Pode-se afirmar que a grande maioria da população de Firesgard estava presente na cerimônia de abertura do solstício de verão. Fato que se dava, principalmente, pela presença do Príncipe Mérian no grande evento. Firesgard estava em paz com o Principado de Arlamelah, não só pela atual princesa ser natural do Leste, mas principalmente pela forma com que Mérian mantinha seus olhos voltados para os Baixos Reinos. Para um povo constantemente acostumado com o descaso da Capital para com o que antes fora chamada de Armada de Cintreyn, não era difícil imaginar a euforia de todo um povo. Aquele era o dia de soltar a voz embargada por séculos.
Barracas de palha se enfileiravam por toda a extremidade do alto cume escolhido para a celebração. Foram enfeitadas com folhagens dos mais variados tipos em homenagem ao verde único de Greendane. Também faziam parte da ornamentação os compridos e finos barbantes de seda em leve tom branco, com bordas em ouro da Capital. Foram amarrados de barraca em barraca, servindo também como um cordão de isolamento, além de finalizar em grande estilo e delicadeza todo o redor do grande palanque armado para o príncipe, sua dama e os demais convidados Reais.
Devido ao forte calor que chegara mais cedo e já castigava grande parte do Leste, foram deixadas de lado as tradicionais fogueiras, que deram lugar aos grandes candelabros da terra de fogo, enormes castiçais de sete braços, com cerca de três metros de altura e revestidos com o mais puro bronze. Foi construído por Djurval em meados do terceiro século desta nova Era. Historiadores do Leste diziam que os artefatos foram feitos sob olhar dos dois dragões protetores de Firesgard e que Djurval, além de suas mãos mágicas e cabeça pensante, era também um renomado encantador de dragões. Algumas canções chegavam a citar, ainda, que os artefatos eram testados pelo fogo dos dragões em fúria e que resistiriam até mesmo a um ataque em massa de Atalanta.
Os cinco candelabros já se encontravam acesos e as crianças cantarolavam e brincavam de roda próximas a eles.
O predominante calor fazia com que os primeiros barris de hidromel fossem abertos. Homens brindavam a todo tempo a ausência do príncipe, alguns impregnavam as cabeças de suas mulheres com uma possível desfeita Thermann, assim podiam jurar que suas comitivas não seriam avistadas naquela noite de céu alvoraçado e brilhante. Somente o vinho ainda era poupado naquele momento. Por terem vindo diretamente de Greendane, achavam que a bebida era abençoada pela Mãe de todos e que seriam amaldiçoados por beberem sem a presença de um Thermann.
Em Firesgard não havia comemoração ao se completar uma nova primavera, não festejavam colheitas, pois jamais tiveram um solo fértil, e nem mesmo celebravam um casamento, achavam que aquela era a ocasião de rever sua consciência e deixar de lado os prazeres mundanos. Eram bastante conservadores. Contudo, nada os impedia de extravasar por uma semana inteira em comemoração a passagem do príncipe, depois de anos, pelas suas terras. O verão não lhes trazia boas lembranças, porém essa era uma tradição dos seus primórdios. Firesgard sempre fora associada aos dragões e ao sol único, esses seriam seus maiores símbolos e todos remetiam ao fogo como elemento fundamental, tanto de sua essência, quanto de sua criação.
Rufus já estava no local, porém ainda não havia inaugurado uma bebida. Na verdade, não conseguia tirar o olhar protetor de Verginy, que arrumava uma apetitosa bancada de pães doces, com recheios que iam de frutas cristalizadas a ervas das mais finas e raras na região. Ele vestia o traje nascido das mãos de sua irmã, que lhe dava um ar mais jovial e elegante. Seus cabelos, agora comportados, eram presos por detrás das orelhas por uma fina camada de tranças que ele mesmo fazia. Havia passado boa parte de sua adolescência cuidando dos cavalos de seu tio e para assustar os sobrinhos levantava tarde da noite para trançar as crinas dos animais. Na manhã seguinte, dizia às crianças que uma espécie de demônio havia feito o serviço como um sinal de que na próxima noite uma delas seria levada pelo espírito maligno.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Crônicas de Arlamelah: Submissos
FantasíaUma poderosa e mística sacerdotisa adquiriu conhecimento e poder sobre os quatro elementos da natureza, criando através de suas forças e da benção de uma grande Deusa, um vasto e rico continente num lugar inóspito que em outra Era abrigou tribos sel...