Capítulo 3 - Olhos de Tempestade

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    Rosa queria soltar um grito, mas o pavor tornou-a congelada. Após uns segundos de total catatônia ela finalmente recobrou consciência da situação: O CARA PRECISAVA DE AJUDA.
Lembrou-se de que nos filmes e séries sempre faziam pressão nos ferimentos, sem pensar empurrou as palmas das mãos com força sobre o buraco que ele tinha na barriga, fazendo sangue ejetar em sua roupa.
- Ahhhh cacete!!!! – a voz dele saiu vigorosa.
- Ahhh!! Desculpa!! – ela pronunciou com uma voz mais fina do que pretendia, apavorada olhando a sua volta em busca do celular.
- Não chama nada, já disse...Me ajuda a levantar. – Foi quase uma ordem.
Esse cara tá falando sério? Ele quer LEVANTAR? Não quer socorro? Só pode ser um traficante, isso é roubada!
Rosa pensou muito em poucos segundos. Pensou em largar ele ali e fingir que nada havia acontecido, pensou em chamar o Chuck, pensou em chamar a polícia, pensou em chutar ele para desmaia-lo e sair correndo. Nenhuma das ideias parecia boa.
E levar um cara prestes a morrer para dentro de um bar onde ela estava sozinha era a pior ideia de todas, mas foi justamente o que ela fez. Se ele queria morrer que pelo menos não fosse na chuva, como se não fosse nada! Subitamente lembrou-se de seu pai, enfartando no meio da rua, exausto de tanto trabalhar...O mundo não era justo com quem mais precisava de justiça, mas ela era diferente.
Agarrou o cara por baixo dos dois braços e levou-o pra dentro assim, como se fosse um saco de batatas, deixando o chão recém esfregado do bar coberto de sangue e lama.
Largou ele estirado por um momento enquanto correu até o beco, olhou para os dois lados, certificando-se de sabe-se lá o que e trancou a porta bem trancada.
Em desespero ela pulou por cima do balcão e procurou nas prateleiras de baixo o kit de primeiros socorros que Chuck mantinha ali. Mas aquilo servia somente para ferimentos superficiais e ela também não fazia ideia do que fazer! Tinha vontade de somente enfiar um monte de algodão e gaze dentro daquele buraco e torcer para que fechasse sozinho. Ainda estava abaixada quando ouviu a voz do homem:
- Me dá algo pra beber. Se vou morrer...que não seja sóbrio!
Por um momento Rosa teve vontade de rir, mas repreendeu-se silenciosamente por rir de um quase morto. Agarrou a garrafa do licor mais forte que existia no bar e correu para junto do cara, quase escorregando em uma poça de água e sangue no processo.
Ajoelhou-se ao lado dele, lhe ergueu a cabeça e despejou o líquido âmbar dentro dos lábios pálidos, que tremiam compulsivamente.
Ele bebeu uns cinco ou seis goles rápidos, o que já seria motivo para estranhamento mesmo se ele já não estivesse com o pé na cova. Rosa olhou-o bem dentro de seus olhos.
Tinham a mesma cor da bebida que ele sorvia avidamente. Um tom de mel amarelado, bem claro como a lava incandescente de um vulcão que vira num especial da Discovery certa vez. Aqueles olhos tão exóticos e distintos poderiam prender qualquer pessoa a eles, pois eram belos e misteriosos...
A meia luz Rosa observou que as pupilas diminuíam, como se ele focalizasse algo. Numa fração de segundo a beleza selvagem daquele olhar acendeu um alerta de perigo que percorria toda sua espinha. Ela não teve nem ao menos tempo de correr, virou-se instintivamente ficando de quatro no chão para se levantar, mas foi pega de surpresa, sentindo que seu pescoço era perfurado como que por duas agulhas bem grossas. Uma forte de espalhou por todo seu colo, tendo origem na jugular.

    Ele estava ao lado dela, ajoelhado e mordendo o lado oposto de seu pescoço, debruçado por cima de suas costas. Com uma das mãos lhe segurava o queixo, sem fazer pressão alguma, apenas apoiando.
A dor excruciante foi lentamente sendo substituída por uma sensação de relaxamento, letargia. Rosa podia sentir os lábios gelados dele sugando sua pele com força, fazendo pressão para engolir seu sangue. Uma suave onda de calor brotava daquele ponto e percorria todo caminho para o centro de suas coxas, onde aquele tal calor fulgurava como as chamas de um incêndio. Ela sentiu-se umedecer, molhar e excitar de uma forma bizarra, principalmente quando a mão que segurava-lhe o queixo subiu em direção a sua boca, introduzindo ali um longo dedo médio.
A mente dela passeava num mar de sensações instigantes enquanto seu corpo entrava num estado de quase orgasmo. Foi com surpresa que pegou-se sentindo vontade de sugar o dedo intruso languidamente, mas contentou-se em acaricia-lo com a ponta da língua salivante.
Quando estava pronta para gemer alto ou desmaiar, não sabia ao certo, percebeu que a mordida afrouxava e no local onde dentes lhe perfuravam o estranho depositou um extensa lambida, certificando-se de que não deixava nada se perder.
Viu-o cair sentado no chão a seu lado, com uma expressão de satisfação pura enquanto ela mesma desabava de bruços, exausta como se houvesse acabado de fazer o melhor sexo de sua vida.
Ainda confusa, Rosa sentiu sua visão tornar-se turva e um cansaço enorme a consumir. Mas não antes de vê-lo se aproximar para toma-la nos braços.
- Não se preocupe, pequena – ele disse, com um sotaque pesado – Uma vida pela outra...

    Rosa abriu os olhos e sentou-se assustada, apalpando a região do pescoço. Não sentiu nada.
Olhou-se e reparou que estava sem a calça e com a mesma blusa da qual se lembrava. Lembrança! Levantou-se ainda cambaleante e correu para o banheiro, observando-se atentamente no espelho.
Estava pálida e tinha olheiras, mas seu pescoço...Não possuía ferida alguma ali! Nem mesmo um inchaço ou marca que justificasse uma mordida. Teria sido um tudo um sonho?
Se houvesse sido um sonho, então seu celular ainda estaria intacto, pois por mais bêbada que pudesse estar, nunca se esqueceria do telefone comprado em prestações suadas.
Nunca pensou que sorriria triunfante ao pensar uma coisa dessas, mas seu celular tinha que estar jogado na poça do beco ao lado do bar!


Predador (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora