Respire em mim.

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 Julho, 2006.

A escuridão dominava o ambiente, deixando quase impossível distinguir onde começava a grama e terminava o lago se não fosse pela lua que iluminava as marolas da água, rememorando as rugas de uma pele castigada pelo tempo. Sob o luar, algo maligno espreitava a residência dos Morgan.

Amy abriu os olhos com dificuldade, sentindo seu corpo reclamar dolorosamente apenas por respirar com um pouco mais de força. Sentou-se, gemendo baixo e praguejando. Dores ! Dor inclusive para engolir sua própria saliva.

Um miado baixo tirou a mesma dos seus pensamentos, não demorou mais do que alguns minutos para a menina de apenas treze anos perceber que não estava no seu quarto. Virou o rosto, encontrando sua irmã dormindo calmamente com um gato velho e pulguento deitado em sua barriga.

- Vira-Lata - Sussurrou com estorvo por causa de sua penosa garganta enquanto se levantava da cama, tentando fazer o mínimo de barulho possível.

Ao tocar o chão gelado com seus pés descalços um arrepio percorreu por seu corpo, deixando uma sensação desagradável nas partes machucadas da sua pele. Seu cérebro trabalhava arduamente tentando criar hipóteses para explicar o motivo de não estar na sua casa.

- Sabe que não é a primeira vez que isso acontece com a Amy. - Ergo minha sobrancelha assim que reconheci ser a voz da minha vó. Uma senhora totalmente amável, incapaz de machucar uma mosca.

Sento no chão, apoiando minhas costas na parede que fazia a divisão dos cômodos. Eles estavam na sala de jantar e eu na cozinha, perto da porta.

- Ela não se lembra de nada que aconteceu quando era pequena, provavelmente não vai lembrar do que aconteceu ontem. - Disparou meu pai de forma nervosa, ele parecia preocupado.- Querida, sabemos que enquanto Nina estiver aqui, nada vai acontecer.

Eles deixavam as informações confidenciais entre linhas, criando uma espécie de código que apenas os três tinham as respostas. O soluço da jovem mãe fez com que Amy sentisse uma pontada de culpa, quase revelando seu esconderijo para acalentar a mulher.

- Elas se completam no que necessitam, é um laço muito forte de vidas passadas. - completou minha avó - Mas minha preocupação está maior agora, o selo que foi usado pode estar se rompendo depois da experiência de quase morte da Amy.

Os olhos negros da criança estavam arregalados de incredulidade. Ela tinha quase morrido ? Por qual motivo não conseguia lembrar ?

- Testemunhas disseram que ela correu desesperada pela rua até uma viela, onde foi encontrada apertando sua própria garganta. - Minha mãe soluçou baixo, abafando com as mãos.- Ela sussurrava inconsciente afirmando a presença de alguém..

- Você se lembrará de tudo, deixe-a preencher sua mente de novo. - A sensação era que tivessem sussurrando dentro da cabeça dela, controlando suas próprias memórias.

A raiva distorcia seus pensamentos, a deixava sem noção das suas atitudes naquele momento.

Uma risada diabólica ecoou dentro do corpo da menina, fazendo seus pelos de arrepiarem pelo pânico que sentia .

- Você é apenas mais uma alma perdida que será minha novamente.

Suas mãos impediam seu baque contra o chão, causando um barulho seco que chamou a atenção dos adultos na sala. Os mesmos se entreolharam nervosos antes de ir até a cozinha.

- Eu não posso escapar dessa inferno, ainda está preso aqui dentro - Amy disse friamente, olhando para seus pais esboçando um sorriso demoníaco. Seus olhos mudaram a coloração, atingindo um vermelho escarlate. 

O horror saiu de sua mãe como um grito, escoando mais alto do que o esperado por causa do silêncio da madrugada.

Eu estava perdendo o controle quando sai correndo da casa, visando ir para o mais longe possível, sem olhar para trás.

[...]

  Os gritos ensurdecedores provenientes dos corpos jogados no chão lamacento me deixavam desnorteada, as mãos apodrecidas seguravam meus pés, tentando me impedir de continuar correndo pela minha vida.

-Você prometeu..

Arregalo os olhos, acelerando meus passos sem destino certo. Meus gritos de dor se misturavam com os outros por pisar no chão com os pés cobertos de sangue e lacerações.

- PARA COM ISSO, CHEGA ! - Os gritos de temor da menina ecoavam por entre as árvores, ela não aguentava mais as alucinações provocadas. Sentiu seus músculos falharem pelo esforço excessivo, gerando a queda da menina entre as folhas mortas no chão.

Subitamente o lugar começou a esfriar, aumentando os tremores da menina que sentia o único ponto de calor saindo do seu nariz, pingando nas folhas secas, manchando de um vermelho escuro.

-  Amy Morgan..- os ruídos de passos se aproximando eram seguidos por um forte odor de podridão. - Termine seu sofrimento comigo..

Uma mão esquelética saiu calmamente da escuridão enquanto se aproximava mais, a deixando encurralada. 

- Q-quem é você ? - Falou tentando soar firme, mas a voz trêmula entregou o que realmente estava sentindo.

- Eu e você, Amy. Nós somos uma coisa só.

O problema de Morgan.Onde histórias criam vida. Descubra agora