Angústia

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"Você pode fugir das mãos do Diabo, mais não pode fugir das mãos do tempo..."

Wilian estendeu as mãos ensanguentadas para Aironh. Uma floresta negra, gosmenta com chuva de granizo caia sobre o rosto dos nossos personagens.

Aironh olhou para o lado, a visão turva, avistou ao longe uma cabana.

"Você não pode Aironh..."
O ar no pulmão de Aironh falhou.
"...o Diabo..."

Emile de olhos cinzentos, branca como a Neve, cabelos sujos e crespos. Estendeu a mão fria para seu pai.

"Papai? Você não consegue ver?"

Aironh chamou pela filha, mais sua voz não saia.

Angústia. Pânico. Medo.

O mais profundo medo, ecoou sobre sua pele.

"... o tempo... tempo..."
"Papai...?" Disse Emile com a boca cheia de carne.

Emile começou a cantarolar algo como;
" Há alguém que realmente precisa de você
Aqui estou, com o coração na mão.
vire-se, Olhe pra mim... Entenda, Entenda".

Emile colocou a mão no peito, em direção ao coração, suas unhas rasgaram o tórax, perfurando sem nenhuma dor...

"Você não pode fugir..." disse Wilian com a boca cheia de formigas.
"... das mãos..."

Wilian então tocou os ombros de Emile, e juntos disseram numa única voz que soou como sinfonia:

"Do tempo"!

Emile entregou o próprio coração, ainda batendo.

2

Aironh acordou, suando frio.
Falta de ar. Pricila levantou junto.

"Querido! O que aconteceu ?"
"Preciso de água! Água!"

Correu a passos largos para a geladeira, derrubando tudo que via pela frente, uma jarra de água entornou sobre os lábios secos. Aironh deixou no chão, bebendo o restante da água até a última gota.

"Aironh? Precisa ir ao médico? Vamos! Fale comigo!"

E então, sua pupila dilatou. Suando frio, ensopado pela água, o rádio soou sozinho.

Há alguém andando atras de você.
vire-se, olhe pra mim.
Há alguém vendo os seus passos,
Dê a volta, olhe pra mim. 🎶

"Mais que porra é essa!"
Arfou Aironh.

Levantou do chão e desligou o rádio.

"Aironh? Me explique!"

Aironh sabia que se Pricila soubesse de sua paranoia isso poderia causar danos, afinal isso afetaria o restante da família. Preferiu então blefar.

"Um sonho ruim..."
Olhou para o rádio.
"... precisamos comprar um rádio novo".

Abraçou Pricila, forte o quanto pode, e sem tirar os olhos do rádio. Subiram as escadas.

Uma centelha acendeu em cima do rádio.

3

Aironh retirou a roupa molhada, e entrou debaixo do choveuro. Deixou a água quente cair sobre o corpo, tentou não pensar, não podia pensar. O que ele tinha visto? E porque essas coisas tão de relentes? Mistérios.

Uma mão ficou seu ombro.

Pricila lhe entregou a toalha.

"Se seque e tente voltar a dormir. Precisamos levar Emile ao médico pela manhã".

Se enxugou, vestiu roupas secas e voltou pra cama, desta vez um copo de água ao lado.

"Médico ? Emile? Porque?"
"Ela não quiz comer nada. Tentou vomitar e não conseguia. Fiz com que ela tomasse  um relaxante muscular. Só assim a pode dormir"

Aironh não disse nada.

"Está me ouvindo?"
"Desculpe querida, eu, eu... nós levaremos ela pela manhã. Desculpe, eu preciso dormir..."

E adormeceu.

4

Pricila preparou um café da manhã farto, com ovos e bacon. Frutas decorava a mesa, morango, melão, e maçãs, digno de um ótimo desejum. Somente João comeu, principalmente as torradas de orégano.

Emile ficou ao lado da mesa, a boca começou a salivar. Mais não sentia fome. O rosto tinha perdido a coloração, os olhos vermelhos, irritados.

"Eu não preciso de médico papai..." disse a garotinha.

"A mamãe fez um banquete só pra você, tente comer alguma coisa, vai te fazer bem".

Ela disse que não com o rosto.

"Você vai ficar muito fraca se não comer Emile! Vai comer agora!"

"Pri! Espere! Calme!"

Pricila tentou enfiar ovos na boca da filha que caiu desmaiada.

A cena girou.

Há alguém andando atras de você.
vire-se, olhe pra mim.
Há alguém vendo os seus passos,
Dê a volta, olhe pra mim. 🎶

Emile bateu a cabeça muito forte contra o chão. Aironh tentou esticar os braços para impedir a pancada. Pricila deixou cair os ovos no chão. Mais nesse súbito momento o ovo ficou no ar...

Lentamente, desesperadamente Pricila gritou. Não ouviu nada. Aironh lacrimejou os olhos. João, avistou a cena e ainda não conseguia entender o diagnóstico da situação.

Câmera lenta.
Confuso. Tenso.
Flash!

Tudo voltou ao normal.
Um estalo no chão.
O ovo caiu.
Gritos que agora se ouvia.
Uma poça de sangue escorria pela cabeça de Emile.

Aironh levantou do chão. Em estado catatônico. Suando frio novamente.

"Pesadelo! É um maldito pesadelo!"

5

Sr. Tasty está sentado em sua velha cadeira de madeira. Fumando seu cachimbo. Cuspindo no chão igual aqueles caipiras nojentos do Texas. Seus olhos vidrados em uma única coisa.

Um corpo.

E várias lembranças do passado.
Lembranças trágicas.
Seu rádio soou;

Há alguém andando atras de você.
vire-se, olhe pra mim.
Há alguém vendo os seus passos,
Dê a volta, olhe pra mim. 🎶

Sr. TASTYOnde histórias criam vida. Descubra agora