Eu andava impaciente, de um lado para o outro, diante das grandes portas de madeira avermelhadas de meu quarto, trancadas por dentro para que eu não pudesse entrar... Porque, a cada novo grito que eu ouvia vindo de lá de dentro, meu maior impulso era derrubar as portas... Mas, mesmo que eu entrasse, o que eu poderia fazer? No que eu poderia ajudar? Minha entrada poderia só atrapalhar ainda mais...
Todas as reviravoltas de minha vida conseguiam me deixar completamente zonzo... Primeiro foi a descoberta da identidade de meu pai (o gordo, bêbado e fanfarrão rei Robert, que descansava em paz havia muito, antes mesmo do que a guerra, e que não fizera a menor diferença pra mim, vivo ou morto); depois, me vestiram com sedas e veludos, colocaram uma coroa ridícula sobre minha cabeça e me disseram para governar os Sete Reinos; encontrei Arya e consegui convencê-la a ser minha rainha (apesar de toda a sua relutância e todas as discussões)... Mas eu estava prestes a conhecer a maior de todas as reviravoltas que minha vida poderia encontrar: eu, um ferreiro pobre que crescera sem pai na Baixada das Pulgas de Porto Real, que aprendera desde cedo a viver completamente sozinho, estava prestes a me tornar pai!
Naquele quarto, atrás daquelas postas, nascia meu primeiro filho, a pessoa mais importante do meu mundo e da minha vida, sangue do meu próprio sangue!
Até aquele momento, eu não sabia direito o que esperar quando chegasse o dia do nascimento de meu filho... Eu supunha que estava psicologicamente preparado para isso, mas estava redondamente enganado... Só não entrara mais em pânico porque Arya precisava da minha força e serenidade para ficar tranquila.
Mas, agora que estava sozinho e impedido de entrar no quarto por Meistre Alleras e pelas parteiras, eu caminhava impaciente como um animal na jaula, tão desesperadamente acuado que temia minhas próprias reações... Arya era a forte de nós dois e não eu... Ela era muito mais corajosa e muito mais esperta do que eu... Ela sempre sabia o que fazer, enquanto eu ficava bem ali, plantado no chão como as Árvores Coração dos Deuses Antigos do pai dela, sem conseguir tomar uma decisão, fosse de entrar no quarto, fosse de me acalmar e esperar...
E, mesmo assim, esperar que ele nascesse era a parte mais fácil... O que viria depois me assustava mais, muito mais... Se eu não tinha ideia de como seria pai, como eu educaria príncipes e princesas? Eu desde o começo sabia que não tinha nascido para ser rei... Será que aprenderia a ser pai? Temia cometer mais erros nessa função do que na outra...
Robert não tinha sido meu pai, assim como não foi de tantos bastardos que gerou ao longo dos Sete Reinos, tampouco foi um bom exemplo de pai para os três filhos da Rainha Cersei, a quem dera o seu nome, mesmo que não fossem realmente seus...
Eu podia admirar muitas coisas em Stannis, mas sua paternidade não era uma delas... O contato que ele tinha com Shireen era mínimo e ele parecia mais um general se dirigindo a um soldado do que um pai falando com sua filha, que uma vez fora sua princesa...
Renly não viveu o suficiente para gerar herdeiros, mas o que se sabia era que ele gostava demais de si mesmo para demonstrar devoção a outra pessoa, mesmo que tivesse seu sangue...
Temia que o sangue Baratheon que corria em minhas veias pudesse se tornar um fator contra o qual eu não teria como lutar... E eu não saberia me perdoar se isso acontecesse... Nem Arya me perdoaria também...
Ouvi mais um grito e senti um forte aperto no peito... Todas as vezes que pude socorrer Arya, quando fugíamos juntos da guerra e dos capas douradas de Joffrey e Cersei, eu corri para ela sem pensar duas vezes, pronto para me colocar entre ela e o perigo... E agora eu me sentia completamente inútil por não estar ao seu lado.
Encostei-me à parede de pedra diante do quarto e fechei meus olhos ao escutar um novo grito, ainda pior do que o anterior, mas a esse se seguiu um som estridente que preencheu tudo: um choro de criança!
A porta foi destrancada e uma das parteiras fez uma reverência na minha direção, para que eu entrasse no quarto. Eu me dirigi quase correndo para a cama em que Arya estava deitada, o rosto vermelho e exausto, coberto por gotículas de suor, mas o mais lindo dos sorrisos desenhado em seus lábios, como eu nunca tinha visto antes. Em seus braços, um embrulhinho de panos brancos se contorcia e gemia um choro baixinho, hipnotizando-a.
Sentei-me ao seu lado e olhei para o pequeno bebê, que também tinha o rostinho muito vermelho, de tanto fazer esforço para vir ao mundo. Era um lindo menino, com um tufo de cabelos muito pretos sobre a cabeça pequenina. Ainda não era possível saber de que cor eram seus olhos, que permaneciam mais tempo fechados do que abertos... Tinha as mãos minúsculas e bem feitinhas, assim como os pezinhos... Era uma perfeição com a qual eu jamais sonharia!
Meus olhos não conseguiam desviar de meu filho, eu nem piscava e não ouvia nada a minha volta que não fosse os barulhinhos adoráveis de bebê que ele fazia... Não prestei atenção aos cumprimentos recebidos ou quando Alleras e as parteiras saíram do quarto, deixando Arya e eu sozinhos com nosso tesouro.
Ela também não movia seus olhos tempo demais do menino que brincava com seu dedo. Ficamos os dois imersos em silêncio absoluto, como se o mínimo som pudesse nos despertar daquele sonho tão bom...
- Quer segurá-lo? – Arya perguntou, quebrando o silêncio depois que ele já tinha se estendido por muito tempo. Eu assenti, mesmo temendo não saber fazer isso direito.
Era tão pequenininho e frágil em minhas mãos que eu me senti completamente desajeitado, mesmo que sempre tenha tido mãos bem firmes de ferreiro.
- É tão perfeitinho – eu disse baixinho a ela, vendo-a sorrir e concordar.
- Já sabe o nome que daremos a ele?
Voltei meus olhos para o pequeno bebê em meus braços, atento ao menor detalhe de seu rostinho redondo, pensativo. Um nome para um príncipe, devia ser... Um nome para alguém que um dia deveria ser rei... Um nome para meu primeiro filho com o amor da minha vida...
Tinha de ser um nome de alguém corajoso e honrado, que inspirasse lealdade e paixão, porque nosso filho era a flor que nascera para afirmar o fim do Inverno... Eu desejava que, apesar de toda a promessa de seu nascimento, ele se tornasse alguém humilde e compassivo, alguém que não apenas herdasse o trono, mas que o merecesse...
Enquanto eu pensava, seus olhos se abriram na minha direção minimamente e eu sorri ao perceber que eram cinzentos.
- Ele vai se chamar Arry!
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Uma Esperança de Primavera
FanficPara mim, uma Esperança de Primavera é mais do que nós podemos encontrar... **a fanfic contém spoilers! se você ainda não leu todos os livros (já lançados), está por sua própria conta e risco!** Todos os personagens mencionados pertencem ao grande m...