Capítulo 6 - Mão de Deus, me entregue.

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- Você está louca se acha que devemos usar estas flores, querida. Precisamos de flores brancas

Diante de Isabelle havia um banquete. Anne havia posto a mesa com muito afinco, haviam travessas e mais travessas com comida, uma cesta de pães, uma garrafa de vinho e uma jarra de suco.
Cheirava maravilhosamente bem, embora ela não sentisse a menor vontade de comer aquele pernil de porco que parecia delicioso. Havia rodelas de abacaxi ao redor dele e Isabelle achara artístico antes de começarem a destroçar a carne.

Havia servido para si mesma apenas um caldo grosso de legumes e frango, que mesmo discreto era difícil de engolir. Para onde fosse a mãe estava atrás falando de flores, e vestidos, e cerimônias, e isso fazia com que a sua apetite sumisse. As vezes o estômago roncava, mas maior ainda era a sua vontade de gritar com todo mundo e pedir para deixá-la em paz.

- Você não acha? - a mãe da garota continuava disseminando os mais diversos tipos de flores.

- Acho que deveríamos comer, mamãe.

- Você vai casar neste domingo.

- E eu estou tentando não enlouquecer.

- Deixe-a em paz, querida.

O Sr. Wheaterly entrara discretamente na sala de jantar, os pés tocavam o chão com graça e as tábuas rangeram apenas uma única vez.
Isabelle admirava a postura de seu pai, tão perfeita que parecia doloroso. Ela tinha certeza de que jamais vira o pai com a coluna arqueada em toda sua vida.
Ele parecia saudável e forte enquanto o tempo passava. Com mais de cinquenta anos, ainda tinha poucas rugas no rosto e músculos o suficiente nos braços. A Sra. Wheaterly adorava contar como era apaixonada pelo homem e como ele era lindo juventude. Isabelle gostava de ouvir histórias espontâneas desse tipo quando começava a desacreditar que seus pais se amassem.

- Estou apenas falando sobre as flores do casamento, Sr. Wheaterly.

- Ninguém quer saber de flores agora. Olhe o cheiro desse magnifico pernil, nada se compara.

Isabelle sorriu sobre seu prato de sopa, adorava quando o pai fazia isso. Ela sempre conseguia escapar dos assuntos que a incomodavam.

O Sr. Wheaterly sentou- se com a postura perfeita na cabeceira da mesa e se serviu de um pedaço de pernil. Isabelle sentia um leve incômodo ao ver o que restara da carne no prato.

- Só vai comer isso, querida?

- Sim, pai. Não estou com muita fome.

O pai raramente fazia comentários, parecia confiar no modo como ela fazia as coisas. Já a mãe, por vezes, dizia que seria bom se ela ganhasse um pouco de peso.

Depois do almoço, sem outras opções, já que Harry havia sumido depois do que acontecera na noite em que Will voltara para a cidade, Isabelle dirigiu-se para a biblioteca da casa.
Depois de conhecer a biblioteca particular de Will, ela sabia que a sua era modesta, mas continuava muito feliz com o lugar. Era pequena, mas muito aconchegante. Era sempre quando, em dias de chuva, ela sentava-se na poltrona de seu pai e lia um bom livro, acompanhada por uma xícara de chá quente. Ela sentia-se pacífica nesses momentos, enquanto fechada em seu próprio mundo. O restante ficava para fora e ela podia ver tudo pela grande porta de vidro que dava para o jardim posterior. A grama, as flores, as árvores e uma parte da casa dos Styles.

Isabelle tinha em seu colo um de seus livros preferidos, O Morro dos Ventos Uivantes. A história era emocionante a nível pessoal para ela e ela não entendia exatamente porque, ou pelo menos não queria pensar mais sobre o assunto.
No entanto, estava distraída e não conseguia assimilar as palavras. Mantinha os olhos na porta, observando o que acontecia lá fora; o sol brilhava no vidro e nas folhas verdes, o céu era metade azul,mesmo com as nuvens pesadas. Ela sentia falta de quando sentia-se extasiada por dias assim. Dias em que o sol brilhava tanto que suas bochechas ficariam vermelhas e ela poderia brincar do que quisesse com Harry. A saudade de seu melhor amigo doía-lhe quase que literalmente.
Havia dias em que ela sentia uma pressão no estômago.

Mal acreditou em sua própria sorte, quando viu Harry passar em frente á porta de vidro. Guiava um carrinho de mão. A manga da camisa dobrada deixava de fora grande parte dos seus braços, que embora magros já não pareciam tão frágeis. A pele de Harry adquirira um tom dourado encantador, mas ele parecia cansado de muitas formas.

Ele não olhou para o lado e embora Isabelle soubesse que não tinha nada a ver com o fato dela estar ali, isso não a impediu de ficar triste.
Ela fechou e voltou a abrir o livro. Será que esse sentimento jamais iria embora?

- Seria isso algum tipo de frustração?

- Pai, você me assustou.

- Só preciso responder algumas correspondências.

- Fique à vontade.

Isabelle voltou a abrir o livro. As almas dos personagens eram iguais ela sabia e, por vezes, ela pensava sobre isso. Casar-se ia com Will em pouquíssimo e perguntava a si mesma se sentia que a alma de ambos eram feitas da mesma substância.
Sabia que não deveria levar a sério o que lera em um livro de romance, mas essas eram as suas bases para o que considerava amor verdadeiro. O fim de Catherine e Heathcliff estava destinado a ser para sempre trágico, enquanto as pessoas folheassem as páginas desse livro, vivendo as mesmas dores diversas vezes. Mas o amor verdadeiro parecia necessitar dessa fidelidade, dessa compreensão, dessa loucura que ambos os personagens sentiam um pelo outro.

As almas deles eram feitas do mesmo, estava escrito, mas Catherine não se importou em casar-se com outro, este havia sido seu erro.
Isabelle pensava que não deixaria passar a pessoa que amasse tão profundamente, que chegasse a acreditar que suas almas fossem as mesmas. No entanto, era Will esta pessoa? Ela não sabia dizer.

Will fazia seu coração disparar. Will fazia sua pele se arrepiar. Will fazia-a sorrir e gargalhar, e ela não tinha dúvidas de que ele era um bom homem. Mas havia uma parte dela que continuava vazia, mesmo na companhia de seu noivo. Essa parte preenchia-se quando voltava para a casa de campo, quanto seus pés tocavam a grama, quando ela era amaciada com as memórias. Ela sentia-se completamente amada ali, embora estivesse confusa.

- Pai.

- Sim?

- O Sr.  acha que estou fazendo o certo?

- Casando-se com William? Acho que é uma decisão muito racional.

- Ser uma decisão racional é tudo que importa?

O Sr. Wheaterly deixou as correspondências de lado e ergueu os olhos para a filha.

- As vezes temos que pensar á longo prazo, querida. William poderá te dar tudo o que necessitas para viver uma boa vida, isso te fará feliz pelo resto de seus dias.

- Mesmo que eu não tenha certeza sobre todo o resto?

- Mesmo que não tenha certeza sobre todo o resto.

Isabelle sabia que estava destinada a errar como Catherine.
Naquele momento, o seu Heathcliff passou novamente em frente a porta de vidro. Seu coração apertou, ela sentia vontade de correr para ele, agarrrá-lo e nunca mais soltá-lo, mas continuou sentada.
Ela precisava fazer algo sobre aqueles sentimentos ou a dor a engoliria viva.

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