RAINHA MIRIAN
Castelo Goldenstone
- Vão me desculpar pela demora, senhores... – falou a Rainha Mirian, adentrando a Sala das Serpentes. O ar estava abafado dentro da sala e a Corte da Prata se dispunha nas cadeiras de madeira nobre vindas do Oriente. A Rainha agora vestia um vestido de seda azul, os cabelos soltos desciam sob os ombros e uma simplória coroa dourada pousava em sua cabeça.
Lorde Phirius, um homem alto e esguio, vestindo trajes verdes estava do lado esquerdo da mesa. Ele ergueu a voz rouca e com sotaque estrangeiro para falar:
- Tomei o navio mais rápido até chegar a Verytian, Vossa Lady. As tempestades que peguei em Porth Lae me atrasaram, se não fosse por isso, estaria aqui anteontem mesmo. – explicou-se, tomando um gole de vinho.
- Não reclamo de seu atraso, Lorde Phirius, pelo contrário. Surpreende-me não ter chegado mais tarde. – disse a Rainha.
- As tempestades em Porth Lae não atrapalharam minha viagem, Vossa Lady, mas soube que algumas vilas tiveram prejuízos e algumas plantações foram por água abaixo. – comentou Lady Gardport, no lado direito da mesa, em suas roupas excêntricas e coloridas, seus cabelos escuros presos á um coque estrangeiro e diferente.
- Isto é assunto para outra hora, Lady Gardport, temo que temos alguns problemas maiores no Reino. – disse Mirian, pondo fim no assunto. Todos na sala calaram-se, temendo a postura da Rainha.
A Corte de Prata era um grupo de 7 pessoas de confiança da coroa que funcionavam como um "Conselho". Lorde Phirius, Lady Gardport, Lorde Sunsuty, Lorde Holletrev, Lady Raoke, Lorde Umecars e Lorde Laos formavam a Corte de Prata da Coroa de Zhaole. Eram pessoas de todos os cantos do mundo, todas da nobreza, porém, não moravam no Castelo Goldenstone. Também não eram e nem tinham ligações com as famílias vassalas, por isso eram pessoas de confiança, pois não tinham nada a ganhar nem nada a perder. Recebiam títulos de Lorde e Lady por cortesia e por regras de ética, mas a maioria deles não tinha terras ou posses muito grandes.
- Como foi informado a vocês, se bem comando meus funcionários, seu Rei Hener morreu há dois dias, vítima de uma forte doença da qual os sacerdotes não puderam defende-lo. – informou-lhes a Rainha. Muitos mudaram a expressão para mostrar suas condolências a Rainha Viúva e sua preocupação – Então, temos um assunto pendente de extrema urgência para discutirmos... Lorde Laos, como Mestre da Legislação, o que dizem as Leis Zhaolitas sobre um Rei morto sem herdeiros?
O homem, Lorde Laos, aprumou-se para falar. Era um homem baixo, velho, de pouca musculatura e que se vestia elegantemente. Por fim, disse:
- As Leis Antigas são bem claras, Vossa Lady, o Trono do Reino deve ser passado para uma família vassala, de escolha da Corte de Prata e da Rainha, se esta última existir. – explicou, em tom claro e voz fina.
- Bem... e a quem cabe o poder sobre o Reino enquanto os vassalos não são escolhidos? – perguntou Mirian, franzindo a testa. Sua pergunta surpreendeu a todos, até mesmo Lorde Laos.
- Bem... não temos respostas claras para sua pergunta, Vossa Lady, mas acho que o poder cabe a Rainha Viúva. – disse, num tom de dúvida e incerteza.
- Certamente, Vossa Lady, é uma pergunta muito interessante. Por que a fizera? – questionou Lady Raoke, arrastando seus dedos longos e enrugados pela mesa.
- Não tenho certeza se posso confiar-lhe a resposta, Lady Raoke. Mas logo, logo saberá. – respondeu Mirian, afugentando as dúvidas de Raoke, a fofoqueira da Corte de Prata. A Rainha confiava em todos ali, mas nela não. Era uma mulher velha, vinda de terras distantes que ganhara a vida por sua inteligência e astúcia e conhecida por ser portadora de segredos da Corte e da própria família Real.
