Capítulo 2 - Um Corpo que Cai

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    Durante o resto da tarde Rosa concentrou-se em suas tarefas domésticas. Mesmo não tendo uma casa propriamente dita, ainda precisava lavar, passar e arrumar...Principalmente o bar que abriria mais cedo aquela noite para o Happy Hour de quinta.
Normalmente as quintas feiras não eram muito badaladas em bares, as pessoas ainda teriam mais um dia de trabalho longo pela frente e dor de cabeça não combinava muito com produtividade. Então Chuck fazia as quintas em particular mais atrativas, com grandes descontos e isso fazia com que o bar ficasse bem cheio, mesmo com a chuva que caíra por volta das cinco da tarde.
Chuck era um cara de meia idade, cabelos pretos e longos que viviam sempre amarrados e uma vasta barba bem cuidada. A maioria de suas camisas tinha as mangas cortadas, exibindo duas muitas tatuagens nos braços. O homem era enorme, uma montanha de músculos e gordura que impunha respeito em qualquer engraçadinho que tentasse arranjar uma briga ou dar em cima dela, sendo inconveniente.
Tão logo Rosa terminou os estudos, saiu da casa da vizinha que terminara de lhe criar. Era uma senhorinha muito bondosa, Agnes. Mas ela não queria causar mais problemas do que certamente já havia causado, pois sempre fora uma garota nada convencional e tinha o poder de atrair confusão por onde quer que fosse deixando a sra. Agnes de cabelos em pé. Sendo assim, mesmo contra a vontade da velha mexicana a garota saiu com a cara e a coragem e tudo o que encontrara, sem experiência ou faculdade, fora uma vaga para varrer o chão do bar, depois que todos saíam. Isso até completar vinte e um, idade o suficiente para lidar com bebidas, sendo promovida e bartender, um luxo de emprego!

    Chuck entrou retirando sua capa de chuva amarela e sacudindo-a ainda para fora. Tudo estava da forma como ele gostava: Mesas brilhando, chão limpinho, aromatizador de pinheiros, música para atrair os clientes e Rosa quietinha e totalmente sóbria atrás do balcão, passando pano sobre a superfície lustrosa de madeira avermelhada. O homem suspirou fundo e aproximou-se lentamente.
- Bom saber que você ainda está viva, apesar do quanto bebeu ontem, Rosie...
- Serie preciso muito mais do que apenas algumas doses para me abalar, Chuck. Ah, e por falar nisso liguei para o fornecedor de soda. Ele compreendeu e disse que esperará pelo pagamento.

Chuck franziu as sobrancelhas. A Garota que sempre estava mal humorada agora parecia totalmente diferente. E quando Rosie estava de bom humor quase sempre significava que algo de ruim aconteceria.
- Tem certeza de que está tudo bem? Não quer conversar?
Ele SEMPRE perguntava isso quando sentia que havia algo de errado. A jovem tinha um comportamento auto destrutivo que não o agradava e mantê-la perto era uma das maneiras de evitar que ela de matasse. Chuck só tinha filhos e de certa forma sentia que a garota era uma filha adotada. Apesar disso tudo ela nunca se abria, geralmente fazia seu trabalho de maneira quieta e soturna, guardando seus fantasmas todos para si.
- Sim, tudo bem. – ela fez uma cara engraçada, apertando os lábios, curiosa – Por que a pergunta?
O homem abriu a portinha do balcão e entrou, fingindo desinteresse.
- Nada. Só acho seu bom humor...assustador.
Ela finalmente parou de esfregar sujeiras imaginárias e olhou para ele, com uma das mãos apoiada na cintura.
- Eu tive uma conversa esclarecedora com a Megan hoje à tarde. Aparentemente ela continua preocupada que eu trabalhe em um bar.
Chuck suspirou fundo mais uma vez.
- Sabe Rosie, talvez ela tenha razão. Eu não digo sobre trabalhar num bar mas, todos sabemos que a forma com a qual se comporta...como se nada importasse, isso é sinal de alguma coisa. Talvez se você se abrisse mais ou se procurasse ajuda...
- Aaaaa chega desse assunto, tá bem? Eu não estou doente, estou bem!
Ele sorriu, maroto.
- Então quem sabe você devesse tentar ser mais como ela. Megan é uma menina bondosa, responsável...
- De jeito nenhum! – ela fingiu tremer o corpo todo, imitando asco – Além do mais, se eu fosse mais como a Megan não estaria aqui com você. E tenho certeza de que você não aguentaria um segundo longe de mim!
- Com certeza, garota. Pode acreditar que sim!

