Capítulo 2 - Cath

10 1 0
                                    

Trancada em meu quarto, eu não sabia dizer se aquele era o lugar que eu me sentia melhor ou pior. Sempre que algo de ruim acontecia, era para lá que eu queria correr, mas quando lá eu chegava, tudo para mim se destruía. Era quando eu fechava meus olhos e tudo me atingia, aquelas lembranças eram remoídas e aos poucos minha sanidade também. Talvez não tão aos poucos.
Uma música tocava em meus ouvidos. Era apenas instrumental, e eu me lembrei da época que eu considerava os vocais partes indispensáveis das músicas. Uma música sem voz era como um corpo sem sentimentos. Até eu passar por aquilo. Vi que não precisava de um humano colocar seus sentimentos explícitos em letras, que o silêncio era talvez a forma mais pura de expressão. Quem seria eu para julgar o silêncio, afinal? Talvez fosse apenas minha mente querendo achar uma explicação para tudo, querendo se sentir menos sozinha, mas pensei que aquelas músicas sem vocais e apenas sentimentos envolvidos representassem o barulho de uma mente que não  conseguisse mais pedir ajuda.
Definitivamente fora de mim.
Tentei novamente encontrar um limbo para que eu pudesse dormir, apesar de estar no auge da tarde. Não tenho certeza se consegui encontrá-lo ou se foi apenas um sono desconfortável que era mais parecido com estar se afogando e enfim aceitar o fato de que nunca chegará à superfície a tempo. Sem sonhos e sem descanso real, apenas um ato de misericórdia do universo de me deixar sentindo nada por alguns minutos.

Quatro batidas fortes e impacientes na porta.
Levantei com um murmúrio rouco logo em seguida, abrindo a porta e encontrando uma mãe enfurecida por eu dormir naquele horário.
– Assim você não dormirá direito à noite! – a mulher na minha versão mais velha falou em tom de repreensão que disfarçava o divertimento pela visão de meu rosto amassado.
– É sexta-feira, mãe. – minha voz começando a se recuperar.
Com maior controle que meu corpo podia oferecer naquele momento, tentei suavizar sua carranca.
– Prometo que vou dormir como uma princesa, mamãe.
Tentei ignorar aquele meu lado amigável que dizia para eu não deixar minha mãe daquele jeito, que ela não era culpada quando eu logo tranquei a porta. Vi a sombra sob a porta por alguns segundos antes que ela se virasse e fosse embora.
Já eram seis horas da tarde, e eu sabia que se voltasse a me deitar não conseguiria dormir de qualquer maneira. Apanhei meu telefone e havia apenas uma notificação de mensagem.
Meu coração parou quando eu pensei ler o nome de Laurel.
Era Laura, uma garota loira que dividia algumas aulas comigo. Ela me chamava para uma festa, um convite que eu vagamente pensei em uma desculpa para recusar.
Acabei por me jogar na cama, as costas eretas reclamaram por um segundo. Apertei os olhos e me concentrei em respirar. Eu tinha tanto medo do que estava acontecendo, sequer sabia o que estava acontecendo. Eu sabia que estava cansada. De tudo. De Cath, do colégio, dos amigos que não tinha certeza se tinha. Mudança. Eu estava desesperada por mudança.

AquarelaOnde histórias criam vida. Descubra agora