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                                                            [Jasmine]

Rodei a chave na porta de entrada da minha casa e abri a porta. Olhei uma última vez para trás e acenei para o Michael que foi suficientemente querido para me levar até casa, mesmo após de ter insistido várias vezes que não era necessário. Descalcei os meus sapatos e pousei-os junto da entrada onde eles estavam inicialmente antes de sair de casa, os meus pais ligavam muito a pormenores e se alguma coisa estivesse fora do sítio eles sabiam exatamente que alguma coisa de errado se estava a passar.

Caminhei em bicos de pés e subi as escadas lentamente tentando ao máximo para que ninguém notasse a minha presença. Quando alcancei o meu quarto, abri a porta devagar e entrei, respirando de alívio. Sempre que saio, fico sempre com a sensação que vou ser apanhada e se algum dia isso acontecer tenho a certeza que os meus pais vão-me castigar severamente. 

Arrastei os livros de Matemática que estavam em cima da minha cama e pousei-os no chão. Já tinha acabado de fazer os trabalhos de casa antes de sair de casa portanto estava na hora de descansar. Odeio completamente esta vida, odeio simplesmente a maneira como sou obrigada a escolher um caminho que nem eu sei se é isso que quero. Os meus pais desde pequenina sempre me disseram que quando crescesse iria exercer Medicina no melhor hospital de Sacramento. E desde então a pressão e a insistência tem sido cada vez maior e cada vez mais tenho a certeza que é isto que NÃO quero. 

Eu não quero ser aquela rapariga inteligente que cresceu sem amigos e que é gozada por toda a gente na escola, não quero ser aquela rapariga que é invisível aos olhos de todos, não quero ser aquela rapariga que apenas é necessária para copiar nos testes ou para ajudar nos trabalhos de grupos. Eu apenas queria ser normal, queria puder sentar-me junto de outras pessoas nas horas de almoço, queria sair de casa ao fim-de-semana com amigos e divertir-me e puder ter alguém com quem conversar a qualquer hora... Mas simplesmente estou nisto completamente sozinha e sozinha vou ter de ficar. Porque ninguém conseguiria aguentar todos os meus segredos. 

(...) 

❝Adeus querida depois diz-me quanto é que tiveste no teu teste de Inglês. Esperemos que seja nota máxima.❞ - o meu pai depositou um beijo na minha testa e eu saí do carro acenando. 

O caminho até à sala era feito de pessoas a olhar para mim como se fosse uma anormal e, por vezes, alguns sussurros aqui e ali. Nada que não esteja habituada. Pus os meus phones e deixei a primeira música tocar e para meu espanto era, nada mais nada menos, que The 1975. Larguei um longo sorriso e não consegui deixar de imaginar o Michael a cantar a música 'Girls' ontem. Ainda nem acredito que alguém neste sítio a que chamam escola tem tão bom gosto musical como eu. Ele lembrou-se do meu nome e lembrou-se que era da turma dele, como é possível? Era suposto eu ser a pessoa transparente que todos ignoram, mas ele... Ele era diferente. Ele olhou para mim sem repugnância, falou para mim sem segundas intenções e riu-se das minhas piadas sem piada nenhuma. 

Mas eu não me posso iludir, as pessoas revelam ser aquilo que não são. 

A campaínha soou e eu entrei rapidamente na sala para que o meu lugar lá no fundo não seja ocupado visto que não era a única que queria ser passada de despercebida nas aulas. Os restantes membros da turma entraram seguidamente do professor Power com o seu bom humor matinal. 

❝Bom dia. Hoje vou entregar-vos os testes e vamos corrigi-los. Vou escolher aleatoriamente pessoas para virem aqui à frente ler as suas respostas e quero que a turma toda participe, dando a sua opinião.❞ - ele pegou nos testes e foi distribuíndo aos lugares de cada um. 

O professor normalmente lia as respostas que tinha e todos, ou quase todos, passavam para o seu caderno. E hoje ele lembrou-se de fazer as coisas diferentes, espero bem que não seja uma dessas pessoas escolhidas para ler. Simplesmente não posso passar por essa humilhação. 