Mirian não queria que seus planos fossem atrapalhados pelos membros da Corte. O que ela tinha em mente poderia ser ousado, até mesmo errado. Mas confidenciou o segredo para si e continuou a reunião.
Foram 40 minutos de entediante debate, briga e discussão. O foco principal era a crise e, principalmente, quem assumiria o trono. Uns queriam os Jeahet de Botolyn para Reis, outros já pensavam nos Erforios de Desaryan, e assim prosseguiu-se a reunião.
- ... descartemos a possibilidade de um oriental tomar o trono! São nosso povo, mas não acho que isso agradaria os vassalos do Ocidente com seus grandes castelos e exércitos, prontos para se rebelarem! – gritou Lorde Umecars, de um lado da mesa, enquanto Lady Raoke o dava empurrões enquanto falava insultos em línguas estrangeiras.
- Sem dúvida que os Asckay são os melhores para o Trono! São uma família rica, bem estruturada e respeitada em todo o Reino! – retrucou Lorde Sunsuty, do outro lado da mesa, gesticulando de maneira exagerada.
Estava um total caos na mesa. E a Rainha estava entre tudo, apenas observando os argumentos dos membros da Corte, ou pelo menos tentando. Eram ao todo, 6 famílias vassalas. Elas cuidavam de certas partes do Reino enquanto o Rei apenas tratava de administrar a capital e a ordem geral. Dentre as 6 famílias, 4 ficavam no Continente e as outras 2 em outro. Ninguém queria que as famílias do outro continente assumissem o controle. Eles tinham costumes e cultura diferentes das do povo do Continente onde ficava a Capital. Isso trazia mais problemas para a Rainha. Mas a ideia dela fugia a todos os princípios da época e ela tinha receio de conta-la ou pôr-a em prática. Poderia causar ainda mais baderna.
Por fim, ela ergueu as duas mãos e as bateu contra a mesa. Ela sentiu os ossos se chocaram com a madeira e provocarem uma profunda dor, mas o silêncio provocado fora bom o suficiente para fazê-la esquecer.
- Lordes e Ladys, não me lembrava de tal comportamento enquanto o reinado de meu marido... –repreendeu a Rainha, numa voz calma e firme – Recordo-me de pessoas calmas, cultas e, acima de tudo, educadas.
Sua fala calou todos e os envergonhou. Lorde Sunsuty pôs-se a fechar os olhos e a ficar de cabeça baixa.
- Por hoje é só... Estão liberados, mas fiquem pela cidade. Temos muitos assuntos a tratar e clima não está nada agradável para tal. Podem ir... – e os Lordes fizeram reverências e se retiraram, deixando a Rainha sozinha na mesa.
O ambiente cheirava a suor e a chuva. As tempestades de Porth Lae que tanto falavam estavam avançando para a capital, disso ela sabia.
A rainha apenas saiu quando os criados chegaram para limpar. Ela se levantou, absorta em pensamentos e se dirigiu ao seu quarto.
Algumas horas mais tarde, ela agora vestia as sedas de dormir e Meryte penteava-lhe os cabelos negros. Ela confiava em Meryte. Era sua confidente, sua amiga.
- Meryte... seria muito absurdo... – ela temia em contar a Meryte. Mas mesmo assim, soltou: - Seria muito absurdo a viúva do Rei assumir o trono? Tomar o poder como Rainha?
Meryte pareceu chocada. Até soltou o pente e quase o derrubou-o.
- Vossa Lady... bem... eu não sou ensinada nessas artes, mas... – voltou a pentear os cabelos da Rainha – Acho que seria inusitado e novo. Mas persisto em dizer que minha opinião de nada vale.
- Tenho certeza que vale, Meryte, tenho certeza que de alguma coisa vale...
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O Conto da Coroa sem Dono - [DRAMA MEDIEVAL]
FantasyA situação não está nada favorável aos Senhores Vassalos leais A Coroa de Verytian. Seu Rei e Suserano morre tragicamente, deixando a coroa sem herdeiros. Por lei, o título de Rei de Zhaole deverá seguir para uma família vassala, mas aparentemente a...