Já era tarde da noite quando pegamos a estrada novamente. A lua escondia-se atrás das nuvens e não havia nenhuma estrela no céu. Não quis conversar com a minha mãe sobre o ocorrido, principalmente após ela comunicar que iria pagar pelo dano à lataria, uma vez que os jovens prestariam serviços comunitários à população. Não achei que fosse uma solução justa, mas estava cansado demais para desencadear qualquer discussão.
— Vamos procurar algum lugar para passarmos a noite – ela falou, abatida. — Tivemos um dia exaustivo.
Clarisse e eu concordamos.
— Que tal aquele hotel? – a minha irmã bocejou, apontou para um pequeno prédio azulado no meio do nada, o qual tinha apenas um outdoor da cerveja Cherry disposto ao seu lado.
— Me parece ótimo! – a minha mãe concordou, assoprando as mechas pregadas na testa suada.
— Só quero um lugar para dormir – balancei os ombros, escorado na janela.
Seguimos a estreita estrada que levava em direção ao hotel, e a minha mãe estacionou a Kombi entre dois carros esportivos. Apesar de algumas luzes estarem acesas e o letreiro indicando "Hotel Drummond" estar cintilando, a porta da recepção estava fechada.
Clarisse aproximou-se e bateu no vidro, mas não houve resposta. Ela tentou mais duas ou três vezes, mas não obtivemos nada que não fosse o próprio silêncio.
— Vamos embora – a minha mãe a enlaçou em seu braço, desapontada.
Voltamos para a estrada e seguimos por ruas mal iluminadas, rodeadas de grandes árvores que projetavam suas sombras sobre as poucas e velhas casas, as quais inspiravam um cenário de filme de terror. Com muito esforço, achamos uma pousada que, a princípio, não se parecia em nada com uma. A única coisa que a diferenciava de uma casa grande e arcaica, era a placa sobre o gramado, que havia sido escrita à mão. A arquitetura não era nada convidativa, e as enormes janelas vermelhas estavam escurecidas pelas crostas de lodo, assim como boa parte do telhado.
— Pousada da Dona Cici – Clarisse falou, sorrindo, ao ler a plaquinha pregada no gramado.
— Pousada da Dona Cici – a imitei.
— Vamos entrar, queridos – a minha mãe não estava certa de que queria passar a noite naquele lugar, mas o cansaço superiorizava a sua desconfiança.
Subimos por uma escada de poucos degraus em direção à uma porta dupla de carvalho. Havia, na recepção, três sofás de couro bege e uma mesinha de centro metálica. Não fossem pelos papéis de bala espalhados pelo local, diria que estava abandonado.
— Olhem para isso – indiquei-lhes um bilhetinho preso no quadro de avisos, ao lado de uma cordinha dourada.
"Em caso de emergência, puxe a cordinha!"
Não havia nenhuma emergência, mas não contive a minha curiosidade. Assim que a puxei, uma sintonia de sininhos começou a soar, acompanhada de luzinhas que acendiam-se desde a recepção, até a parte superior das duas escadas de madeira que levavam ao segundo andar.
— Uau! – Clarisse exclamou, maravilhada. — Isso é tão fantástico!
A minha mãe parecia apreensiva, mas seus olhos também brilhavam, encantados.
— Isso sim é uma decoração de Natal!
Após alguns segundos, as luzes apagaram-se, uma a uma, e passos fortes surgiram no andar de cima.
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As Doze Promessas de Clarisse (Degustação)
RomanceLeonardo teve que lidar com a responsabilidade muito precocemente. Após o pai abandonar a família e sumir no mundo com todo o dinheiro que possuíam, a mágoa e a maturidade transformaram o jovem em uma figura circunspecta. Ao lado da mãe e da irmã Cl...