    A noite transcorreu como sempre. Bar bem cheio, muitas conversas, pessoas diferentes se unindo em um propósito comum: Se divertirem. Algumas cantadas, bilhetinhos de bêbados apaixonados...
Lá pela meia noite Chuck avisou a todos que o bar fecharia. Limparam juntos toda a bagunça deixada pelos clientes. O velho disse que colocaria o lixo para fora, mas Rosa pediu para que ele fosse logo embora, pois o sereno estava frio e só aumentaria. Ela mesma cuidaria do lixo.
Assim que o amigo se foi ela trancou a porta da frente e apagou as luzes, deixando apenas os pequenos letreiros de neon coloridos acesos, fechou as persianas das janelas grande de vidro, vestiu a jaqueta e agarrou os dois enormes sacos pretos, puxando-os em direção a saída dos fundos.
O beco atrás do bar era escuro e mal iluminado e vez ou outra algum morador de rua ficava ali, mas sabiam quem ela era e além de tudo eram apenas boas pessoas que fizeram escolhas erradas na vida. Com o frio que estava fazendo Rosa duvidava que veria alguém ali.
Puxou um dos sacos pela boca amarrada e com um pouco de dificuldade jogou-o dentro da lata de lixo gigante e enferrujada, que já estava praticamente abarrotada.
O ar estava congelante e fumaça saía de sua boca a cada respirada ofegante. Estava começando a erguer o segundo saco, quando ouviu vindo do fundo do beco um baque surdo, como se alguma coisa pesada houvesse sido jogada de uma das janelas dos prédios que cercavam os arredores. No mesmo instante o medo gelou sua espinha.
Pensou em correr, pensou em gritar, pensou em clamar por sua vida...Pensou também que alguém poderia ter caído, e que nesse caso talvez ainda estivesse vivo e precisaria de uma ambulância.
Antes de mais nada entrou correndo no bar e pegou o taco de baseball que ficava debaixo do balcão. Ergueu a arma e, caminhando lentamente foi checar atrás do montante de sacos de lixo que se acumulavam no fundo do beco.
A cada passo que dava, seu coração acelerava. Estava morta de medo, porém preparada para golpear qualquer criatura possivelmente tarada que se escondesse nas sombras, procurando abusar dela.
Foi quando viu algo de mexer e ouviu um gemido sôfrego, como se fossem os últimos minutos de alguém. Numa atitude que só poderia ser classificada como imbecil Rosa correu em direção a sombra que agora estava encostada na parede fria de tijolos vermelhos. Era um homem!
Na verdade, um rapaz. Usava uma calça cargo preta, coturno, um casaco de moletom cinca escuro com capuz. O zíper aberto exibia uma camiseta branca empapada de sangue na parte esquerda do abdômen. ELE FOI ESFAQUEADO?!
Rosa abaixou-se e se aproximou, afim de examinar o cara, ele não respirava. O ferimento era estranho. Uma perfuração, mas não parecia uma facada, disso Rosa tinha certeza. Já havia visto um esfaqueado antes na porta de outro bar e por mais que um bêbado houvesse desferido o golpe naquela vez, era muito mais limpo. Esta ferida era estranha irregular...
De qualquer forma precisava ligar para a polícia. Ferimentos e mortes eram recorrentes em Nove Iorque e aquela área em particular cheirava a violência.
Enfiou a mão no bolso de trás da calça e pegou o celular. Digitou 911 e colocou o aparelho no ouvido. Após apenas um toque a atendente se pronunciou.
- 911 emergência. Em que posso ajudar?
Assim que Rosa abriu os lábios para falar que TINHA UM CARA MORTO NOS FUNDOS DE SEU BAR, o braço do defunto ergueu-se e sua mão lhe agarrou no pulso, com uma força deliberadamente grande para um cara que acabara de morrer.
- Não...não chame a polícia...
O homem gemeu enquanto Rosa congelava de medo e seu celular voava longe, direto numa poça d’água.
PUTA MERDA! O cara estava vivo!


Predador (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora