Capitulo 5.

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A máscara não me vestia bem, querendo ou não era uma criança usando uma máscara arquitetada para adultos, mas mesmo assim a grande faixa preta feita de algum tecido qualquer atrás dela a fixava bem em meu rosto, era a primeira vez que eu a coloquei, os grandes orifícios a que se destinavam os olhos não inibiam nem um por cento de minha visão, via claramente, visto que eram olhos pequenos e furos grandes. Falta alguma coisa. Vasculhei a memória em busca do que faltava, pensei. Jack tinha uma lâmina.
Embora jack tenha me presenteado a máscara, tinha sido suficientemente cuidasoso pra não me entregar junto uma lâmina, uma de suas espadas de gume curto. Enquanto eu me escondia às sombras de um beco perto dali, me indagava de onde no mundo eu tiraria uma lâmina. Sem ela, não sou um justiceiro de verdade. Foi quando eu tirei a máscara e a guardei de novo na bolsa, e fui à academia de Jack, mesmo que do outro lado da cidade, esperançoso sob a luz avermelhada do alvorecer, Mark tinha se acostumado com que eu voltasse um pouco mais tarde a cada dia, embora não pudesse abusar e nem quisesse.
Decidi por fazer aquela viagem de aquecimento para oque viria depois, me dei por decidido: hoje é o meu dia. Cheguei ágil sobre saltos e piques alternados até a academia de Jack, contemplando a faixada simplista e o estado precário por dentro das vitrines, sob o letreiro em laranja já perdendo a cor "Gym", imaginava que aquelas três letras era tudo que conseguia pagar pra ser escrito. Adentrei o lugar vazio, já estando o sol se despedindo por completo, era Jack quem me recebia:
-Nate! -o peguei de surpresa, fazendo soar o sino de sua porta, e também sua voz alegremente receptiva, que voltou ao habitual irônico logo em seguida- pensei ter me livrado de você, já faz um tempo.
Depois de ir morar com Mark, Jack agora parecia a mim um irmão mais velho, andava sempre ocupado, planejava fazer uma reforma na academia, mas isso exigia dinheiro de outros serviços. Eu o visitava até que regularmente, considerando a distância, que não era pouca, mas desde o fim das férias de verão, não havíamos nos visto.
-Fala Esme!
-Não me deixa em paz mesmo, Roland. Ele se mantinha informado de tudo, e até ajudava Mark, embora eu continuasse zoando seu sobrenome...
-Jack, preciso de uma lâmina. -fui direto, manti um olhar obstinado como pensava que havia de ser o próximo "justiceiro branco", fui recebido com gargalhadas.
-Não quero que você se mate, Nate. E pra que você iria querer uma lâmina, de qualquer forma? Ainda não o ensinamos a manejar uma espada.
Ele não pode saber dos meus planos.
-Eu só... Queria aprender logo, e o faço melhor sozinho, do jeito que vocês demoram. -demonstrei uma insatisfação exageradamente infantil, oque não era um hábito, mas eu estava disposto a tudo por uma lâmina.
-Que seja, Nate, treinamos eu e você com bastões, e é tudo que te cedo por agora, mas se você bater em alguém com ele, eu farei o mesmo contigo duas vezes mais forte. Treine, e quando me vencer com um bastão, terá sua lâmina. -soava cético como sempre, mas apreensivo como poucas vezes. Era um jovem homem valente, porém despreocupado, menos quando havia risco a mim ou a Mark.
Não me opus, me deu um de seus bastões de Carvalho, talhado com linhas finas onduladas de uma extremidade a outra, com seu relevo tingido de preto, e tinha quase a minha altura. Não é uma lâmina, mas deve servir. Para minha própria surpresa, aquilo não me desanimou, e me peguei a saltar sobre os prédios por onde um dia Jack havia saltado, em busca de algum crime pra me meter e provavelmente morrer tentando interterir como uma criança que não sabe oque faz, mas eu sentia que sabia oque fazia, a prepotência era um risco que aquele dia eu corri.
Depois de alguns quarteirões, as ruas já se escureciam ao ponto da cidade ter tomado um tom azul escurecido, alimentado por luzes brancas dos postes que tinham aqui e ali ao longo das calçadas. Me vi pulando sobre todas as lojas que um dia dormi na rua a frente, a loja de eletrônicos EleTom's, a padaria Ham's King, a qual fiquei em cima no dia que conheci Jack, a loja de brinquedos repleta de luzes de natal oscilantes entre azul, verde e vermelho, que ficavam la em todas as estações, apesar disso, e encontravam se apagadas sendo iluminadas por uma única luz firme do poste, e por fim a elegante joalheria Golden Fingers, onde há muito tempo houve o assalto que transformou minha vida.
