André não estava errado.
Após a aula introdutória de Monã ter acabado, vieram outros professores naquela segunda-feira. Ele teve aulas de português e geografia, e intervalo entre elas. Os outros de sua turma ignoraram-no durante o primeiro dia, inclusive Jorge, que talvez estivesse com medo da professora Monã.
Para comemorar a ida à escola nova, Miguel o levou à praça do bairro, cheia de barraquinhas com diversos tipos de lanches. Comeram Yakisoba, numa das barracas.
– E como foi o seu primeiro dia de aula, filho? – perguntou Miguel, garfando um pouco do Yakisoba.
– Foi esquisito. Aquela diretora é assustadora.
Miguel sorriu e mastigou.
– Só não diga isso a ela.
– Não vou dizer nada pra ela, pai!
Eles riram. André garfou mais um pouco e mastigou rápido.
– E o pessoal da turma? – perguntou o pai.
– Esquisitos. Ninguém falou muito comigo, né? Acho que não gostam tanto de garotos com uma perna só.
– Ora, mas como assim? Eles falaram algo do tipo?
– A primeira coisa que aconteceu foi um idiota fazer uma piadinha! É um tal de Jorge, sabe? Eu ia xingar de volta, mas a professora chegou.
– A professora...?
– Professora Monã – André suspirou – ela é tão legal, pai! Você tinha que ver, ela deu um fora no Jorge e ainda me deu uma bronca!
Miguel riu.
– Você está feliz por ter recebido uma bronca, André.
– Sim! Ela não me pegou no colo e me tratou como um bebê! Eu já sou um homem.
– É sim, claro – Miguel ironizou – mas o que ela ensina?
– Folclore e história do Brasil! Ela ficou falando sobre os monstros do folclore, e eu descobri que só tem bicho sinistro! Acredita que tem um bicho que é a mistura de uma pessoa e um tamanduá?
– Não, filho – o pai mexeu no Yakisoba – acho que você está confundindo com a Diretora.
Eles se olharam e caíram na gargalhada. Miguel pediu a conta ao dono da barraquinha e se levantaram. André foi sem ajuda, hábil com suas muletas e, após pagarem, foram para casa.
– Só teve um problema nisso tudo – André falou baixinho, quando entraram no corredor do prédio.
– O que houve? Esse Jorge veio dizer mais alguma gracinha?
– Não! O problema é que eles vão fazer uma peça e eu vou ser o Saci. Imagina só! Vou ficar saltitando na frente de todos da escola!
Miguel olhou para o filho de um modo como apenas ele saberia descrever. Era uma mistura de seriedade e sabedoria.
– Esta é uma ótima oportunidade, André. Não precisa ficar triste, pois você conseguiu um dos papéis principais! Na verdade, é motivo de muito orgulho!
– Mas isso me envergonha! Eu vou receber apelidos.
– Você não pode fugir dos apelidos que vão dar a você. Vão fazer isso independente do que você faça, meu filho. O que você pode fazer é reagir. Se algo lhe ofender, você fala, se impõe. Caso contrário, não liga. Pensa só que legal vai ser, eu vou tirar fotos e colocar no Facelooks!
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O Tratado dos Pés Descalços
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