Capítulo 4 - Conselhos Paternos

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    - Eu tô te falando, Megan! – Rosa terminou mais um pedaço de torta de pêssego. – Como explica o fato de eu estar fraca e abatida? – empurrou o prato vazio na direção da amiga, no balcão da cafeteria – Mais.

- Muito simples, Rosa. Você estava bêbada, como quase sempre está! Deve ter bebido tanto que vomitou até as tripas e não se lembra. Está fraca e de ressaca! E sabe-se lá mais... – Megan serviu outro pedaço de torta a amiga, olhando desconfiada.

- "Mais" o que, Megan? Você tá insinuando que eu chapei? Eu não uso drogas e você sabe disso! Nunca fumei nem um cigarro e definitivamente não quero essas porcarias perto de mim! Olha o lugar onde vivemos! Você sabe que aqui temos contato com viciados nas ruas e nos nossos trabalhos o tempo todo. Acha que eu quero ser como eles? – Perguntou, magoada.

A amiga baixou os olhos, sentindo-se culpada e envergonhada pelo julgamento precipitado. Mas antes que pudesse pedir desculpas a morena voltou a tagarelar.

- Juro para você que tinha um cara doido lá! Mas antes de sair ele limpou tudo, como um brinco! Não tô reclamando disso não, fez até melhor do que eu mas...Meu celular! O cara LEVOU meu celular! Era resistente a água, ainda dava pra usar!

- Rosie, não faça drama! Já cogitou que pode ter deixado o celular cair no beco quando foi colocar o lixo pra fora e algum mendigo o pegou? – Megan perguntou, desviando a atenção para outro cliente que acabara de chegar – Conversamos depois, preciso trabalhar. Não fique pensando muito nisso, vai acabar ficando louca. Se quiser te ajudo a comprar um celular novo, tenho minhas economias. Agora aproveite o resto da tarde e vá tomar um ar!

Após dizer isso Megan esboçou seu melhor sorriso e foi anotar o pedido do cliente impaciente.

Rosa fez uma careta. Não adiantava, ninguém nunca acreditaria nela! E também, o que poderiam fazer? Se o cara era vampiro mesmo tinha algum tipo de super poder ou sei lá o que. Fritaria todo mundo com raios que saem pelos olhos ou os escravizaria com poder de controle mental. Meu Deus, o que estava pensando? Tinha um lugar com pessoas com as quais poderiam contar. Pessoas que nunca a decepcionariam e nem diriam que ela estava alta de crack. Saiu do estabelecimento e foi andando até o ponto de ônibus.

Apesar do clima um tanto frio e molhado as ruas estavam cheias de pessoas olhando lojinhas e mercadinhos. O Bronx parecia cada vez menor e com muito mais diversidade com a chegada de novos imigrantes de todos os lugares. Pessoas atrás de uma vida melhor, atraídas pelo bom e velho Sonho Americano, que nada mais era do que uma ilusão para muitos.

O ônibus parou no ponto. Estava vazio, então ela pôde escolher em que lugar sentar à vontade.

Instintivamente enfiou a mão no bolso de trás da calça, procurando o celular para ouvir música, mas só achou os fones embolados.

- Puto! – sussurrou em sua língua natal.

O ônibus circulou por mais meia hora até que ela chegasse onde queria, o cemitério pequeno intrincado no meio da selva de pedra, ao lado de uma igreja católica ainda menor.

Todas aquelas lápides simples e gastas lembraram-na de como a vida era curta e de como passou por uma situação perigosa de uma forma inconsequente que poderia ter acabado numa tragédia.

Não precisou andar muito para achar as lápides de seus pais, lado a lado. Marta e Jose Alvarez. Engoliu seco. Mesmo já tendo passado doze anos da morte do pai e nove da mãe aquilo ainda incomodava como um machucado aberto. Sentiu a dor característica de lágrimas que subiam sem serem chamadas e ameaçavam rolar. Tocou uma das cruzes de concreto com cuidado, como se tivesse medo de derrubá-la.

Predador (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora