Capitulo 1: Destino Incerto

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Meus pés afundavam no chão arenoso conforme eu caminhava. O suor molhava meu rosto, devido ao calor da exposição ao sol escaldante, que nos castigava durante toda a viagem. Ajudaria se eu tirasse a bandana branca, que prendia meus cabelos vermelhos, da minha cabeça. Mas eu não ia fazer isso. Eu não a tirei nem uma vez, desde que saí de lá, e não ia fazer isso agora. Eu não me importo com o calor, eu aprendi aqui que eu só devo me preocupar em caminhar. Na verdade, era a única coisa que eu tinha feito o dia inteiro, ou melhor a semana inteira: caminhar e suar. Mas eu não reclamava, e apesar das dezenas de outras pessoas, que andavam ao meu lado, provavelmente estarem sentindo o mesmo que eu, também não falavam nada. No maximo eu ouvia algum burburinho baixo, nada que possa ser considerado uma conversa. Não que eu quisesse conversar com alguém. Era isso que eu precisava no momento; só caminhar. Sem saber pra onde. Só ir e sumir. Esquecer tudo que...
" Eu não aguento mais! Hoje não paramos uma vez sequer pra descansar. Será que ele não entende que somos apenas humanos?! Que precisamos de descanso?!" alguém falou perto de mim.
" Fala baixo, Gani! Quer que ele te ouça? Cala a boca e continua andando, já está escurecendo, e logo vamos acampar, então aguenta mais um pouco." outra pessoa falou.
Eu já os tinha visto antes, eram amigos, talvez irmãos. A verdade é que eu não tinha interesse de saber. Desde que eu fui encontrado, não fiz questão de me enturmar com os outros andarilhos, nem quis conhecer ninguém. Mas já tinha percebido que o Gani era um dos poucos que se queixavam, ele era do tipo que nunca está satisfeito.
" Por que?! O que eu fiz pra merecer isso? Eu era apenas um pastor que cuidava das minhas ovelhas. Eu não merecia estar nesse inferno!" Gani choramingava
" Ei, deixa de ser um bebê chorão! Não cria problemas pra gente, cara. O Set vai..."
" Sabe de uma coisa?! Eu estou cansado disso, eu quero que o Set vá para as Profundezas!"
Todos pararam, e o clima mudou de repente. Observáva-mos a cena apreensivos. O amigo/irmão de Gani, soltou a bagagem, que carregava, no chão e o segurou pela gola da camisa de pano, e o olhou de cima.
" Seu idiota! Será que alguma vez na vida não pode agir como um homem? Acha que eu também não estou sofrendo? Todos aqui perderam tudo que tinham também, e olha pra todos. Ninguém está reclamando. Se ainda estamos aqui é por um motivo, então cala essa sua boca."
Gani gritou, e apesar de ser mais baixo que o outro o empurrou com força, e esse caiu sentado.
" Pois eu preferia ter morrido lá! sabe o que parecemos?! Ovelhas! Ovelhas sendo levadas sem saber pra onde, por um louco!"
Ouvi alguns comentários como: " ele enlouqueceu?" e " ele não disse isso!"
" Você me acha um louco?" ouvi a voz aguda e rasgada, como a de um velho fumante. E ele apareceu entre a multidão que havia se concentrado entre os dois baderneiros.
"Set!" gemeu o cara mais alto ainda sentado.
" Hum... então pelo visto você não está gostando da nossa viagem, não é?" Set era um cara extremamente magro, com a pele morena de sol. Usava apenas uma calça suja. Na mão um cajado de madeira que sempre o acompanhava. Seu cabelo parecia que nunca havia sido penteado e seus dentes nunca escovados. Ele quase nunca falava, mas quando resolvia assim fazer, agia como um louco, por isso todos tinham um certo medo dele. Ele sentia prazer em castigar os "baderneiros", como ele chamava aqueles que ousassem tirar a sua paz com "besteiras" do tipo; "to cansado", " tô com sede" ou "tá tão quente".
" Que viagem é essa? Apenas diga pra onde vamos?" Gani insistiu
" Que diferença faz? Vocês perderam tudo. Não têm pra onde ir. Vocês não tem opção a não ser me seguir."
