queria. Foi ali que nossa amizade começou, aquele lugar não só se tornou meu abrigo, meu porto seguro, como meu local de encontro com ele.
E agora, sentada no chão do banheiro, sentindo a água pesada cair sobre meu cabelo, sinto que estou boiando no oceano, sem meu porto seguro. As lágrimas se misturam a água quente. Achei que com a morte de Tom eu nunca mais choraria, como fui tola.
De onde veio aquela garota? Será que ela estava falando a verdade? Vou para a cama com várias dúvidas, e custo muito a pegar no sono, o que com alguma certeza aconteceu as 5 da amanhã.
Ouso um barulho agudo. Outro. Outro.
Levanto da cama esfregando os olhos, disposta a parar esse som. Ouso de novo. São pedrinhas na janela. Caminho até lá, e puxo a cortina. Arthur esta em frente a minha casa, ele olha para todos os lados e volta a encarar minha janela, me escondo. Ele joga outra, me assunto com o som tão próximo.
Ele esta lindo, com o sol nascente subindo no céu atrás dele, clareando seus cachos, mas nem que ele estivesse de tirar o fôlego, porque ele está, não vou falar com ele até ter certeza de que lado ele está.
Ignorando o som das pedras, eu caminho para o banheiro.
Escovo os dentes e desso. Começo a mexer nos armários. Encontro um pote de café vencido, algo que parecia macarrão mas que mais parece uma pilha de mofo. Preciso fazer compras. Com urgência.
Por fim, encontro meia caixa de cereais que comprei na semana passada, vai ter que servir. Ao terminar subo de volta para o quarto. Olho pela janela de novo, ansiosa para encontrar Arthur. Ele não esta mais lá. Sinto decepção, mas foi melhor ele ir, eu não iria abrir a porta para ele.
Visto meu uniforme do Starbucks, pego minha mochila e saio de casa. Deixo o celular, para garantir que Arth não me ligue. Caminho até o ponto do ônibus, para pegar a linha que passa de frente ao café.
Como sempre, chego 20 minutos mais cedo. Digo oi Rayla que esta lustrando as mesas que já estão lustradas, e entro para a parte interna da loja. Ouso ela vir atrás de mim.
"Oi Fê", sinto ela hesitar. "Sinto muito pelo seu pai", fala, sinto vontade de rir.
"Não sinta", falo e vou para os estoques, para ver se já estamos prontos para abrir. Olho o relógio, são 6:40. Dormi apenas uma hora, consigo até sentir a falta do sono.
"Ela esta aí? Preciso saber Rayla!", ouso o som abafado da voz de Arthur. Em pânico, entro no estoque e fecho a porta de aço.
"Ela está lá nos estoques", Rayla fala manhosamente, rolo os olhos, ela sempre foi afim dele.
"Licy? Cadê você?", ele grita, entrando no galpão. "Eu sei que esta aí, vou ficar aqui até você aparecer."
Filho da mãe, posso ser demitida por isso, e preciso desse emprego.
"Vai embora Arthur, não quero ver você", grito. Ele caminha até a porta, parece loucura, mas aposto que consigo ouvir a respiração pesada dele atrás dá grande porta, como se ele tivesse corrido.
"Por favor, precisamos conversar. Abre aqui vai", implora.
"Não. Você defendeu uma garota que nunca viu na vida, ficando contra mim que sempre fui como sua irmã", grito, começando a chorar.
"Ela é idêntica a você Licy, defendi ela porque ela pode ser sua irmã e isso significa que você não esta tão sozinha, quero o seu bem, e acredito que Felícia merece uma chance", ele falar o nome dela me dá ciúmes, soua íntimo demais.
"VOCÊ é a única coisa que eu tenho, não quero uma irmã ou uma mãe que me abandonou, não vou aguentar essa dor, já sofri demais Arth", começo a soluçar alto.
"Eu sei meu amor, eu sempre vou estar aqui para você. Vamos conversar então, para resolver isso? Prometo não te pressionar", implora, sinto dor na sua voz, ele nunca gostou de me ver chorar.
Houve um época em que eu me apaixonei por ele, mas acreditei ser um sentimento de amizade muito forte, e agora percebo porque achei isso, ele sempre está comigo quando eu preciso, sem pedir nada em troca."Me encontra na praia depois do trabalho", falo fungando, limpando os olhos.
"Ah Deus. Que bom. Agora abre essa porta pra mim te abraçar", isso é tudo o que eu iria querer agora, mas meu orgulho fala alto e eu digo não.
"Vai embora, Jeff daqui a pouco chega e preciso ver o estoque", peço, procurando o interruptor da luz do depósito. Percebo que ele hesita antes de falar:
"Certo. Te vejo mais tarde", demora mais 30 segundos de frente a porta antes de caminhar para fora da loja, saio quando ouso o sino da entrada da loja.
Suspiro aliviada ao sair. Rayla me olha com um ponto de interrogação entre as sobrancelhas quando vou buscar a planilha com ela.
"Confusões demais para explicar", falo e volto ao depósito.
Preciso manter a cabeça ocupada, e não me preocupar com o que Arth pode falar da minha suposta irmã gêmea.
***
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Que Bom Que Você Chegou.
RandomFelicity e Felícia, duas irmãs gêmeas que foram separadas quando ainda eram dois bebês, pois após muitos anos sofrendo nas mãos do marido, a mãe delas decidi deixa -lo, mas ele ganha um direito de ficar com uma das gêmeas. E a assim sua mãe parte pa...