O Discurso

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Um grito de rejeição se espalha pelos corredores de um pequeno hotel da redondeza, e Éllen sai correndo pela calçada onde o investigador Cavalo segue atrás implorando :

- Sra Éllen, espere por favor.

- Não! Já te disse que não sei de nada.

- Por favor senhora, aonde vai? Volte aqui é uma ordem!

Éllen dirige- se para a passarela interna da Estação ferroviária e sobe em uma mureta com revestimento em ferro, simulando um suicídio. O investigador fica surpreso e ao mesmo tempo pede reforço policial.
Em um piscar de olhos surgem curiosos por toda parte e policiais pedem para passantes e passageiros se afastarem, para que não atrapalhem as negociações com aquela mulher que pretendia se jogar nos trilhos.

Imediatamente na sala de operações, colaboradores por via rádio emitem ordens para a interrupção de trens até ao terminal e o caos estava formado na manhã de quarta-feira.

O investigador como o negociador principal conversa pacientemente com Éllen:

- Sra Éllen por favor desça. Não vai cometer uma loucura somente porque se recusa colaborar com a Polícia.

- Já te disse que não sei de nada, não vi nada! Vá embora se não eu salto! A minha vida não vale nada mesmo.

- Que isso Sra Éllen, não fale assim, é claro que a senhorita tem valor, caso contrário não estaríamos aqui.

- Olha, é só um depoimento e nada mais.

- Não interessa, e outra... depoimento se faz na delegacia regional e não em praça pública Cavalo! Afastem-se, eu pulo daqui hein!

O investigador estava preocupado com aquela situação e ao mesmo tempo com o número de curiosos que aumentava a cada vez mais. Era como se fosse dias de clássico do futebol Paulista, torcedores por todos os lados, mas ali a torcida era diferente, o povo gritava e a maioria era do sexo masculino, pois Éllen estava descontrolada, gritava e a cada grito era uma peça de roupa que ela atirava longe.

Pois era outono e a cidade encontrava-se em uns dos dias mais frios de Sampa e a torcida nada mais era, para que ela ficasse completamente nua, para a alegria dos homens que naquela manhã presenciavam aquela mulher, trepada no topo da passarela ferroviária e a todo momento ameaçando se jogar nos trilhos da estação, manchando de sangue o cartão postal da cidade.

Éllen se encontrava agora sem opção e sem roupas, pois para alegria da galera que duvidara dela ou por sacanagem mesmo; estava exatamente como vinhera ao mundo .

A multidão assobiavam, gritavam e iam ao delírio com aquela cena e ao mesmos tempo esqueciam de que chegariam atrasados ao trabalho e o dia já estava comprometido, com o caos generalizado em pleno meio da semana.

Éllen abre bem os braços e grita:

Olhem! Vejam com seus próprios olhos pessoal. Eu...a vagabunda! A rampeira, uma vadia sendo perseguida por este homem, que cisma que sou co autora de assinatos, mas eu sou uma vítima como todos que estão aqui neste momento. Vítima da sociedade, vitima de uma escravidão disfarçada talvez , mas criminosa...jamais!

Cada frase que Éllen pronunciava era um URRA! A plateia iam a loucura com o discurso da prostituta que se encontrava encurralada pela Polícia e por aquela multidão, que estavam ali abaixo da plataforma Central.

Todos profissionais que estava ali naquele momento estavam acostumados com situações e cenas corriqueiras como aquela, pessoas querendo acabar com a própria vida, mas os que todos estavam admirados era como ela conseguiu subir naquela mureta de proteção, o que não é nada fácil. E ainda com movimentos bruscos tirou as roupas e ficou como veio ao mundo, e se a sua intenção era de chamar atenção, ela em poucos minutos conseguiu o que artistas urbanos geralmente demoram horas! Sem contar com as inúmeras visualizações em redes sociais, pois a notícia corria na velocidade da luz pelos celulares, postados pelos repórteres da classe trabalhadora.

Éllen faz sinais obscenos para os Policiais e salta de uma altura de quatro metros, pula da estrutura de puro ferro, e com ela vai o drama da mulher e a trama da vida, com ela em uma fração de segundos toda à amargura, sentimentos e revoltas nuas e cruas.
E cai!...cai nos braços do povo, a Polícia imediatamente em conjunto com paramédicos, prestam os primeiros socorros àquela mulher e consideram um sucesso a operação, pois se Éllen tivesse se jogado do lado oposto dificilmente escaparia com vida. Pois apesar da preparação com uma rede de proteção, cabos de aço, trilhos e pedras estavam logo abaixo daquele local onde a vítima tinha escolhido para o então o suposto salto, e como nunca se sabe o'que poderia ter acontecido, eles consideraram a ação bem sucedida.

Entre Concretos & Lençóis (Em Edição )Onde histórias criam vida. Descubra agora