Capítulo 1
A chácara de Merlin de mimimis maravilhosos
Abriu os olhos, e a intensidade da luz entrando pela janela do quarto informou-o que o sol já estava alto. Sentou-se com pressa na cama, chegando à conclusão de estar atrasado para a escola.
Levou três segundos até se lembrar que era sábado.
Agora calmo, Aurélio permaneceu sentado por bons instantes, ouvindo os passarinhos do lado de fora. Estava apenas de bermuda, a bainha da Excalibur presa por uma alça ao tórax sem camisa. Merlin já devia estar de pé, e o café pronto. Como o garoto não queria receber uma reprimenda do mago por acordar tarde, em mais um de seus manjados discursos sobre aproveitamento do tempo e os benefícios do clima matinal, acabou por levantar.
Pulou da cama até o guarda-roupa, abrindo uma gaveta em busca de uma camiseta para vestir. Enquanto procurava, sentia o ar fresco da chácara bater-lhe às costas ao entrar pela janela – e ficou feliz novamente por aquela ser a única janela da casa que permanecia sem tela de proteção contra mosquitos. Os pernilongos ali eram verdadeira praga, e Merlin fizera questão de vedar todas as aberturas para o lado de fora, ainda que isso botasse à prova sua claustrofobia – pois se recusava a usar inseticida, que mataria os bichos e com isso violaria o ciclo natural das coisas. Ficando a se coçar quase toda manhã devido à investida dos insetos, o mago vivia repetindo que jamais se acostumaria "a certas dificuldades de morar num país tropical".
Aquilo, no entanto, não se mostrava um problema a Aurélio. Os pernilongos entravam por sua janela zumbindo como uma verdadeira esquadrilha de caças da Segunda Guerra Mundial – porém lhe eram inofensivos. O poder de regeneração da bainha mágica fazia com que as picadas desaparecessem tão logo surgiam, privando-o da coceira e das eventuais feridas. Quando adquirira aquele artefato para proteger-se da ameaça de Morgana, jamais poderia imaginar que ele também se mostrasse tão eficaz repelente de insetos.
Vestiu uma camiseta azul sem mangas e calçou os chinelos que deixara ao lado da cama. A porta do quarto se encontrava semiaberta, permitindo-lhe ouvir ruídos vindos de outro cômodo da casa – provavelmente da cozinha. Antes de seguir até ela para o café, porém, havia algo que sentia necessidade de fazer – e Merlin teria de esperar.
Num rápido impulso, abaixou-se para ligar o interruptor do computador. A máquina entrou em inicialização, enquanto o adolescente se sentava folgado na cadeira de rodinhas frente a ela.
A demora da máquina só aumentou a ansiedade de Aurélio. Passava por aquele ritual angustiante toda manhã, sendo que nos dias de semana o fazia antes de ir para a escola. A insistência não o cansava – e mesmo já se sentindo burro por isso, não abandonava a esperança. Se eu não houvesse tido esperança durante tudo o que passei ano passado, não teria conseguido sair vivo, não é mesmo? – refletia sempre que a mesma voz de desistência, fina e irritante, começava a querer tagarelar dentro de sua cabeça.
O computador concluiu a inicialização e ele abriu o navegador de Internet. Cliques rápidos com o mouse e senhas digitadas em igual velocidade – Aurélio vinha usando muito o PC desde que havia se mudado – levaram-no à caixa de entrada de sua conta de e-mail.
No centro da tela, a lista de mensagens. No topo, havia algumas novas, representadas por um envelope dourado fechado e o assunto grafado em negrito, enviadas por nomes familiares como "Gabriel" e "Bruno". Ignorou-as, porém, rolando a barra ao lado da página para baixo até uma grande sequência de e-mails já lidos, representados por envelopes brancos abertos sem a mínima graça. Bufando, releu o remetente da mensagem mais nova, no topo da lista, que se repetia em todas as demais mensagens a seguir: "Gui". Ainda que aquele e-mail em questão fosse o último que recebera... a data era de sete meses atrás.
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O Legado de Avalon - Livro II: A Profecia do Condestável - DEGUSTAÇÃO
FantasyNas pistas de um mistério, a aventura continua... Passou-se um ano desde que o garoto Aurélio Britto, descobrindo ser o último descendente do Rei Arthur, batalhou com Morgana Le Fay. Isolado sob os cuidados do mago Merlin numa cidadezinha no interio...