{2018}
- Laura Campbell - digo anestesiada ao atender a ligação mais que inédita. -A que devo a honra de sua ilustre chamada? - Brinco com o uso das palavras e a ouço bufar do outro lado da linha, sorrio de imediato.
- Então a Lala volta para o melhor país do mundo e esquece de avisar sua prima preferida? - Diz tentando parecer brava, mas falha miseravelmente.
- Até parece que o Brasil é tudo isso, né, sua patriota? E pode deixar, da próxima eu aviso a Cecília! - Falo passando ciúmes. - E, priminha, pode vir me buscar, assim você mata a saudade do pãozinho aqui.
- Vê se cala a boca, Ayla! - Responde me fazendo rir. - Quem disse que eu estou com saudades?
- Sempre está com saudades, Lau. Admite, você me ama. Agora vem logo, mamãe não conseguiu alugar o carro por lá, vou ter que ir pessoalmente.
- Vai ficar jogando meu amor na minha cara agora? - Pergunta com uma voz irritantemente fofa. - Aonde você está, sua promíscua?
- Na verdade eu vou sim! - Sorrio ao saber que meu drama do carro deu certo. - Obviamente no aeroporto, Laura. Pegando as malas. E... hey, eu não sou promíscua! - Respondo brava enquanto me inclino para frente pegando minha mala que passava pela enorme esteira, sendo uma das últimas para o meu, já esperado, azar.
- Claro que não, Lala, você é a personificação da virgem Maria. - Ouço barulhos de um molho de chave se mexendo e logo Laura avisa que vai sair a Tia Mary. - Agiliza, já estou saindo daqui.
- Okay, Lau. Bye! - me despeço e desligo a chamada, andando para fora daquele aeroporto lotado e trombando em algumas pessoas até chegar na portaria principal.
Acredito que chegar nesse aeroporto e ouvir a minha língua nativa, não está nem perto da quantidade de coisas que eu vou acabar suportando hoje. Voltar depois de anos foi uma decisão extremamente difícil, deixar minha família e toda a vida que eu construí no decorrer desses anos, não a facilitou, mas eu precisava disso, eu devia isso a mim, no entanto, mesmo que eu diga a todo mundo que estou aqui por planos na minha carreira e oportunidade de crescimento, não consigo mentir a mim mesma, pois sei que voltei por ela.
Voltei porque a amo, voltei porque a quero, voltei porque, mesmo que tenham se passado dez anos, eu ainda tenho esperanças, ainda me lembro do sorriso, das clichês promessas que fazíamos, de como ela acariciava meu rosto, de sua voz rouca depois de um orgasmo, da pinta em sua clavícula direita, das curvas de sua cintura, do azul vibrante que seu olhar tinha ao pairar sobre o meu corpo, de sua respiração ofegante graças a mim, de seus beijos que traziam vida ao meu coração, mas também tiravam ar dos pulmões.
Talvez eu precise que ela jogue no meu rosto que está casada, tem um filho e que eu não passei da aventura de uma adolescente entediada, acredito que assim, e só assim, eu consiga destruir todo o sentimento que tenho por essa mulher, da mesma forma que ela vai me destruir quando disser tais coisas estupidamente verdadeiras.
- Nada a declarar, Ayla Campbell. Você é inacreditavelmente burra! - Diz meu consciente me torturando pela milésima vez desde que decidi voltar.
- Porra, Ayla, a Terra está te querendo de volta! - Tenho meus devaneios completamente interrompidos por uma criança, digo, por Laura que balançava meus braços como uma louca para que eu a notasse. Pulo imediatamente em seu colo e quase a derrubo degrau abaixo.
- Senti saudades, soulmate! - Separo o abraço e sorrio contemplando a beleza da menor, melhor e mais insuportável prima de todo esse mundo.
- Não mais que eu, sunshine! - Ela sorri de volta, mas corta o sorriso com uma expressão confusa. - Achei que nunca voltaria desse seu transe profundo. E digo mais, acho que esse tal transe possui um nome. Seria Kat-...
- NÃO! - Tampo sua boca com a palma da mão a impedindo de falar. - Não comece a colocar ela nisso. Afinal, ela está casada, mãe e feliz.
- O que? - Laura começa a rir como uma idiota jogando seu corpo para frente debochadamente. - Eu ouvi certo? Você disse "mãe"?
- Qual é a graça, Laura? - Pergunto já ficando irritada. - Não esperava que ela fosse me amar a vida toda, ou esperava?
- Na verdade, eu esperava sim. - Ela confirma sua burrice tentando parar de rir. - Escuta, eu não a vi grávida, e somos praticamente vizinhas, se esqueceu?
- Nesse caso, você é a desatualizada então, Lau. Mas isso não vem ao caso também, eu já não me importo mais! - Fecho os olhos com força, crente de que a desculpa colou e logo a ouço voltar a rir ainda mais alto do que da última vez. - Tenha Santa paciência, Laura! Vamos logo. - Saio a puxando.
- Ai, nervosinha, o carro não está por aí! - Explica limpando o canto de seus olhos que se umedeceram pelo riso.
- Está em qual dos estacionamentos? - Me irrito ainda mais com a demora de Laura para responder minhas perguntas. - Vamos rápido, porque eu não sei se você percebeu, mas estou com uma mala com quase quarenta quilos em meu encalço. - Reviro os olhos tentando demonstrar pressa e stress.
- Para de exagero, a companhia aérea só permite vinte e três quilos por mala, meu anjo. A sua linda desculpinha não colou. - Sorri me desmascarando. - E está no último estacionamento, nos outros não haviam vagas, parece que todo mundo decidiu voltar para nosso famigerado Brasil, então temos que ir andando até lá.
- Rápido, Laura. Rápido! - Saio andando apressada na frente afim de correr dali o mais rápido possível, até que um idiota faz o favor de trombar em mim. E o pior, foi com a força de cento e oitenta e oito javalis, só para constar.
- Ei, não olha por onde anda? - O abusado ainda tem a coragem de jogar a culpa em mim?! Ah, mas isso não vai ficar desse jeito nem... - Ayla? - Como o estranho sabe meu nome?
- Frederico Bonneville? - Travo o maxilar com raiva e expiro o ar tentando manter meu equilíbrio.
- O próprio! - Responde fazendo a mesma expressão cínica de quando tínhamos quatorze anos. - Há quanto tempo, Lala. - Continua sua fala e logo me estende sua mão direita.
- Que merda você está fazendo nesse lugar, Ayla? - Meu consciente me ataca novamente e acabo de concordar com o mesmo. Eu realmente não deveria estar aqui, isso não vai acabar bem em absolutamente nenhum aspecto.
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Tempo Perdido
Romance"Nem todo tempo perdido é tempo a ser recuperado, mas o nosso é, e nada mais importa."