❝Jasmine Brown... Parabéns! Melhor nota da turma e nota máxima. Gostava que o resto da turma fosse como tu, até dava mais vontade para levantar de manhã da cama.❞ - sorri e agarrei no teste vendo um enorme "A++" no canto superior direito. 

 Boa, estou tão entusiasmada por ter nota máxima... Não me parece. Isto ainda só alimenta mais a alegria do meu pai para ir para Harvard. Ugh, se vocês soubessem a vontade que tenho de não ir e de contrariar o meu pai... QUE RAIVA. Porque é que eu não posso simplesmente planear a minha vida? Porque é que tem sempre tudo planeado para mim? Eu quero puder ter a minha própria opinião e fazer aquilo que bem me apetece. A única coisa que vejo de positivo nesta história é que quando for para Harvard vou estar longe FINALMENTE dos meus pais.

Liberdade procura-se rapidamente! 

Após algumas pessoas terem lidos as suas respostas e do professor ter manifestado o seu desagrado pelas miseráveis notas da turma, apenas faltava corrigir a composição. Olhei para o relógio e ainda faltava meia hora até acabar a aula, quem acha que eu adoro as aulas está profundamente enganado, odeio completamente este aborrecimento! Para me entreter fui ler as próximas matérias que iamos dar nas próximas aulas mas fui interrompida. 

❝Jasmine, será que podes ler a tua composição? ❞

❝Eu?" - perguntei estupidamente e pude ver a turma toda a rir-se de mim. 

❝Sim, anda cá. Eu quero que as pessoas leiam a tua magnifíca composição.❞ - ele sorriu e gesticulou para eu ir até lá frente onde ele se encontrava. 

Levantei-me lentamente da cadeira e caminhei até lá, vendo os olhares de cada um a seguir cada passo que dava. Isto não me pode estar a acontecer, por favor alguém que me leve daqui para fora, não estou preparada para esta humilhação total!

❝Vá, podes começar. E quero toda a gente atenta ao texto depois no final podem comentar o que quiserem.❞

Clareei a minha garganta e olhei intensamente para o papel. As minhas mãos estavam trémulas e as minhas pernas pareciam que queriam fugir dali, acreditem que não eram as únicas. 

Vejo muitas pessoas a queixar de não ter liberdade, mas eles sabem lá o que é ter liberdade! Só porque não lhes dão aquilo que querem ou simplesmente porque acham que alguém os impede de fazer o que eles desejam acham que são punidos. Mas ninguém sabe o que é viver uma vida planeada desde que nasceu, não sabe o que é viver segundo regras rígidas que não tem cavimento nenhum, não sabe o que é viver através da opinião dos outros e muito menos não sabe o que é viver sem puder dar a sua opinião. Muita gente fala do que não sabe e a liberdade é algo que se descobre ao dar de cara consigo mesmo, sem a interferência da opinião dos outros, sem os papéis socialmente impostos ou até escolhidos. O que conquistamos é a independência, a capacidade, o poder de fazer coisas por si e de cuidar de si. Mas liberdade não é poder: é ser. Portanto se tivesse um último desejo queria puder ser livre e viver a vida que sempre quis.

Lágrimas ameaçavam caír dos meus olhos e puder todos a olhar para mim quando acabei de falar. Segundos depois foi o máximo para altos risos e gargalhadas ecoarem pela sala, acabei de me abrir para a turma toda e é assim que eles reagem. 

Então foi o que fiz aquilo aquilo que veio à minha mente, fugi dali. Não era capaz de aguentar aquilo, não era capaz de vê-los gozar com algo tão sério, algo que mexe imenso comigo. 

É por isso que ninguém nunca irá entender, nunca ninguém irá entender o que é ser eu.

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se vos dissesse que isto me aconteceu na vida real, acreditavam? Oh Deus, o quanto chorei nesse dia... Enfim, àguas passadas. Espero que tenham gostado, comentem e votem pleaseeeeeee.

Innocent //m.c.Onde histórias criam vida. Descubra agora