" Você é cruel! Eu sabia! Você trabalha pra o Sagukom, não é?! Está nos levando pra morte. Só pode ser. Sobrevivemos a tudo apenas pra servir de diversão àquele monstro. Não percebe, Ariot?"
" Isso é verdade?" Ariot, que já tinha se levantado, pareceu ter levado a sério.
E ele não foi o único. Todos ficaram agitados.
" Ei, ei pirralho. Não faça os outros acreditarem nessa besteira." Set percebeu a agitação
" Eu tenho certeza. Escutem todos! Se nos unirmos, poderemos nos livrar dele, e então procuraremos algum lugar pra..."
"Ha-ha-ha" Set gargalhou" Olhe ao seu redor, moleque. O que você vê?"
" Nada. Aqui não tem nada, a não ser areia. É um inferno!"
" Exatamente. Acha que é moleza? Andar por aí sem saber pra onde vai é o mesmo que escolher uma morte lenta e angustiante. Você não faz ideia dos perigos que corremos só de estar aqui. Se não fosse por mim, aí sim já estariam todos mortos ou capturados pelo Mago Vermelho."
Set tinha razão. O deserto era o lugar mais perigoso que poderíamos estar. Durante toda a viagem, nos deparamos com vários monstros e criaturas, que faziam parte das forças malignas do Mago Vermelho; monstros gigantes com vários braços, ou monstros voadores, etc. Tinham formas e tamanhos variados. Normalmente, um encontro assim seria um massacre, mas graças a Set isso não aconteceu. Set não era um homem comum. Ele era um Portador de Amuleto, ou seja, ele tinha poderes. O Cajado que ele usava era um Amuleto; o "Cajado de Meka". Que lhe dava poderes que nos faziam ficar imperceptíveis. Ou seja, os monstros não podiam nos ver, nos ouvir, nem sentir nosso cheiro, mas podiam nos sentir se nos tocassem. Se não fosse por isso, já estaríamos todos mortos.
" De toda forma, eu concordo com ele. Temos o direito de saber pra onde está nos levando, ou porque foi atrás da gente." Dessa vez foi uma mulher que se manifestou." Eu não acredito que vai nos matar, mas o moleque me fez pensar e ele tem razão. Parecemos ovelhas guiadas até o comércio pra serem vendidas. É isso? Vai nos vender?" aos pés da mulher, um menininho olhava assustado. Supus ser seu filho.
"Será que não dei motivos suficientes pra confiarem em mim?" foi uma piada.
Ninguém respondeu e Set fez cara de ofendido.
" Eu não posso contar, tá bom? Assim que chegarem, saberão de tudo. Mas pra isso precisamos andar. Se estivéssemos caminhando agora, em vez de estar choramingando, iria adiantar bastante."
Set se aproximou da mulher, e olhou de bem perto seus olhos assustados. Depois baixou os olhos pro menino, que com medo, se refugiou atrás da mãe. Eu não o culpo. Set não é uma pessoa agradável, tampouco bonito ou cheiroso. Depois de alguns momentos angustiantes, ele enfim fez algo que surprendeu; tirou uma fruta do bolso e ofereceu ao garoto. O menino hesitou:
" Está com fome né? Toma. Pode comer, é bom." O menino depois de um tempo tomou coragem e a pegou, seus olhos brilharam. E os meus também.
Aquela cena fez lágrimas discretas caírem dos meus olhos, e um sentimento tomou conta de mim. Era como se eu tivesse batido em um ferida que nem começara a cicatrizar. Eu sabia que fruta era aquela: um rari.
"... ela também é chamada de fruta dos sonhos, pode comer." Set até tentou passar a mão na cabeça do menino, mas esse recuou na defensiva, e isso parece ter frustrado ele, porque subitamente se lembrou de uma coisa:
" Você!" apontou pra Gani " além de confusão e de tentar colocar os outros contra mim, você atrasou nossa viagem."
Gani ficou calado.
" hum..." Set fez cara de pensativo "deixa eu ver o que vou fazer com vocês... "
" Vocês?! Como assim "vocês" no plural? " Gani perguntou
" Claro, você e o outro" apontou pra Ariot" também não gosto de gente certinha demais"
" O quê? Mas eu estava só tentando..."
"Calado! Preciso pensar.."

Os Amuletos do Mago Livro 1: O Último MagoOnde histórias criam vida. Descubra agora