Enquanto desço as escadas penso constantemente sobre o 'toda gente' e não posso deixar de sentir medo.
"Sarah, estes são o Ron e a Tracy." Apresenta-me a minha mãe aos desconhecidos que me rodeiam.
"Prazer." dizem ambos sorrindo para mim. O que se está a passar?
"Expliquem-se." é tudo o que consigo dizer.
"Bem, o Ron e a Tracy são género de uns terapeutas escritores, e são amigos da nossa família à muito tempo. Têm uma casa lindíssima no campo, e portanto levar-te-ão para lá." O meu pai explica-me com um tom bastante calmo, e obviamente só quer manter as aparências.
"Não vou para lado nenhum a não ser LA." exclamo sem que possa pensar no que acabei de dizer. Agora comecei, agora vou acabar.
"O quê?" o meu pai questiona-me com uma expressão incrédula.
"Sim, ouviram todos muito bem. Fui contratada como modelo porque me candidatei, eles aceitaram-me e eu vou para lá. Vou seguir o meu sonho, e não me podem prender-me aqui, sou uma adulta, aceitem ou não aceitem." Digo e sinto um peso a sair de mim, acabou.
"Ela está só a sonhar alto, peço desculpa por ela." o meu pai fala dirigindo-se à tal de Tracy e ao rapaz chamado Ron, como se eu não estivesse presente.
"Sonhar alto? O que eu disse é verdade, e por o ser custa-te aceitar. Durante estes anos todos fizeste-me acreditar que o caminho a seguir era aquele que tu definias, mas felizmente abri os olhos a tempo." Respondo-lhe e pela primeira vez sinto que estou a ser ouvida.
"Filha..." A minha mãe começa e eu simplesmente mando-a parar.
"Mãe.... Pai... eu gosto de escrever, e vou continuar a fazê-lo. Mas, para a minha vida profissional eu escolhi outro ramo, se vocês realmente gostam de mim aceitem isso." Falo, quase pedindo para o fazerem.
A minha mãe retira-se e leva consigo o Ron e a Tracy, e agora isto é entre mim e ele, mas também não é uma novidade.
"Se o fizeres, deixarás de ser minha filha." Ele afirma e sinto o meu coração a partir."
O meu pai pode não ser a minha pessoa favorita no mundo, nem mesmo a mais simpática, mas ele sempre possuiu um certo pó no fundo do seu coração, que me chamava para ele. É verdade que, nos últimos anos eu tenho me sentido mais distante dele, mas nunca o homem por quem eu daria tudo e chamava de pai diria isto e portanto sinto que, esta pessoa à minha frente, a olhar-me como se fosse o estrago que aconteceu na sua vida é apenas um desconhecido com quem partilhei momentos.
"Dá-me o meu telemóvel. Saio mesmo hoje de casa... mas nem isto te deveria dizer, não sou tua filha!" quase grito e sinto as lágrimas a queimarem-me o rosto.
"Lembra-te que a escolhe fui tua, e apenas tua." Ele diz, e nesta história ele têm de ser o homem ignóbil, mesmo que custe a mim própria confessar tal facto.
Ele entrega-me o meu telemóvel e subo para arrumar as minhas coisas. Quero sair de cabeça erguida desta casa, e percebo hoje porque razão nunca a chamei de lar. Um lar, e mesmo que isto seja visto como uma visão lamechas da palavra, é o lugar onde mora toda o teu coração.
Vou ligar à Maggie. Sinto-me mal por recorrer a ela, quando a situação está má, mas ela é, apesar de tudo a minha melhor amiga e ninguém pode alterar isso.
"Maggie?" choramingo.
"Sarah? Sarah? Que se passa?" ela diz, e sei que está preocupada.
"Espera, eu já te vou contar tudo, mas diz-me que posso ficar aí a dormir? Por favor." Peço mesmo sabendo que ela não vai dizer não.
"Obviamente tona! Vem o mais rápido possível." Ela desliga.
A Maggie vive sozinha desde que começou a faculdade, e bem, nesta caso, fico feliz por isso. Ela gosta de estar refugiada e de ter monólogos constantes, ela pode até ser considerada estranha, mas sempre teve a liberdade como recurso a tudo, e quem dera a muitos poder dizer o mesmo. Quem me dera poder dizer o mesmo.
Demoro mais alguns minutos arrumar as coisas todas, ou pelo menos uma grande parte. Não quero voltar aqui, vou parecer fraca e não quero dar a ninguém aqui esse gostinho.
Quando finalmente acabo com as arrumações desço, e vou procurar a minha mãe.
"Mãe....?" chamo por ela. Não foi difícil encontrá-la, ela está sempre na velha pequena sala a pintar quadros, isto quando não está a trabalhar.
"Sarah tu não podes ir embora." ela fala sem me encarar.
"Já decidi o que fazer, só te vim dizer... Eu adoro-te." confesso, eu ia dizer amo-te, mas é um sentimento tão forte e complicado que não me vejo capaz de usar a palavra, nem mesmo quando diz respeito à minha mãe.
"Amo-te" ela anda até mim e abraça-me.
Não lhe consegui dizer mais nada, e por isso, depois de alguns momentos de afeto, além de ter matado a minha carência senti-me a sufocar, pois o amor de mãe não deve ser resumido apenas a um bom momento, e se eu demonstrasse que estava a desfrutar imenso daquilo ela ia fazer exatamente isso, Adeus Mãe.
Bati e a porta e senti o mundo a preto e branco.
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Torn
FanfictionÉs apenas uma pessoa, mas ninguém te permite sê-lo. Será a tua alma suficientemente forte para equilibrar aquilo que dois mundos exigem? Ou terás de escolher um e ficar "Torn" (despedaçada) por perder o outro? Qual irás escolher? Há uma escolha a s...