Lilian: parte 3

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- Horta?

- Sim, eu sei plantar, ajudava minha mãe com isso desde muito nova.

- Faça uma então.

Ele não parecia se importar muito com o que eu dizia. Apenas se virou e ficou procurando sei lá o que em um livro grosso e que parecia pesado de medicina.

Preparei o jantar rapidamente, carne com legumes e o chamei para a mesa. Ele veio e se sentou ainda com o cabelo bagunçado como se tivesse passado os dedos por ele várias vezes.

Estavámos comendo em silêncio enquanto ele de vez em quando me olhava e voltava a comer e bebia o suco de laranja. Será que ele tinha odiado a minha comida? Era só o que me faltava! Ora, faça você mesmo então.

Mas não, ele fechou os olhos em uma das garfadas parecendo saborear.

- Está muito boa mesmo. Olhando por esse lado, meu pai fez um bom negócio.

- Está querendo dizer o que ?

- Veja, você não era uma das mulheres de classe alta, e também não tinha concorrência, seus pais tem outras filhas e tem pouco prestígio na alta sociedade.

- Então por que seu pai veio até a casa dos meus pais se não estou a sua altura?

- A senhorita era a que tinha família que aceitaria mais rápido as condições do velho Hall. Foi fácil, eu quis dizer.

- Você me enoja!

Disse me levantando mas me desequilibrei e segurei na mesa voltando a postura anterior.

-Está brava por que? Se é a verdade.

- Eu juro por tudo que é mais sagrado que eu não queria me casar contigo. Não precisa ficar me humilhando, não sou uma qualquer como essas que você dorme em camas sujas.

E saí dali indo direto para o quarto batendo a porta fazendo estremecer a mesma. Eu odiava Nicholas Hall, Por que ele era assim? Por que tinha que ser assim?

Ele era arrogante, mesquinho, mal educado, convencido e cafajeste. Me deitei na cama desejando adormecer rapidamente para que acordasse amanhã e não o visse mais ali.

2 meses depois...

Trocavámos poucas palavras no dia a dia, ele ia trabalhar, voltava logo jantava e começava a ler os livros pesados e velhos. Ao decorrer desses dias apenas não voltou para casa duas vezes, tinha dormido fora. Eu não sei se era com alguma mulher ou se era para ficar em acompanhamento de algum paciente.

Discutíamos às vezes e outras ele chegava mais tranquilo, naquele dia ele tinha acordado cedo e tinha me perguntado as coisas que faltavam para a casa e partido para comprar os mantimentos dos quinze dias de inverno pesado que viriam.

E hoje era sábado e nos sábados e domingos ele não trabalhava. Quando acordei fui direto me trocando para por a mão na massa com as coisas da horta novamente.

Fazia sol e calor por enquanto, os pingos de suor escorriam da minha face para o vestido que usava mais amarrotado. Estava com o lenço azul na cabeça e a enxada para preparar a terra, passei a mão sobre a testa quando ouvi o cavalo se aproximar. Era ele, abriu a porta de trás e me chamou para ver o que tinha trazido

- Acha que é o suficiente para passarmos por esse inverno que está chegando?

- Sim, serão em média de quinze dias. Acho que é o suficiente.

- Fui ao comércio da Miryan e trouxe esses tecidos para você, espero que saiba costurar.

Comprou tecidos de vestidos para mim? É claro que eu sabia costurar, era eu quem fazia a maioria dos meus vestidos e os das minhas irmãs.

Ele caminhou em direção ao sofá e pegou o embrulho grande com os tecidos.

- Muito obrigada.

Disse quando ele me entregou e fui logo abrindo para ver os tecidos, que eram muito bonitos. Bem, ele tinha bom gosto pois eram as cores que eu gostava e costumava usar.

Eu ainda estava suja, então peguei o embrulho e caminhei para o quarto. Voltei para a cozinha o ajudando a guardar os mantimentos que estavam na mesa.

- O senhor Antony esteve aqui, ele veio querendo conversar contigo.

- Não disse o que queria? Veio na hora que eu sai?

- Sim, disse que a esposa está grávida e perguntou se você pudesse passar lá quando ela estivesse dando a luz.

- Venha cá.

Eu não entendi, mas fui atrás dele que seguiu para o quarto e abriu uma das gavetas da cômoda tirando de lá uma faca afiada.

- Quando aparecer alguém desconhecido batendo à porta, sempre corra para o quarto antes e veja da janela quem é, e se precisar se defender pegue a faca que vai estar nessa segunda gaveta.

- É tão perigoso assim?

- Moramos distante de outras casas Lilian, não seja ingênua.

- Certo, mas você vai a casa do senhor Antony? A esposa dele precisa, já que a parteira mais próxima está idosa demais.

- Sim. Mas fique em alerta, entendeu?

- Tá...

Voltou para a sala e eu voltei também para a horta, molhando algumas que já cresciam.

- O que vai fazer quando chegar o inverno?

Eu não tinha pensado nisso, não tinha um plano mas daria um jeito de colher antes do próximo frio que viria.

- Darei um jeito.

- Elas vão morrer antes mesmo da sua colheita, Lilian.

Terminei o que estava fazendo e limpei as minhas mãos no vestido, arranquei o lenço da cabeça e sorri para ele que estava com o braço escorado pra frente na madeira assistindo.

- Ora, Nicholas.. elas vão sobreviver sim e você mesmo vai me ajudar a colher.

- Se você está dizendo...

Segui rumo para a casa e ele trancou a porta de trás, fui tomar um banho e logo me troquei com um vestido azul claro, me sentei de frente a penteadeira arrumando o cabelo que decidi deixá-lo solto com uma fita vermelha de cetim.

- Lilian, amanhã temos um compromisso para irmos.

Falou alto da sala, enquanto eu me movia para ir a cozinha.

- Qual tipo de compromisso?

- O xerife da cidade foi nos convidar pessoalmenre para a festa de aniversário da cidade.

- Essas festas são sempre chatas.

- Para a senhorita sempre será chatas já que não pode aproveitá-las. Não se diverte e nem dança.

- Ora, Nicholas... você sabe muito bem porque eu não posso...

Disse meio magoada como a forma que ele tinha falado.

- Lilian, me escute.. e principalmente olhe para mim quando eu estiver falando contigo.

O encarei sentindo raiva e ele puxou a manga da camisa até os cotovelos. Que eu percebi ser uma mania, toda vez que ele estava nervoso ou irritado.

- Quem foi que disse que não pode dançar?

- As pessoas riem só de eu andar perto delas, imagine tentar dançar... te disse é ridículo fazer algo assim na minha condição.

- Ignore as pessoas, vão sempre arranjar um motivo para falar mesmo.

Ele não estava na minha pele, não sabia como era passar por tudo isso. Tudo o que eu tentava fazer era motivo de piadinha nas rodinhas de rapazes e damas da cidade.

Eu era diferente e sabia disso, era até mesmo raro encontrar alguém que entendesse que eu nasci assim e que ninguém tinha culpa e que eu não era amaldiçoada como muitos pensavam.

Oiii
Espero que tenham gostado, pois estou fazendo esse livro com muito carinho 😘😘
Não esqueçam dos votinhos e dos comentários que eu tanto gosto de ler 😄

Diferente Amor (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora