Brilho dourado

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Quem visse a garota de cabelo cacheado e óculos subindo apressada as escadas do bloco 4 da Universidade Federal de Paladinópolis com uma mochila nas costas às dezenove horas e quarenta e três minutos de terça-feira, poderia supor que Lorena era uma universitária irresponsável que não sabe cumprir horário. A pessoa poderia ir mais longe e tentar imaginar motivos para o atraso: quem sabe ela tenha perdido o ônibus, ou tenha acabado de sair do seu trabalho, tenha demorado demais no banho, ou tenha acontecido algum acidente de trânsito que a atrasou... O que ninguém de Paladinópolis imaginaria, contudo, é que Lorena na verdade era a vigilante mascarada que vinha aparecendo nos noticiários recentemente e o motivo para estar atrasada para a aula de Fundamentos do Desenho era por estar lutando contra criminosos até minutos antes.


Mas para que você possa entender melhor como foi que isso aconteceu, vamos voltar para a manhã de domingo em que Lorena descobriu que sua vida mudaria para sempre.

DOMINGO

Nove da manhã. O despertador do celular de Lorena disparou tocando Seven Minutes to Midnight, sua música favorita da banda Nightmare Lemons. A garota negra espreguiçou-se, levantou da cama e abriu a janela do seu quarto para deixar a luz do dia entrar. Contemplou a vista: casas coloridas aglomeradas, pipas no céu e crianças correndo na calçada, uma cena comum pro dia a dia da Vila Campo Persa, localizado na periferia de Paladinópolis.

Olhou-se no espelho. O cabelo volumoso encontrava-se parcialmente amassado, afinal, ela acabara de acordar. Seus cachos nem sempre estavam assim tão volumosos como naquele dia, então ela queria aproveitar isso. Reparou que ela precisava tirar a sobrancelha. Faria isso mais tarde. Checou seu calendário, fixo na parede, em cima da mesa. 21 de Maio. Aniversário da cidade e 35 anos desde a Batalha da Perafita.

"Que desperdício o feriado municipal cair justo num domingo".

Faltam sessenta e cinco dias pro seu aniversário. Geralmente ela não ficava empolgada com seus aniversários, mas dessa vez Loli estava, pois não era sempre que se fazia 20 anos.

Escutou o som da televisão ligada e o cheiro de café, então desceu e beijou a mãe, Andreia, e os irmão mais novos, Pedro e Tadeu, que brigavam por um pedaço de pão com margarina. Lorena serviu-se de uma xícara de café, tomando cuidado para não derramar nada em seu pijama rosa claro, que ela ainda estava usando. Sentindo-se mais disposta, retornou ao seu quarto para trocar-se. Entrou, fechou a porta.

Estava prestes a tirar a camisa quando ouviu um som muito forte. Parecia com uma martelada em algo de metal. Caiu agachada no chão. Outra martelada. A alta frequência do som atordoou sua mente. Caiu de vez. Mais uma martelada. O barulho vibrava dentro da sua cabeça, como se tocassem um diapasão gigante ao seu lado. As mãos foram imediatamente para o ouvido, tentando inutilmente abafar o som e ela começou a sentir dor. Mais marteladas. Dezenas. Centenas de batidas sem parar. Ela não aguentava mais. O som era tão alto que ela não conseguia ouvir os próprios pensamentos. Começou a chorar de dor, os dentes cerrados com força. Sua visão começou a embaçar. O que estava acontecendo? Ela queria gritar, mas não conseguia.

De repente, silêncio. As marteladas pararam, finalmente. Ela abriu os olhos. As mãos, ainda tremendo, se afastaram do ouvido. Assim que sentiu forças novamente, se levantou e correu para a cozinha, onde já entrou gritando:

- VOCÊS ESTÃO BEM? - Lorena gritou, preocupada com a família, mas se surpreendeu ao ver os irmãos tranquilos na mesa e a mãe no sofá, assistindo televisão.

Leoa DouradaOnde histórias criam vida. Descubra agora