Capítulo 2

29 5 0
                                    

 Acordei com uma pequena dor na cabeça, causado pelo vinho na noite anterior. As cenas do que aconteceu algumas horas atrás pairava em meus pensamentos, me perturbando a todo instante. Tentei ao máximo esquecer a situação, e decidi deletar o contato de Heitor, cortar um vínculo criado em somente mais de 48 horas. Estava difícil para mim, nada daquilo era rotineiro em minha vida, nem mesmo na vida da minha família. Sacudi os pensamentos e fui me organizar para sair, hoje era exatamente o dia de rever meus pais. Fazia bastante tempo que não nos via, estava ocupado demais com a faculdade e com o projeto da formação de uma ONG, juntamente com alguns amigos do curso de medicina e áreas afins.  A ONG seria uma válvula de escape para que o ocorrido morresse ao passar dos dias, e era exatamente nela que eu iria fazer com que tudo fosse apagado do meu subconsciente. 

 Pus algumas músicas no carro, enquanto se dirigia para a casa dos meus pais. A casa não ficava muito distante do apartamento em que eu residia, dava uns 40 minutos. Finalmente cheguei a casa, eu estava com uma saudade infinita dos meus pais. Os abracei, os beijei. Descarreguei a saudade, foi um conforto para minha alma turbulenta. Não existe nada melhor do que a comodidade da família. Almoçamos e jogamos muita conversa fora. Relatei ao meu pai que conheci um garoto, chamado Guilherme de uma outra turma de medicina, que está na fase de amadurecimento da especialização do curso, que era justamente a cardiologia, e falei do senhor, que poderia o ajudar nesta decisão tão importante, que não seria no imediato, mas logo mais nas férias da faculdade, ele entraria em contato comigo, para um agendamento do encontro. 

 Optei que naquela noite de domingo, não retornaria para o apartamento, iria ficar na casa dos meus pais. Minha mãe percebeu de leve que meu comportamento estava um tanto que estranho.

  — Filho. Está tão pensante nos últimos minutos, o que aconteceu?

  — Mas por que pensante, mãe? 

—  Você estar quieto, seu olhar estar fixo, sua respiração alterada. Eu te conheço Bernardo, sou sua mãe. 

—  Ah mãe, estou calculando as médias da faculdade, não quero ficar na recuperação. É apenas isso mesmo, nada fora do comum. 

 Estava tão nítido assim minha cara de assustado/preocupado? Eu precisava de alguma forma amenizar essa expressão. Decidi conversar com meu pai, é claro que não iria expor aquela situação vivida, iria inventar algo parecido, amenizar o acontecido, queria escutar seu posicionamento em relação ao que eu o relataria. Fui a sua busca, pai se encontrava na varada de casa, olhando a bela noite de lua que se fazia. 

  —  Pai?

—  Estou aqui, filho.

—  Preciso conversar.

—  Se acomode, sou todo ouvidos. 

—   Aconteceu algo que não consigo tirar da minha cabeça.

 No mesmo momento meu pai ergueu sua voz com uma pergunta.

  —  O ocorrido foi aprazível? 

—  Se eu dissesse que não foi, estaria mentindo. 

—  Então por que quer esquecer algo bom? Está com medo? 

—  Eu não sei, eu tenho medo, eu estou com medo.

—  Seja lá qual foi a situação, porém você mesmo confessou que foi algo agradável. Não permita que o medo barre a sua vontade de viver seus desejos e sonhos. E não precisa tomar as suas decisões momentaneamente. 

 Fui dormir com aquelas frases penduradas em minha mente. Não é porque o diferente é assustador, que eu tenho que fugir. Mas mesmo assim resolvi escutar e colocar em prática o que tinha ouvido, ir sobretudo com calma. Despertei um pouco mais cedo, tinha que passar no apartamento, não tinha levado meu jaleco, e precisava dele para a aula de logo mais a tarde. Me despedi dos meus pais e segui viagem. Como eu tinha que realizar dois trajetos, acabei como de costume, me atrasando para a aula. O Heitor sabia onde eu estudava, no meio da conversa no dia que nos conhecemos, falei a faculdade que estudava, e o mesmo relatou que seu filho também estudava na mesma. Quando conheci o Guilherme, tive uma ligeira impressão que conhecia alguém com alguns traços que o seu, mas também não me esforcei para lembrar quem seria. 

 Estacionei o carro  e quão grande foi minha surpresa ao vê Guilherme saindo do carro do Heitor. No mesmo momento parei, não queria que ambos me vissem. Estava claro agora em meus pensamentos os traços de quem era tão parecido com o Heitor. O quão azarado eu estava naquela manhã de segunda-feria, não deu tempo de se esconder, o Gui me avistou e logo elevou a sua voz em meu nome, não deu outra, o Heitor estava entrando dentro do carro quando ouviu seu filho chamar um nome que era tão familiar. Meu pensamento era de fingir não ter escutado, mas eu estava olhando para o Guilherme no momento, não tinha para onde ir. Dei alguns passos até chegar a eles, eu nem sabia qual era a expressão estampada em meu rosto, apenas segui. 

  —  (Gui) Oi Bernardo, tudo bem? Esse aqui é meu pai Heitor. Pai esse aqui é o garoto Ber que lhe falei, o mesmo que irá me ajudar no amadurecimento da minha escolha.

—  Oi Gui. Estou atrasado (risos) mas bem. E contigo? Olá Heitor!

—  (Heitor) Olá Bernardo, é um prazer te conhecer. Não posso deixar de agradecer a disponibilidade de ajudar meu filho. 

 Alguns amigos do Gui também chegaram no estacionamento e logo em seguida ele se despediu e seguiu em direção aos seus amigos, eu fiz o mesmo, segui em direção as salas de aulas. Foi então que ouvi a voz do Heitor.

—  (Heitor) Não foge de mim. Por favor! 

 Continue a seguir. Entrei na sala, e não deu tempo de pensar na frase escutada. Era aula prática, tinha que manter o foco, e foi isso que fiz. A segunda foi bem corrida, e não lembrei do choque que tinha levado a mais cedo. Eu não conseguia acreditar que mesmo querendo fugir do Heitor algo ligava a gente. E eu não podia de formar alguma quebrar a minha palavra com o Guilherme, porque eu sei o quanto é importante para nós, uma informação de alguém especializado na área, sem mencionar que, é uma puta falta de caráter, se comprometer a ajudar alguém, e não cumprir. Eu também não precisava me comportar daquela maneira, tem outras formas de expressar que necessita de tempo, que está confuso, e eu precisava adotar essa postura. 

Lado OpostoOnde histórias criam vida. Descubra agora