A Primeira Ação

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Como vocês sabem, todas as ações têm as suas consequências... Pois eu sofri e sofro com isso cada segundo da minha vida.
EA XIV 3445

Entro na sala num ápice que nem fui capaz de compreender os meus movimentos. Fecho os olhos e penso. Suspiro. Volto a pensar e volto a suspirar.

Calma.

Abro os olhos e deparo-me com um homem forte, de cabelos pretos e penteados com gel, barba feita e um fato muito formal para uma escola. O seu rosto tinha um formato estranho e achatado, e os seus óculos retângulares tornavam os seus olhos bem maiores do que provavelmente seriam. Era alguém que eu diria de negócios. Uma pessoa de um ar bem apessoada.

Mas havia algo de errado com ele: a faca que segurava na mão com uma enorme pressão.
Do outro lado da sala estavam os alunos, um pouco mais novos que eu, todos encostados ao quadro branco.

Como é que passa na cabeça de alguém fazer de miúdos reféns? Também não percebo, mas eu fui a rapariga que roubou uma arma a um agente.

Caminhei lentamente com a arma apontada para o homem. Não ia disparar, apenas causar medo e assim ele largava a navalha. Mas a cada passo que dava ele entortava a cara, desafiando-me. Eu não disse nada, ele não disse nada, ninguém disse nada. Quando dei por mim estava a apenas dois metro dele.

Preparei a bala, pronta para atirar (algo que agora era uma opção) e não hesitaram os gemidos de medo dos jovenzinhos.

"Por favor, largue a arma! Não lhe quero tirar a vida à frente destes pobres alunos...por favor!"

Mas ele não obedecia ao meus pensamentos. Encostei-lhe a boca da pistola no coração, e olhei-o nos olhos de assassino, mas a única coisa que via era o meu reflexo. E quando me apercebi, lá estava ele. Deitado no chão, com uma mancha de sangue.

Não me senti mal. Muito pelo contrário, senti-me orgulhosa. Ainda com a arma na mão, saí da sala num passo lento e descontraído. Dei de caras com Jackson, que se mostrava surpreendido e perplexo. Entreguei-lhe a arma na mão com a maior calma.
- O que uma jovem mulher consegue fazer espanta muitos homens polícias- cuspi-lhe eu na cara, convencida de que tinha ganho esta batalha.
Comecei a descer cada degrau das escadas com movimentos delicados e poderosos. Ergui as minhas costas, subi o queixo e olhei de lado todos à minha volta. Tudo foi tão rápido, mas tão...saboroso! Como se matar nem fosse assim tão mau, afinal, ele não era nenhum inocente.

E de repente algo envolve os meus pulsos, prendendo-os nas minhas costas. Encostaram a minha barriga à parede, e a minha cara ficou colado no frio daquele local.
- Está presa em nome da lei por desobedecer à lei.- proclama Jackson, num tom um quanto irritante.
{Calma, vai tudo correr bem}

Quer dizer, eu faço o seu trabalho sem qualquer custo monetário e o senhor ainda tem a lata de dizer que estou presa! Ai como eu odeio esta gente...

E daí eu apercebo-me do que realmente fiz. Matei um homem. Matei um homem à frente de alunos. E por conta disso vou presa, vou perder a minha família, os amigos, a escola, o namorado. Tudo.
Mas eu sou menor. Não me podem prender.

Jackson e mais dois agentes levam-me até à saída do bloco, caminhando pela escola. Todos me olham, vejo os meus colegas de turma pasmados com as algemas que prendem os meus pulsos. Os professores nem se atrevem a vir ao meu socorro, medricas...

Mas de todos que tento procurar, Lee e Isaac não se encontram lá. Se calhar Isaac também foi descoberto e o levaram mais cedo que eu. Mas e Lee?

O caminhar lento e misterioso enlouquece-me. Não sei o que fazer, mas sei que fui longe demais.
{Calma, vai tudo correr bem}

Afinal, não sinto nenhuma dor ou choque como aparecem nos filmes. Matar não é assim tão mau como falam.

Acordo dos meus pensamentos ao olhar para eles. De cabelos pretos caídos aos ombros e óculos redondos, encontrava-se a minha melhor amiga a impedir o caminho.
-Posso me despedir?- pergunta ela ao agente. Este acenou afirmativamente, apesar de aparentar pouca paciência.

Ela abraçou-me e pela primeira vez senti-me livre. Como se me tivessem libertado das algemas que me prendiam ao meu ser. E a partir daquele momento eu seria e serei uma pessoa completamente diferente. Literalmente, porque nessa distração Isaac abrira as algemas com a chave do tudo.

A chave do tudo é, como diz o nome, uma chave que abre tudo. Desde que o conheci, mesmo antes de nos apaixonarmos, Isaac apresentou-me uma chave dourada, pequena e suja. Diziam todos que era falsa, ou comprada numa loja "podre". Mas quando começámos a namorar, ele admitiu que me conquistara com a sua chave, que aquela chave tinha aberto o meu coração. Piroso, porém fofo.

E durante aquele abraço forte, Lee sussura:
- Foge.
Deu um passo ao lado, o que significaram mil e um para mim.

Corri até à saída o mais rápido que tudo. Eu era perfeita a correr, amava. Ainda pequena, quando entrei nesta escola, participei no meu primeiro campeonato de iniciados. Ganhei o primeiro lugar, o que me fez abrir os olhos para este mundo. Não gosto do atletismo, mas amo correr. Só de sentir o vento a bater-me pelo pescoço, os meus cabelos a ondularem pelo ar, o controlo sobre o meu próprio corpo.
Já me tinham proposto diversas vezes para entrar para algum desporto, mas eu sempre neguei. Gosto de fazer as coisas por mim mesma, sem que me obriguem.

Saí da escola sem olhar uma única vez para trás. Por momentos senti o prazeroso sabor a vida ilimitada, a descoberta. Como um cão que sai de um canil pela primeira vez.

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