Após algum tempo saltando, vi um cara se aproximando de forma suspeita de outro homem na rua, o meu suspeito era corpulento, forte e viril de longe, vestia um agasalho castanho claro que sobressaltava seus já grandes braços, meus olhos a cem metros de distância enxergaram a fração de segundo em que o metal refletiu a luz do luar na mão do homem, se aproximava por trás, e num arco introduziu a faca no tórax do distraído homem a frente, obstruindo sua boca com a mão canhota livre enquanto o magro corpo cedia à morte em suas mãos.
Me senti assustado, já vestia a máscara desde que arranjei privacidade ao sair da academia de Jack, estava indeciso, assustado. Aquele homem havia sido assasinado a sangue frio na minha frente, por outro homem pelo menos duas vezes maior que eu. Eu os observava de uma laje do outro lado da rua, quando o homem olhou em volta e me viu. Mesmo na escuridão, meus olhos cintilavam como estrelas, ganhando brilho enquanto eu tentava enxergar melhor o homem. De impulso, saltei da laje ao chão com majestosidade, bem como Jack me ensinou a grandes alturas. Devo correr. Pensei mas Não agi. Ele veio até mim em passo rápido, praguejando murmúrios, com a faca na mão ainda pingando sangue de sua vítima. Derrubei a mochila ao chão e peguei o bastão das costas. Oque eu tô fazendo? Devo correr! Estava apavorado demais pra isso, e parte de mim não queria simplesmente deixar isso pra lá, não usando aquela máscara. Não no meu dia.
A abordagem do grande homem foi direta, saltou na minha direção erguendo a mão livre aberta para tentar me agarrar, rodopiei sobre os calcanhares para a direita, longe do alcance da faca, segurava o bastão, mas me faltava coragem pra revidar. Ele voltou a avançar com um rugido de fúria, dessa vez de punho cerrado, tentou me socar com tanta força que quando saltei pra trás, ágil, deu pra ouvir com clareza o atrito da mão dele com o vento. É lento demais. Ele continuava avançando, em vão, pois eu continuava recuando mais rápido do que ele poderia acompanhar. E isso o irritara, parecia mais obstinado a me acertar toda vez que avançava. Preciso revidar. Depois de cinco tentativas ele perdeu a paciência, agora tentava me acertar com a faca, parecia apressado, e cada vez que a lâmina da arma branca ressoava ao vento, meu coração batia mais forte. Em uma dessas, recuei de encontro a uma caixa de correio. Estou cercado. Pressionado contra ela, vi ele avançar como um leão contra mim, ergui o bastão contra a lâmina e fechei os olhos, e senti a carne rasgar num crac.
Meus dedos da mão esquerda sangravam, ele empunhava agora a faca com as duas mãos num arco vertical, eu saltei a direita, escapando de ter uma faca fincada na cabeça. Vi e senti meu sangue correr e cair no chão enquanto me movimentava, eu esboçava medo no olhar prateado luminoso. E ele se nutria do meu medo, agora com um meio sorriso, avançava mais de vagar, murmurando.
-Garotos intrometidos não vivem muito.
A frase provocante me amedrontou, bem como ele queria. Se ao menos jacques estivesse aqui. Não estava, eu o procurei ao entorno, tudo que vi foi um cadáver na calçada atrás de mim, e eu seria o próximo se continuasse sendo um covarde.
Ele soltava gritos de ameaça, ameaçava avançar e me via tremer, sorrindo sadicamente. Eu me sentia humilhado, e me sentia prestes a morrer, e isso era frustrante ao ponto de me irritar.
Ele então decidiu parar de brincar, e eu também. Partiu ferozmente pra cima de mim com o punho cerrado, saltei pro flanco dele, girando o bastão uma vez na mão direita enquanto a esquerda mal podia mexer de dor. Ele voltou a avançar de frente, dessa vez com a lâmina de curtíssimo gume contra meu peito. Mas eu era mais rápido do que ele jamais seria, dei outro salto completando o arco entorno dele à sua retaguarda, e girei o bastão num golpe preciso contra sua nuca. Tac. Ele cambaleou pra frente, e quando virava praguejando, se deparou comigo agora empunhando o bastão com as duas mãos em um golpe giratório com toda a força, que o atingia no nariz, era audível o som de ossos quebrando num clac. O homem começou a sangrar pelo nariz, soltou a faca e levou as duas mãos ao rosto, o sangue escorria por entre seus dedos, e ele gritava de dor tão alto que era possível ouvir a um kilometro.
O golpe me fez largar o bastão depois de esforçar demais a mão machucada, a dor agora era maior, ouvi sirenes responderem aos gritos do homem, quando ele me lançou um olhar esbugalhado, sombrio, e avançou com as duas mãos pra me estrangular. Chutei o bastão no chão a sua frente, e desviei pro lado quando ele escorregou na madeira cilíndrica talhada e caiu de cara no chão, arquejando a dor do nariz quebrado por mais uma eternidade. Quando as sirenes se aproximaram, peguei o bastão sujo de sangue e fugi dali. A noite havia caído mais do que o planejado, tanto quanto meu sangue.
Mark saberá...

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⏰ Última atualização: Dec 18, 2017 ⏰

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